Em uma história de violência doméstica, quem nunca escutou um “mas ele me ama”, “mas ele é tão bom pai” ou qualquer outro tipo de ponderação do gênero? Em “O Outro Lado do Paraíso”, vamos ver isso no ar: um rapaz apaixonado, mas que bate na mulher [Bianca Bin]. Para o papel controverso, o diretor, Mauro Mendonça Filho, escalou alguém, em suas palavras, “de um carisma absurdo e muito bonito”, e a gente aposta que foi para humanizar ainda mais o agressor, se tornando mais difícil para o telespectador julgar. Diga-se de passagem como aconteceu com Juliana Paes, talvez a atriz mais querida do Brasil, na pele de Bibi Perigosa em “A Força do Querer”: alguém que entra para o mundo do crime, do tráfico de drogas, sem perder a empatia do público.
Conversamos sobre esse assunto com Juliana várias vezes durante a novela, falamos também com Mauro, que acredita em “figuras linearmente más e figuras que erram”. “Existe uma diferença grande. Tem que saber separar. O erro faz parte. A gente está com alguém e aí… Quanta gente ama e perdoa? Tem que perdoar, mas sem passar de um limite”. Pano pra manga, né? Agora o Glamurama passa essa batata quente para Guizé. O que o ator tem a dizer sobre isso?
“Ele não é um mau caráter”
“Não sabia que o Mauro pensa desse jeito sobre mim, fico feliz. Estou tentando tirar verdade do personagem. Se eu acreditar no que estou fazendo, as pessoas vão acreditar também. Ele não é um mau caráter. Isso definitivamente ele não é. Não sei se é doente. A mãe [Marieta Severo] o manipula muito, e ele acaba cometendo erros. Aí a mãe passa a mão na cabeça dele e diz: ‘Tudo bem, você é filho de poderosos, pode fazer o que quiser’. Tipo pegar um carro e atropelar uma pessoa de bicicleta [como aconteceu com o filho de Eike Batista]: acho isso um absurdo, até hoje. Mas, a partir do amor, a trajetória dele começa a mudar completamente. Enxerga que a mãe está errada e que o mundo também pode ser bom, com pessoas boas. E o amor é mais importante que tudo”.
“O Brasil não tem pena de morte pra pessoa virar quase um animal dentro da prisão”
Mas vai ficar por isso mesmo? “Eu acho que tem que ser punido, tem erros que não tem reparo. Precisa ser castigado. Ele erra, erra feio, e não vou vitimiza-lo. Tem que pagar pelo que fez. Mas de forma que o recupere, que ele possa voltar a viver em sociedade, o que não é o que acontece nas prisões. O cabra vai pra cadeira e… O Brasil não tem pena de morte, graças a Deus, pra pessoa ir pra lá e virar quase um animal dentro da prisão, voltar pior ainda. Acredito na reabilitação sempre. É um personagem muito difícil, um tema pesadíssimo. Pra mim, é um desafio, então estou fazendo com o coração, com minha alma. Verticalizando o lance do personagem… o que é de verdade. E está muito bem escrito pelo Walcyr [Carrasco, autor da trama]”.
“Pra mim, a arte só serve para servir a vida”
Guizé nos confessou um certo nervosismo. “Depois que estrear, talvez eu consiga relaxar um pouco e parar de ficar pensando o tempo inteiro em como construir esse personagem. Muito, muito difícil. Mas mais pra frente espero poder sacar o que as pessoas vão achar, se isso vai bater de alguma forma positiva. Pra mim, a arte só serve para servir a vida, para que haja alguma transformação nas pessoas. É muita responsabilidade: mostrar ao mesmo tempo todo o amor dele, e toda a raiva”. (por Michelle Licory)