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A apresentadora em cena do extinto 'Xuxa', e Tom Lynch, seu produtor americano || Créditos: Reprodução
Xuxa e Jelly em um episódio de “Xuxa”, e Tom Lynch, produtor da atração || Créditos: Reprodução/Cortesia Tom Lynch

Hit do momento na telinha do Brasil, Xuxa: O Documentário – lançado no último dia 13 pela Globoplay – trouxe à tona novamente muitas histórias já bastante conhecidas do público sobre Xuxa Meneghel, cuja rápida ascensão ao olimpo da fama é o tema da série documental com direção de Pedro Bial, e antes jamais discutidas em detalhes pelos principais envolvidos. Quase “lendas urbanas”, agora tratadas como revelações polêmicas e, em alguns casos, bastante sérias, essas memórias contadas pela apresentadora de 60 anos em primeira pessoa estão entre os fatores que explicam o sucesso da atração. E uma delas diz respeito à “catástrofe” (palavra da apresentadora) que foi sua tentativa de repetir na televisão dos Estados Unidos o sucesso de seu Xou da Xuxa, um matutino de variedades infantil como jamais houve outro em qualquer lugar do mundo antes de sua estreia, exibido pela Globo entre 1986 e 1992.

Na série campeã de audiência na plataforma de streaming que é tida como o futuro do maior conglomerado de mídia do país, um trabalho que tem atraído mais espectadores do que as novelas disponíveis no Globoplay, Xuxa já declarou que uma das principais responsáveis pela frustrada missão de conquistar a América foi Marlene Mattos, sua ex-empresária e ex-faz-tudo, a quem culpa por não ter se empenhado o suficiente a fim de tocar a empreitada internacional. Talvez por receio de perder seu poder e influência sobre a então empresariada, que aparentemente suspeita disso. O saldo final do imbróglio foi o que pode-se classificar como a maior oportunidade de crescimento na carreira perdida pela rainha dos baixinhos.

“Xuxa poderia ter sido maior do que Oprah [Winfrey] se seu programa americano tivesse decolado”, disse ao GLMRM, em 2018, Tom Lynch, veterano de Hollywood e produtor executivo do game show batizado simplesmente Xuxa (ou “Shoo-sha”, como foi ensinado em peças publicitárias direcionadas aos baixinhos gringos ser a forma correta de pronunciar o nome). Ficou no ar por apenas uma temporada, e a vida curta não foi em razão de pouca audiência. “Na verdade [o programa] foi um estouro de público”, relembrou Lynch há cinco anos. “Tivemos uma média de três milhões de telespectadores por episódio”, continuou o executivo renomado. O que pegou mesmo, garantiu Lynch, foi a reação coletiva de gigantes como Warner e Disney: assustadas com o carisma contagiante de Xuxa, companhias como essas que, inclusive, tentaram contratá-la anteriormente, atuaram juntas nos bastidores para “cortar o mal pela raiz”. Isso porque todas temiam tê-la  como uma eventual pedra no sapato, ou mesmo uma ameaça ou concorrente.

Foi aí que começaram a surgir nos veículos da imprensa americana reportagens críticas, sobretudo em relação ao estilo de se vestir em cena de Xuxa, por lá considerado “sensual” demais para os padrões locais. E sempre carregadas ainda de um tom de americanismo disfarçado de patriotismo. Eram, no entanto, problemas que poderiam ter sido contornados por Xuxa e seu estafe, em especial Marlene, tivessem todos se empenhado para tal. “Acho que a Xuxa não tinha muita noção da imensidão daquilo, que foi a chance única e rara de finalmente se estabelecer na indústria de entretenimento mais importante do mundo”, contou Lynch, dessa vez em um bate-papo recente com GLMRM, dias atrás. “Ela já brilhava em vários outros lugares do planeta, talvez tenha achado que os EUA era somente mais um”, ponderou o profissional do showbiz que também tem no currículo alguns trabalhos com Michael Jackson. Curiosamente, da mesma forma em que Xuxa foi, sem dúvida, a pessoa certa no lugar e no momento da história certos quando foi convidada, no fim da década de 1980 e muito bem-sucedida como modelo, para trocar as passarelas pela TV sem imaginar o megaestrelato que a aguardava, o mesmo pode estar acontecendo novamente agora.

Como definiu o jornal The Washington Post em matéria publicada em setembro do ano passado, o mercado global de streaming passa por uma crise existencial. Depois de anos seguidos de crescimento robusto, as principais plataformas desse segmento têm como maior desafio atualmente o de manter seus assinantes fidelizados. Aparentemente, as dezenas de bilhões de dólares somadas que grandes players como Netflix, Amazon Prime e Disney+ investiram somente em 2022 não foram suficientes para desatar esse nó, diferente do que se pensava pouco tempo atrás. Todas as três, por sinal, registraram quedas significativas nos números de acessos feitos por usuários no primeiro trimestre desse ano. Na Netflix, a líder do grupo, a baixa foi de quase 30%.

Não bastasse esse pepino, a greve dos roteiristas hollywoodianos iniciada semanas atrás pode gerar, além de prejuízos bilionários na área operacional, a eventual necessidade de que o catálogo de conteúdo dessas mediatechs poderosas do OTT (sigla de “Over-the-top”, o “nome técnico” do streaming) precise ser preenchido com opções de filmes e afins antigos. Justamente o que seus clientes, que pagam por seus serviços para receber o exato oposto, menos precisam nesse cenário de desinteresse coletivo. E o que eles desejam, afinal? Pesquisas e estudos de todos os tipos, e que andam circulando aos montes na meca do cinema, têm sempre em comum a conclusão de que o futuro da Netflix e companhia depende mais da programação de variedades e menos da de ficção roteirizada – sendo essa última, a propósito, a que mais é ameaçada pela Inteligência Artificial (AI).

E é aí que Xuxa entra na história: algo como “Xuxa: O Documentário”, um produto artístico inédito e ao mesmo tempo com “um pé” na realidade, dado que sua personagem principal é uma mulher de carne e osso, é um exemplo perfeito daquilo que cada vez mais passará a ser oferecido por esses provedores de streaming. O mesmo foi evidenciado pelas decisões da Netflix, recentes e de apostar na programação sobre Fórmula 1 e cogitar a criação de um torneio de golfe sob medida para seu público; e de um de seus maiores concorrentes nos EUA, o Hulu, aquele que surpreendeu todo mundo, em 2021, quando tirou as Kardashians e sua lucrativa reality series da TV linear para acomodá-las em “grade” de TV conectada.

E Xuxa não é destaque apenas na Globoplay, mas também na Amazon Prime, com sua Caravana das Drags, e no Disney+, que produz o seriado Tarã, que protagoniza e é previsto para estrear ainda em 2023. Se 30 anos atrás a dona do hit “Ilariê” quase conquistou o mundo a partir do espaço exclusivo que ganhou na Globo, agora é como se ela tivesse três Globos à sua disposição, sendo duas delas multinacionais presentes em todos os continentes. A isso, deve-se somar sua fortuna estimada em R$ 1,3 bilhão, e sua própria produtora, a Xuxa Produções, uma das maiores entre as brasileiras. Sem falar na liberdade criativa gerada pela ausência de Marlene, que a limitava nesse aspecto. Acima de tudo, seu brilho diferenciado, uma característica por hora priorizada ao máximo no universo do streaming, se tornou um “plus” e tanto.

“Xuxa é uma artista como poucas vezes vi na vida, capaz de se conectar com sua audiência imediatamente, como o Elvis [Presley]”, resumiu Lynch na conversa que teve com GLMRM nessa semana. E o expert em programas para crianças, certa vez descrito pelo The New York Times como o David E. Kelley do mundo televisivo infanto-juvenil, uma referência ao produtor que lançou séries icônicas como “Picket Fences” e “Ally McBeal”, citou mais algumas outras características da mãe de Sasha Meneghel vistas como qualidades pela turma do streaming.

“A Xuxa é um caso único de uma pessoa com um talento tão grande que a permite tanto manter sua base de fãs de suas origens, como continuar conquistando outros das novas gerações. E isso é porque ela é como eles, existe uma confiança recíproca que é algo cada vez mais raro no meio artístico, e por isso tem cada vez mais valor. Estrelas como a Xuxa se adaptam a qualquer tecnologia, conseguem continuar sempre relevantes”, finalizou Lynch, que teria exercido em terras americanas a mesma função de Marlene na vida de Xuxa tivesse seu show – o com “s” e “h” mesmo – tido um desfecho diferente. E o produtor não acha nada impossível que essa “Supernova 2.0” da mulher mais famosa do Brasil, alguém que conheceu por intermédio do mesmo Michael Jackson de que um dia foi parceiro, talvez seja maior que a primeira.

 

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