Aos 30 anos, o escritor, roteirista, tradutor e produtor editorial Stefano Volp prefere se definir, essencialmente, como um contador de histórias. Em seu mais recente lançamento “Homens Pretos (Não) Choram”, ele aborda temas que permearam sua vida desde sempre: a negritude e a masculinidade. “O homem, no geral, é historicamente ensinado a não parecer vulnerável. O homem negro é ainda mais cobrado quanto à virilidade e força”, explica ao GLMRM. Como homem preto e criado na Baixada Fluminense, ele expressa sua relação com os dois tópicos por meio de crônicas, abordando também outros estigmas sociais impostos pela sociedade à figura do preto periférico.
O autor conta que, durante o período de isolamento devido à pandemia da Covid-19, viu aumentar o interesse da população por discussões sobre questões raciais, especialmente após ouvir vozes do próprio movimento negro, como a dele. “Tenho recebido contato de vários tipos de artistas e roteiristas querendo falar sobre racismo, e acho muito legal, porque mostra que as pessoas estão procurando se informar e estão dispostas a ouvir mais sobre esse tema”, diz. Inspirado pela filósofa Lélia Gonzalez, que diz que “não se nasce negro, se torna negro”, ele aponta que se tornar negro tem relação com o processo de consciência racial e, muitas vezes, esse processo é construído a partir da observação de si mesmo por meio do outro. “Num mundo onde as pessoas têm receio de te dizer qual é a sua raça e atribuem a sua cor tudo o que é ruim, o processo de racialização tende a tardar”, explica.
Apesar do destaque que a causa racial tem ganhado no Brasil nos últimos tempos, Volp acredita que a realidade ainda está longe de mudar, mas que o caminho para isso, além de investimento direto na criação e manutenção de políticas afirmativas e na educação pública, está ligado à visibilidade e consumo da literatura negra, assim como da arte em geral. “Isso faz com que essa produção seja valorizada e promovida, além de possibilitar a circulação de capital financeiro entre artistas pretos, cuja luta para assumir prateleiras e palcos é muito maior do que a de brancos. Esta é uma questão histórica embasada em dados óbvios.”, aponta ele.
Para incentivar novos escritores negros, ele fundou o Clube da Caixa Preta, iniciativa com objetivo de publicar clássicos escritos por autores pretos em formato de clube digital. O projeto deu tão certo que hoje se expandiu para a Editora Escureceu. “Eu vejo um ‘boom’ na procura por autores clássicos, mas não conheço ninguém que vá ao passado e procure saber quem são os autores negros que fizeram muita diferença na sua época”, ressalta. Para ele, a falta de clássicos de autores pretos nas livrarias demonstra a falta de interesse das editoras em revirar o passado e valorizar esses tesouros ignorados e esquecidos. “Vários autores negros têm sido importados, mas, no geral, há uma repetição dos poucos grandes nomes do presente. Uma verdadeira editora antirracista deveria entender que valorizar a ancestralidade é a base do movimento negro. E há centenas de autores incríveis com livros de sucesso enterrados em um passado não tão distante.”, afirma.
A importância desse pensamento vem da própria história de Volp, já que a escrita e a literatura foram as responsáveis por dar direção a sua vida e aos seus sonhos. Com “Homens Pretos (Não) Choram”, ele mostra sua capacidade de fluir entre os gêneros literários: seus outros livros incluem “Nunca Vi a Chuva”, título juvenil lançado em 2017, e “O Segredo das Larvas”, de 2020, que ficou durante muitas semanas como uma das distopias mais vendidas da Amazon, e também aborda representatividade racial. “Trilhar caminhos abertos com muito sacrifício é sempre uma honra. Hoje estou me tornando referência para outras pessoas, a maioria delas jovens escritores que sonham em viver da escrita. Quando essas pessoas me mandam mensagem dizendo que eu as inspiro a continuar sonhando e trabalhando, fico com a sensação de que talvez isso seja o mais importante. É aí que mora a representatividade”.
Seu próximo livro será também sua estreia no thriller psicológico, seu gênero favorito. “Passei alguns anos acumulando novas referências e desenvolvendo esse estilo de narrativa. Hoje me sinto preparado para mostrar essa nova faceta como autor”, revela Volp. O livro já está pronto e será lançado no segundo semestre pela HarperCollins. Recentemente, ele também foi convidado pelo SESC para escrever uma história inédita em formato de novela serializada, com episódios semanais e duração de seis semanas, publicada no site do SESC Pompeia – projeto que já contou com grandes nomes como Conceição Evaristo e Fábio Cabral, entre vários outros autores importantes. O folhetim criado por Volp será sua primeira história de horror. “Parece um conto de fadas, com personagens racializados, meio Jordan Peele. Espero que gostem!”, ele adianta.
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