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Bernard Arnault || Créditos: Reprodução

Atualização feita às 17h10 de 12/10/2023: No pregão de quinta-feira (12) na Euronext Paris, que já encerrou, a ação do LVMH caiu mais 1,62%, reduzindo o valor de mercado do conglomerado em €6,8 bilhões (R$ 36,5 bilhões) para €354 bilhões (R$ 1,9 trilhão). Esta segunda desvalorização consecutiva custou a Bernard Arnault outros US$ 2,9 bilhões (R$ 14,6 bilhões), reduzindo seu patrimônio pessoal para US$ 177,8 bilhões. Assim como na quarta-feira (10), Arnault foi o bilionário que mais perdeu dinheiro globalmente, com perdas totais nos últimos dois dias somando US$ 14,9 bilhões (R$ 75,5 bilhões). Outros gigantes do luxo francês também sofreram, possivelmente devido à divulgação dos números do balanço do 3T23 do LVMH na noite de terça-feira (09). O Kering e a Hermès viram suas ações caírem 2,61% e 1,44%, respectivamente. Em geral, analistas de mercado especulam sobre a possibilidade de uma estagnação de crescimento ou mesmo uma recessão na indústria global de luxo. O artigo abaixo foi atualizado para refletir esses novos fatos.

Nos altos e baixos das bolsas, perder um pouco em um dia e recuperar até o dobro ou mais no seguinte, faz parte do jogo capitalista. No entanto, o LVMH tem vivenciado momentos de instabilidade notória. Nessa quinta-feira (12), o conglomerado viu suas ações na Euronext Paris diminuírem mais uma vez, fechando 1,62% abaixo e trazendo o valor de mercado da empresa para €354 bilhões (R$ 1,9 trilhão). As negociações da última sessão na antiga Bourse de Paris, principal bolsa de valores da França e ainda tratada pelos franceses por essa sua denominação oficial mais antiga, foram encerradas às 17h30 no horário local (meio-dia no de Brasília).

Essa mais recente queda sucede um tombo significativo na quarta-feira (11), quando a ação da companhia dona de marcas poderosas, como Louis Vuitton e Dior, fechou 6,46% abaixo do valor de abertura. Com isso, sua capitalização de mercado naquela sessão caiu para €360,8 bilhões (R$ 1,94 trilhão) no fechamento do dia, uma perda de aproximadamente €25 bilhões (R$ 134,2 bilhões). Antes desse episódio, seu market cap era de €385,8 bilhões (R$ 2,07 trilhões).

Combinando as perdas de ambos os dias, o LVMH sofreu uma redução em seu valor de mercado de €31,8 bilhões (R$ 170,8 bilhões) na Euronext Paris em apenas dois pregões consecutivos.

O funcionamento do mercado de capitais do país dura em torno 8 horas e 30 minutos por dia. Considerando a perda combinada sofrida pelo LVMH nessas duas últimas sessões, é como se cerca de €31,2 milhões (R$ 167,4 milhões) de seu valor real tivessem evaporado a cada minuto desse período. Só para ilustrar o tamanho do tombo, a Danone, outra marca bastante ligada à imagem da França, vale €36,8 bilhões (R$ 197,6 bilhões) na Euronext.

Fundador e maior acionista do LVMH, Bernard Arnault controla, indiretamente, 41,4% de seu capital. Ele detém essa participação por meio de uma participação direta de 97,5% na Christian Dior Couture SA.

Individualmente, Arnault viu €14,9 bilhões (R$ 75,2 bilhões) de sua fortuna se evaporarem devido à desvalorização do papel daquele que é seu ativo mais luxuoso entre quarta e quinta. Atualmente, sua fortuna é estimada em US$ 177,8 bilhões (R$ 897,9 bilhões). Essa cifra inclui investimentos variados, como ações da Netflix e da chinesa ByteDance, a controladora do TikTok. Titular, entre idas e vindas desde 2001, da primeira posição na lista das pessoas mais ricas do mundo, agora está na segunda posição, abaixo de Elon Musk e de seus US$ 258,9 bilhões (R$ 1,3 trilhão).

Analistas de mercado, baseando-se no que enxergam nas entrelinhas desses números, especulam sobre a possibilidade de uma estagnação de crescimento ou mesmo uma recessão na indústria global de luxo, um sentimento reforçado pela aparente ‘contaminação’ da percepção geral disso nos concorrentes e conterrâneos do LVMH: o Kering e a Hermès viram suas ações caírem 2,61% e 1,44%, respectivamente, também na quarta e nessa quinta. E estão todos apreensivos.

O motivo por trás da quarta nada silenciosa do LVMH na Bourse foi a divulgação, na noite da véspera, do balanço do terceiro trimestre. Em azul forte, as receitas entre julho e setembro chegaram a €20 bilhões (R$ 107,4 bilhões), 9% maior que as do trimestre imediatamente anterior, que por sua vez tinham aumentado 17% em relação ao primeiro trimestre de 2023.

Analistas e investidores esperavam por números razoavelmente mais positivos, embora os divulgados estejam alinhados com projeções que indicam o ‘fim técnico’ da recessão nos mercados mundiais de produtos de alto padrão, e de um setor que deverá movimentar US$ 1,2 trilhão (R$ 6,1 trilhões) em 2023, com um aumento anual de 4%, somente de 2024 pra frente ‘zerando’ as perdas da COVID-19, como uma da Euromonitor, de julho.

Mas, na verdade, foi um outro resultado específico que saltou aos olhos da turma de financistas: as vendas da divisão de vinhos e destilados do LVMH, da qual carrega duas de suas 25 marcas na sigla de sua denominação legal (LVMH Moët Hennessy Louis Vuitton), despencaram 14% nos últimos três meses, para €1,5 bilhão (R$ 8 bilhões).

Mesmo sendo um ‘nicho’ diante do faturamento total do gigante do luxo – somou perto de €4,7 bilhões (R$ 25,2 bilhões) dos €62,2 bilhões (R$ 334 bilhões) totais faturados nos nove meses encerrados em setembro – é um carregado de significados. Assim como um forte desempenho nos valores gerados por essas bebidas implica oportunidades, o contrário também vale. Atreladíssimas ao conceito de prazer exclusivo, champanhes como o Moêt & Chandon, e conhaques como o Hennessy, quando vendidos aos montes em certos mercados, podem ser vistos como indicadores da saúde econômica nos mais relevantes.

No caso de uma divisão tão sensível como essa, que parece enfrentar percalços, pode ser um sinal de alerta sobre aspectos mais amplos da empresa e na economia, como questões de gestão ou problemas de cadeia de suprimentos.

Margens altas na venda de vinhos e drinks espirituosos podem contribuir significativamente para a lucratividade da empresa, mesmo que a divisão não seja a maior em termos de receita. Um forte desempenho na divisão de vinhos pode indicar uma empresa bem diversificada, capaz de gerar receitas de múltiplas fontes. Por fim, um aumento nas vendas pode refletir tendências de consumo favoráveis que podem ser aplicáveis a outros departamentos.

Assim como nos balanços, oscilações em pregões contêm surpresas – em um só, bastam algumas horas para que US$ 12 bilhões se evaporem. Mas em outro podem ressurgir líquidos, como no de 22 de abril de 2021, uma quinta-feira, quando US$ 2,3 bilhões (R$ 11,6 bilhões) inundaram as contas, e ainda nas primeiras operações do dia.

Tamancadas: Quando o grito do luxo ecoa pelos mares

A quarta-feira (11) não foi desastrosa apenas para o LVMH. Longe da Bourse de Paris, a Birkenstock, centenária fabricante alemã de sandálias, fez sua aguardada Oferta Pública de Ações (IPO) na Bolsa de Valores de Nova York. Seu CEO, Oliver Reichert, foi quem tocou o sino para abrir o pregão em Wall Street. Contrariando suas expectativas de atrair investidores com o badalo, a recepção foi menos do que calorosa.

Apesar do entusiasmo gerado durante o road show, a Birkenstock conquistou o raro feito de estrear em queda: o preço por ação foi fixado em US$ 46 (R$ 232,30) na pré-abertura de terça-feira (10) e terminou o dia valendo US$ 40,20 (R$ 203,01), uma queda de 12,6% em relação à sua primeira cotação.

A expectativa era que a marca de calçados, fundada em 1774 na Alemanha e recentemente destacada no filme “Barbie”, capitalizasse o sucesso de marketing do filme. Nessa quinta-feira (12), entretanto, a ação da Birkenstock se desvalorizou 6,59%, se distanciando ainda mais do market cap esperado para o IPO – US$ 10,5 bilhões (R$ 53 bilhões) – com uma capitação de pouco mais de US$ 7 bilhões (R$ 35,3 bilhões). Os ‘wall-streeters’, mesmo usando suas Birkens como se fosse esse seu prazer secretamente luxuoso, parecem entender que, em termos de capital, investir nelas pode ser uma tamancada no pé.

O fluxo do luxo: História, evolução, e o impacto na macroeconomia

A palavra “luxo” tem origens antigas, vindo do latim “luxus”, que significa “exuberância” ou “excesso”. Desde que esse conceito surgiu, ele tem sido uma representação de poder, status e riqueza. Contudo, sua definição é fluida e muda de acordo com a cultura, o tempo e a perspectiva individual.

A Gucci, criada em 1921, definiu luxo como artesanato e exclusividade. Décadas depois, durante um período tumultuado nos anos 1980 e 1990, a maison italiana ficou associada a controvérsias e assassinatos, tornando o luxo um conto cafonérrimo e sombrio. Como toda boa história, a Gucci renasceu, se reinventou e redefiniu o luxo não mais como ostentação, mas como celebração da autenticidade e criatividade.

O boom econômico do Brasil entre 2000 e 2015, principalmente, gerou uma supernova de novos ricos surfando na onda emergente do país. Para muitos deles, a forma de expressar essa conquista era por meio de um cinto da linha Double G da Gucci, com suas fivelas brilhantes de letras GG invertidas – algo considerado cafona pelos velhos ricos. O produto icônico carrega um significado profundo.

No começo do século 20, estilistas ainda não costumavam destacar suas logomarcas nas peças que criavam, o que só começou a ser feito por volta da década de 1930. Quando Guccio Gucci fundou a Gucci, a grife sequer tinha uma logomarca. Somente quando seu filho Aldo entrou na empresa, em 1933, e criou um logo a partir das iniciais de seu pai, que a Gucci passou a ser reconhecida por suas icônicas letras GG – àquela altura já reconhecida por prezar pela qualidade de seus produtos, praticamente feitos à mão.

O GG que agora automaticamente se associa a ela serviu para diferenciá-la de outras tantas casas de moda da época, que também priorizavam a excelência, mão esqueceram da necessidade da exuberância.

Os anos 2000 impulsionaram o vestuário e acessórios com logos a um patamar de visibilidade nunca antes visto – a ‘logomania’ – com efeitos que podem ser sentidos até quase três décadas depois, e tal como sempre foi desde até antes disso.

O que mudou foi outra coisa: os mesmos brasileiros que adoravam o acessório no passado, hoje o consideram esteticamente gritante, e aderiram ao ‘quiet luxury‘. São os novos ricos da hora que mantêm o item em alta.

A Moët & Chandon foi fundada por Claude Moët, um comerciante de vinhos. Ele foi um dos primeiros a reconhecer o potencial internacional para o champanhe, que nos primórdios era mais um produto agrícola local do que um símbolo de luxo. Claude trabalhou arduamente para comercializar o champanhe, chegando até mesmo a vendê-lo para a corte de Luís XV. A associação com a realeza e a elite social ajudou a transformar a percepção do champanhe de Claude em um produto de luxo.

Quanto à Hennessy, foi fundada em 1765 por Richard Hennessy, um oficial irlandês que serviu no exército do Rei Sol. Originalmente, a Hennessy não tinha o glamour que tem hoje. Era só uma destilaria de conhaque situada na cidade de Cognac, na França. A marca se tornou um ícone de luxo quando começou a fornecer conhaque para famílias reais e ‘one percenters’ ao longo dos séculos, adquirindo um ar de exclusividade.

Ambas as empresas enfrentaram desafios ao longo de sua existência, incluindo guerras, crises econômicas e mudanças nos gostos dos consumidores. No entanto, através de marketing astuto, associação com figuras de alto perfil, e manutenção de padrões de qualidade elevados, elas conseguiram ascender ao status de símbolos de luxo. O próprio champanhe, antes de se tornar o símbolo de luxo e celebração que é hoje, era originalmente um vinho espumante produzido na região de Champagne, na França.

Como outros vinhos, era fundamentalmente um produto agrícola, feito a partir de uvas cultivadas localmente. No início, ele não tinha a conotação de luxo ou exclusividade que tem agora. Era consumido localmente e também vendido para mercados mais próximos.

Em seus estágios iniciais, o champanhe enfrentava diversos problemas técnicos, incluindo a tendência das garrafas a explodirem devido à pressão do gás carbônico. Era ainda menos consistente em qualidade, comparado aos padrões modernos. Foi apenas graças aos avanços na técnica de produção e no marketing – incluindo sua associação com a realeza e a aristocracia – que o champanhe começou a se transformar, de um produto agrícola regional, em um artigo de luxo conhecido mundialmente.

No século 19, a produção de champanhe na França disparou, atingindo cerca de 20 milhões de garrafas em 1850, ante a média 300 mil garrafas anuais da década anterior. Muito desse sucesso pode ser creditado às celebrações de fim de ano e às cerimônias de batismo de navios, eventos nos quais o champanhe tinha lugar de destaque, e tradições resultantes da Revolução Industrial, que virou o mundo de pernas para o ar.

Até então, os seres humanos nunca haviam produzido tanto, e o modo de produção capitalista, entre outras coisas, também resultou no mercado de commodities, cujos contratos fechados eram celebrados com champanhe. Assim como a ‘cristianização naval’ dos navios construídos para transportá-las, quando lançá-los ao mar.
No século 19 e no começo do século 20, houve um crescimento significativo em marketing de champanhe. Fabricantes da bebida reconheceram o valor da publicidade e aproveitaram oportunidades da ocasião, como lançamentos de navios para promover, seus produtos.

A escolha de usar champanhe, uma bebida frequentemente associada à elite e a ocasiões especiais, reforçou sua imagem como uma bebida de luxo. Navios, especialmente navios de guerra ou grandes transatlânticos, eram símbolos de poder, tecnologia e grandeza. Associar o champanhe a tais feitos de engenharia e grandiosidade elevou ainda mais sua estatura.

E um simples monge, chamado Dom Pierre Pérignon, também teve um papel crucial nessa história. No século 17, ele desenvolveu técnicas que tornaram a produção e o engarrafamento do champanhe mais simples e econômicos. O fato de que a fortuna de Arnault pode ser tão significativamente afetada por mudanças na demanda por champanhe, e por consequência causa essas flutuações nos mercados, evidencia tanto a importância e a solidez quanto a vulnerabilidade daquilo que, de fato, é o maior ativo do francês: o silêncio de seu luxo, aqui quase uma matéria-prima.

A genialidade de Dom Pérignon não só aprimorou a técnica de produção, mas também democratizou o acesso a essa bebida até então exclusiva, permitindo que mais pessoas brindassem aos bons momentos com uma taça de champanhe em mãos.

O setor de luxo atua como um “indicador” porque os padrões de consumo de bens de luxo frequentemente refletem a saúde econômica geral. Quando a economia está indo bem, as vendas de artigos de luxo geralmente disparam, à medida que os consumidores sentem-se mais confiantes em fazer compras dispendiosas. Da mesma forma, uma queda nas vendas de bens de luxo pode ser um sinal de que os consumidores estão cortando gastos, o que pode prever uma desaceleração econômica mais ampla.

Simultaneamente, o setor também é um “influenciador” porque as decisões tomadas por grandes conglomerados de luxo podem afetar várias outras indústrias. Por exemplo, se uma marca de luxo decide investir em práticas sustentáveis, isso pode estimular a cadeia de fornecimento inteira — dos fabricantes de matérias-primas aos varejistas — a adotar métodos mais sustentáveis. Além disso, tendências estabelecidas no mundo do luxo frequentemente “descem” para o mercado em geral, afetando as decisões de compra e estilos de vida de um espectro muito mais amplo de consumidores.

Quando o mundo do luxo muda – seja adotando o “luxo silencioso” para se diferenciar em um mercado saturado ou enfrentando desafios econômicos como queda de ações – as ondas dessas mudanças são sentidas em vários setores e camadas da economia, inclusive pelos que as geram.

A Dom Pérignon, por sinal, também integra o guarda-chuva de marcas notáveis do LVMH, o único conglomerado presente em todos os segmentos da indústria do luxo: Vinhos & Destilados, Moda & Artigos de Couro, Perfumes & Cosméticos, Relógios & Joalheria, Varejo Seletivo e Outros Negócios. A trajetória do champanhe, de suas origens humildes e silenciosas até o estrelato global gritante, espelha a ascensão desse império, que reflete a da própria sociedade em geral: o cenário de luxo mostra um mundo em constante evolução. A Gucci reformula sua identidade, os novos ricos brasileiros ditam suas próprias regras de estilo, a Moët e a Hennessy resistem ao teste do tempo. Mas como no perpétuo ciclo da alta sociedade, hoje brindam por cima, amanhã podem ser brindados por baixo. A imprevisibilidade permanece como a única constante.

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