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Ney Matogrosso // Reprodução Instagram

Talvez o maior símbolo de liberdade de expressão da música popular brasileira, Ney Matogrosso reuniu suas memórias em “Vira-Lata de Raça”, autobiografia feita com a ajuda do amigo, poeta e escritor Ramon Nunes Mello, e lançada pela editora Tordesilhas. Muito à frente de seu tempo, o artista faz uma reflexão sobre sua trajetória de mais de quatro décadas na música, que vai desde lembranças de quando despontou no cenário nacional, em meio a toda efervescência político-socio-cultural dos anos 1970, até a liberdade para lidar com sua sexualidade e seus amores. O título é tirado da música de Rita e Beto Lee gravada por Ney.

Aliás, é a cantora que assina o texto de apresentação da biografia: “É um camaleão? É um feiticeiro? É uma sereia tropical? É um Bowie da floresta? É uma vedete escandalosa? Sim, tudo isso muito mais: é the one and only, Ney Matogrosso… o artista brasileiro mais chique, misterioso e sexy”. Concordamos com Rita em gênero, número e grau.

Nessa quinta-feira, pouco antes do evento de lançamento do livro, Ney  bateu um papo exclusivo com o Glamurama. Com uma xícara de chá nas mãos, o papo rolou solto, transitando pelo passado, presente e futuro. Vem!

Glamurama: Como foi o exercício de revisitar sua própria história?
Ney Matogrosso:
“Não tive nenhum problema. Está tudo dentro de mim, na minha cabeça, não exigiu nenhum esforço e não teve sofrimento, nem nada. É uma coisa repetitiva porque desde que sou artista tenho que falar da minha vida, as pessoas perguntam… e é como falei para o Ramon Nunes Mello [que fez a pesquisa e organização da obra] no início do projeto: ‘só tenho uma versão da minha vida. Não posso inventar nada porque é uma vida só, então tudo o que eu falar eu já falei algum dia. Não tem novidade, não posso criar coisas para contar. É o que está na minha memória. Ramon é meu amigo, independente de trabalho. Nos encontramos três vezes para conversar e fluiu. Não foi difícil.”

Glamurama: Sua carreira é muito marcada pela liberdade, que você imprimiu em seu trabalho desde o início. E com certeza influenciou muita gente. Entre os artistas mais novos, você vê referências suas em alguém?
Ney Matogrosso:
“Em vários, mas não vou citar nomes porque é algo que está diluído por muita gente.”

Glamurama: No livro você faz uma alerta à caretice do mundo atual. Como acha que podemos combatê-la? 
Ney Matogrosso: “Acho que a gente não tem que se esconder nem temer nada. Temos que continuar vivendo a vida da gente como a gente é, como a gente vive, como a gente quer viver, sem nos submetermos a nada. Governo não tem que decidir como você vive, assim como a igreja também não deve. A vida da gente é particular, você é dono dela e a leva como achar que deve.”

Glamurama: Você se aborrece com o que vê?
Ney Matogrosso: “Não é que eu me aborreça, mas acho que a caretice hoje é muito maior do que era antigamente, e quando penso que o processo deve ser evolutivo, o que vejo é um caminhar para trás.”

Glamurama: Do que mais sente falta dos anos 1970 e 1980? 
Ney Matogrosso: “Vivi o que tinha que viver e estou em outro momento da minha vida, mas sinto falta de muitas coisas que não existiam e que existem agora, como os paparazzi, por exemplo. Eu andava com Cazuza de mão dada na madrugada no Baixo Leblon sem ninguém encher o saco, sem ninguém achar nada e sem nos fotografar. Isso era possível na época e hoje não é mais. E esse tal de politicamente correto é uma coisa muito esquisita também, sabe!”

Ney Matogrosso // Crédito: Leo Marinho

Glamurama: Falar em liberdade sexual virou clichê?
Ney Matogrosso: “Não sei se virou um clichê porque precisamos dela, da liberdade. Agora, também é o tal negócio, eu defendo isso mas nunca joguei nada na cara das pessoas porque não me interessa jogar nada na cara delas. Cada um tem que saber de si, com liberdade para se expressar, mas respeitando o espaço do outro. Sei que contrario uma corrente de pensamento mas eu penso dessa maneira. Não tenho necessidade de ficar beijando as pessoas fora dos meus momentos íntimos, porém entendo também que as pessoas que têm essa necessidade. Vivemos em um momento da humanidade em que essas coisas, teoricamente, são mais aceitas. Quem quer beijar, beija. Eu não beijo.”

Glamurama: Neste momento em que a aceitação das diferenças está sendo muito discutida, seu livro pode ajudar?
Ney Matogrosso: “Acho que sim, qualquer manifestação de liberdade é bem-vinda. Não sou o dono da verdade mas sempre digo para as pessoas: ‘Não se satisfaçam comigo, vocês têm a vida de vocês, se manifestem, expressem o que são, não se contentem com a minha manifestação.’ Mas eu sempre fui muito claro, nunca usei de nenhum subterfúgio, a única coisa que eu não libero é nome das pessoas com quem fico, porque isso não me interessa. Não gostaria que alguém falasse de mim, ‘eu trepei com o Ney’, por exemplo, não precisa.”

Glamurama: Você tem algum novo projeto engatado?
Ney Matogrosso: Tenho ensaiado 4 horas diariamente para meu novo show, que estreia no Rio de Janeiro no dia 11 de janeiro. Tenho muito pouco tempo até lá, mas os ensaios estão correndo bem. Em três dias já levantamos sete das 23 músicas que precisamos.” (Por Julia Moura)

 

 

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