Antonio Delfim Netto
1. Singrando um mar internacional extremamente ameaçador estamos chegando ao
final de nossa viagem por 2008 razoavelmente bem apetrechados. Entre 2006/08
crescemos, em média, quase 5% (contra 3,3% em 2003/05). No mesmo período nossa
taxa média de inflação foi da ordem de 4,7% (contra 7,5% em 2003/05) e nosso
Déficit Fiscal Nominal/PIB foi da ordem de 2,2% (contra 3,4% em 2003/05). Com
isso a Dívida Líquida do Setor Público/PIB terminou o ano abaixo de 40%, contra
47% em 2003. E, tão importante quanto tais resultados, o indicador de
desigualdade (uma medida da distância entre os rendimentos de todos os
cidadãos) continuou a reduzir-se, o que significa que nosso progresso material
foi acompanhado por um certo conforto social. Há muita incerteza sobre o que
será o mar e a condição de navegação em 2009. Há, entretanto, uma certeza:elas
não serão nem tão calmas como sugerem alguns otimistas, nem tão assustadoras
como prevêem alguns pessimistas. Elas serão o que formos capaz de fazer delas
com nossa capacidade de formular o caminho de menor resistência e risco,
limitado às nossas condições objetivas combinadas com nossa ousadia. É claro que
isso não depende apenas do governo, mas do comportamento de cada um de nós, no
nosso papel de consumidores, produtores ou banqueiros.
2. Há algum terrorismo nos diagnósticos de nossos economistas sobre as
conseqüências que advirão para nosso equilíbrio externo com o desenrolar da
crise sobre o setor real da economia mundial. É claro que haverá uma redução da
quantidade e dos preços dos produtos exportados, mas não é menos claro que o
mesmo acontecerá com as importações, sendo certo, portanto, que é preciso
conhecer como se comportarão as relações de troca (preço de exportação/preço de
importação). As quantidades exportadas e importadas dependem da taxa de
crescimento relativo do nosso PIB, mas os seus preços dependem, além dos
chamados fundamentais (oferta, demanda e estoque físicos) do valor do dólar
que é a sua unidade de medida. É muito difícil estimar a combinação desses
efeitos. De qualquer forma, parece que o resultado sobre nosso saldo
comercial/PIB não será nem tão ruim como os da Venezuela e Chile, nem tão bom
como os dos países da Europa Oriental.
3. Dizem as más línguas que o presidente Bush escolheu Henry Paulson para seu
secretário do Tesouro porque ele como CEO do Goldman Sachs durante muitos anos,
havia visitado a China mais de 70 vezes, o que lhe conferia duas boas condições:
1.conhecer profundamente o setor financeiro americano e 2.circular amigavelmente
entre a burocracia chinesa impermeável ao discurso americano sobre a necessidade
de valorizarem sua taxa de câmbio. Deu tudo errado! Paulson explodiu o sistema
financeiro mundial com sua barbeiragem no Lehman Brothers e sua última visita à
China (final de novembro) mostrou que o presidente chinês Hu Jintau pode até
gostar dele como pessoa física, mas não dá bola para seus conselhos como
pessoa jurídica…
* Por conta das férias de fim de ano, o professor Delfim Netto voltará a
escrever a coluna no dia 12 de janeiro de 2009.