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Há mais de 50 anos em cartaz, o restaurante La fiorentina, no Rio, carrega a tradição de ser o local em que os artistas se encontram e atravessam as noites. Do fim dos anos 1950 a meados de 1970, viveu seus anos dourados: cenário de romances, escândalos, glamour e muitas loucuras. Conheça aqui algumas delas

Por Renato Fernandes para revista Joyce Pascowitch de março

Praia do Leme, início dos anos 1970. A cantina La Fiorentina vive seu ápice. Atores e atrizes de teatro seguiam para lá após suas apresentações. Assim como os desempregados, na tentativa de serem vistos e conseguir algum personagem no teatro, na televisão ou no cinema. Era lá que todos se reuniam. E dividiam pratos, contatos e paqueras até o dia raiar.

Na primeira mesa sempre ficava uma loira, com cabelos de pantera: era a colunista Tetê Nahaz, que sabia de tudo e de todos. Magra, altiva e poderosa, ela assinava colunas do showbiz na revista Amiga e no jornal O Globo. O nome da coluna? Veneno.

Em 1974, uma morena de shortinho e com pernas bem torneadas chega ao local e pergunta: “Você que é a Tetê Nahaz?”. Ao confirmar, a morena falou: “Vou puxar muito o seu saco, quero sair sempre na sua coluna!”. Não deu outra: elas caíram na gargalhada e ficaram amigas íntimas. Era a atriz Lady Francisco. À dupla juntou-se outra atriz recém-chegada de São Paulo, Terezinha Sodré.

Outra presença constante na cantina era a da comediante Dercy Gonçalves, que preferia ficar na varanda, de frente para o mar. No livro As Noites da Fiorentina, de Fritz Utzeri, a dama do teatro Bibi Ferreira relata: “Certa vez cheguei no restaurante e lhe perguntei: ‘Dercy? Você sozinha numa segunda-feira à noite? Veio jantar?’. E ela: ‘Não, jantar eu janto em casa. Aqui venho procurar namorado’’’.

PAQUERAS SEMPRE

Foi lá também que um dos casais mais inesperados do meio artístico se formou: o ator Milton Moraes e Maysa. Milton era prata da casa. Viciado em jogo desde sempre, vivia pendurando as contas. Já seu xará Milton Rodrigues, que fez sucesso no cinema mexicano, arrebatou o coração da cantora e atriz Valéria – travesti famosíssima que frequentava o restaurante todas as noites, após o espetáculo Mixto Quente, que fazia com o comediante Agildo Ribeiro e os músicos Pedrinho Mattar e Eduardo Lages, hoje maestro. Detalhes? Valéria prefere deixar para sua biografia, mas revela: “Milton Rodrigues foi um dos homens mais sexy que vi na vida e as noites na Fiorentina eram inesquecíveis”.

Travesti frequentava? Só as estrelas – e Rogéria era outra delas. Na época, maquiava a proprietária Zélia Hoffman, casada com Sylvio Hoffman, que fundou o local em 1957. Zélia era uma mulher elegante, muito conhecida dos concursos de fantasias luxuosas no Baile do Municipal, e, como fez teatro de revista, contribuiu muito para que os artistas frequentassem o restaurante. Lá iam muitas de suas colegas: Íris Bruzzi, Carmem Verônica e Nélia Paula. Íris, aliás, foi a primeira artista a pisar lá antes mesmo da inauguração. Anos mais tarde, também presenciou o fim do casamento de Zélia e Sylvio – que se casaria com a mineira Maria Amália – e mais: o fim trágico das vedetes Nélia Paula e Zélia Hoffman, que terminaram a vida no Retiro dos Artistas.

AMOR REVELADO

Foi na Fiorentina o cenário de um amor até hoje não revelado: de José Wilker e Magrit Siebert. O casal se conheceu no início dos anos 1970. No primeiro encontro, o ator estava jantando com a amiga Ângela Leal e, ao ver Magrit em uma mesa, a convidou para sentar com eles. A resposta foi negativa. Deslumbrado pela beleza da moça, Wilker então sentou em sua mesa. “Ele era muito doido para a época, mas me conquistou, me enchia de mimos, como poesias”, diz Magrit. Depois de um ano entre Rio e SP, ele entrou com ela num cartório para ver o que era necessário para se casarem. “Fugi, nem pensava em me casar aos 20 anos, fui para Blumenau me esconder.”

OS PODEROSOS CHEFÕES

A mesa ao fundo, à direita, era onde se concentrava a “grande diretoria”, isto é, os talentosos homens da cena artística nacional. O ator Jorge Dória ia sempre e fez o début de Monique Lafond, então uma adolescente de 14 anos com a qual já dividia o palco, no local. “O Jorge era uma figura ímpar do nosso teatro. Me ensinou muito. Fui filha, esposa, amante dele, mas só no palco!”, lembra Monique, rindo. Outra loira poderosa se lembra dele com carinho: “Éramos todos amigos de verdade. O Dória era uma figura fantástica, sentava em nossa mesa, quando eu era casada com Jece Valadão, e ríamos muito. Outros como o Agildo Ribeiro e Anselmo Duarte também. Éramos unidos”, diz Vera Gimenez.

Outro dos poderosos, o ator Agildo Ribeiro também fala com exclusividade a J.P: “Ir à Fiorentina era um vício. Quando eu não ia, parecia que tinha perdido uma noite de vida. Quando estava duro, dividia um omelete com o ator Edson Silva”, conta. “Era a época da mentira, todos falavam muito de sexo e dinheiro. O Dória sempre tinha tiradas sensacionais e quando alguém não aparecia, ligávamos para saber do outro”, conclui.

MEU MUNDO CAIU

Na mesma noite em que Maysa ou Leina Krespi tomavam um pileque era possível ver a já decadente vedete Elvira Pagã entrar no local para vender seus livros. Lá ela encontrava o famoso Daniel Filho, do qual tirou a virgindade. Daniel tinha mesa cativa no salão: “De lá saíram milhões de negócios, de peças de teatro a programas de televisão, de musicais até filmes. Já disse que as revoluções saem quando um grupo de pessoas se reúne sem ideias preconcebidas”, escreveu o diretor no livro sobre o restaurante. Célebre também é o caso de 1962, quando a atriz hollywoodiana Rita Hayworth veio passar o Carnaval no Brasil. Numa noite de chuva, Daniel estava sentado na segunda mesa da varanda e a viu saindo de um carro e ficando na escadinha à espera de um táxi, solitária na chuva. “Ninguém foi capaz de se levantar e oferecer uma carona para ‘Gilda’. E no mundo, sabe, nunca houve uma mulher como ‘Gilda’. Nunca”, revelou Daniel em sua biografia Antes que Me Esqueçam.

Estrelas internacionais que passaram e deixaram suas assinaturas por lá? Diversas, como Rock Hudson, Kim Novak, Marisa Berenson, Margaux Hemingway, Rudolf Nureyev e até mesmo Jean-Paul Belmondo, que virou figurinha fácil do restaurante quando veio filmar O Homem do Rio, no início da década de 1960.

Nessa mesma época, a italiana Claudia Cardinale veio gravar seu primeiro filme no país, Uma Rosa para Todos, e sua aparição no Fiorentina foi digna de estrela: estava produzidérrima, exalando glamour e simpatia. Daí, não teve jeito: foi aplaudida por todos que estavam na casa. Só a mulher de um dos produtores brasileiros do filme, enciumada, saiu louca da vida.

Os brasileiros que faziam sucesso na Itália em filmes de bangue-bangue também tinham o restaurante como ponto de encontro, como a mulata Esmeralda Barros – com vestido Pucci e muito borogodó – e o ator Celso Faria, que, determinada noite, destruiu uma série de cartazes de filmes e objetos de decoração da casa. O motivo? Defendia Anselmo Duarte para a turma do cinema novo, que julgava o diretor por ter ganhado a Palma de Ouro pelo filme O Pagador de Promessas. Qual deles trouxe outra para o Brasil? Nenhum.

COMO DIZ, LEILA DINIZ

A atriz Vera Vianna, consagrada com os filmes de Nelson Rodrigues, foi amiga íntima de Leila Diniz: “A Fiorentina era nosso ponto obrigatório, quase um escritório. Fechávamos contratos lá. A Leila morava em Santa Teresa e sempre perdia o último bondinho, então ia para a praia, dormia até umas 5 da manhã e depois batia na minha casa. Tomava banho, pegava uma roupa emprestada e jamais devolvia”, diz, rindo. “Isso virou piada entre nós, mas era normal, aquela época era muito diferente de hoje, a concorrência era menor e os valores de amizade maiores”, completa.

O restaurante também era o lugar onde os atores paulistas iam para se enturmar. Foi o caso de Edwin Luisi, galã da novela Escrava Isaura, em 1976. “Na Fiorentina, conheci grandes figuras. Alguns já se foram, outros são meus amigos até hoje”, diz. Sua beleza e porte físico, graças à ginástica olímpica, deixavam muita gente babando: “Verdade! Como eu era novo na cidade causava um certo rebuliço. Recebi grandes cantadas entre os canelones e as parmegianas”.

 A VOLTA ESTRELAR

Em 2000, o empresário Omar Peres, enteado de Sylvio Hoffman, comprou o ponto em que funcionara a Fiorentina e que, após um incêndio, estava desativado havia quase dez anos.

Hoje, de volta à ativa, cultiva sua clientela estelar. O diretor Andrucha Waddington vai quase todas as noites. Letícia Spiller, Laura Cardoso, Ellen de Lima,  Eduardo Dussek, Jorge Fernando e Aloísio de Abreu idem. Fato é que lá artistas podem jantar sem ser incomodados por pedidos de autógrafos e muito menos de selfies. E, como diria Anselmo Duarte: “Ganhar a Palma de Ouro é fácil, difícil é agradar na Fiorentina”.

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