Após chamar atenção de Kanye West e Kim Kardashian, Juliana Nalú mira voos mais altos: ‘Brasil precisa de top negra’

“Um amigo diz que minha vida tem tanta história inacreditável que daria até um filme”, diz a top Juliana Nalú como se a rápida ascensão no mundo da moda, de quem deixou uma comunidade no Rio de Janeiro e hoje estrela campanha para a grife de Kim Kardashian não fosse, de fato, digna de cinema.

Para a carioca de 24 anos, que desde criança sonhava em ser modelo, a ascensão é mais a concretização desses objetivos. Nas passarelas desde os 14, se acostumou a chamar a atenção por onde passava, mas antes de cultivar amizades com celebridades como Lewis Hamilton e Diplo, e estampar a campanha da Skims, marca de underwear de Kardashian, relata ter sofrido xenofobia e racismo nos Estados Unidos e na Inglaterra, onde morou antes.

“Era tudo velado, mas eu percebia que faziam as maquiagens e cabelos das meninas brancas e loiras primeiro e, nos últimos 5 minutos, me davam alguma atençãozinha – até porque não sabiam como arrumar meu cabelo”, contou em papo com GLMRM.

“Eu trabalho para que as new faces não sofram mais isso e para que o black e cacheado seja valorizado como o liso é”.

A realidade de Juliana mudou porque já conseguiu certo status na profissão, mas ela sabe que jovens negras e brasileiras ainda enfrentam as mesmas situações no início da carreira internacional. “Chegaram a me falar para diminuir meu quadril, emagrecer, mas não me sinto bonita mais magra”, afirma.

Como toda new face, Juliana cita Gisele Bündchen como referência de brasileira que conquistou seu espaço e foi além da moda, mas faz uma ressalva: “Ela abriu várias portas e colocou as modelos brasileiras no ranking, mas é branca.”

“A gente também tem que ter uma top model maravilhosa e negra, afinal, tem muito mais preto no Brasil”, diz, com a confiança de quem quer alçar voos muito maiores do que já conquistou.

Festa com Kanye

Vivendo em Los Angeles há seis anos, Juliana começou participando de campanhas de gigantes como Urban Outfitters e American Eagle. Mas foi um golpe de sorte — ou o fato de estar no lugar certo na hora certa — que fez receber um convite da diretora-criativa da marca de Kim Kardashian para ser um dos rostos da nova campanha.

Tempos atrás, Juliana estava numa festa de outra Kardashian, Kendall Jenner, quando foi notada por ninguém menos do que Kanye West, dono da Yeezy e ex-marido de Kim, com quem tem quatro filhos.

“Estava com um amigo em uma festa que tinha Justin Bieber, Drake e outros famosos, fui ao banheiro e, quando saí, vi que Kanye West estava no corredor olhando para mim e rindo. Por um momento, não entendi se ele estava realmente me olhando ou tinha usado alguma coisa”, lembra, modesta. “Quando passei, ele elogiou minha roupa e pediu para a assistente anotar meu número para futuros trabalhos”.

A campanha com Kanye ainda não rolou – talvez pelos altos e baixos na vida do rapper nos últimos tempos, com a separação com Kim e os problemas de saúde mental que enfrenta. Mas os dois costumam se falar eventualmente e Juliana acredita que logo ele deve lançar uma nova coleção.

“Eu realmente vim da favela e eu não me deslumbro com essas coisas, mas fico muito feliz com a oportunidade que Deus me dá de alcançar lugares tão altos, sabe?”, diz.

‘Língua do amor’

Nascida e criada na favela do Complexo do Chapadão, no Rio de Janeiro, Juliana começou a realizar alguns dos sonhos de infância ao vencer o CUFA – Solte seu Brilho, um concurso realizado pela Rede Globo em parceria com a Central Única das Favelas. Dali para trabalhos na Espanha, Grécia e Reino Unido foi um pulo. Sem oportunidade de estudar inglês na infância e adolescência, começou a modelar no exterior sem entender uma palavra no idioma.

“Passei duas semanas chorando no quarto por não falar inglês, mas percebi que precisava levantar a cabeça e me jogar”.

Demorou apenas um ano e meio para aprender um bom inglês no dia a dia, sem aulas. Nesse ínterim, virou inspiração da letra da música “Love Language”, de Kehlani, artista indicada a um Grammy em 2016 de “Álbum do ano”. A canção, inspirada no romance da brasileira com o produtor musical de Kehlani, fala sobre um casal apaixonado, e faz referência ao português da modelo: “Eu quero ser fluente em sua língua do amor”.

A mesma garota

Mesmo cercada de celebridades internacionais e cheia de histórias, Juliana diz que consegue ser grata pelas conquistas e permanecer fiel à sua essência.

“Graças a Deus, estou em uma posição economicamente mais confortável para ajudar minha família, esse é o meu luxo”, diz ela, que conseguiu mudar a família do Complexo do Chapadão e banca as faculdades da mãe, de psicologia, e do irmão, que cursa odontologia.

Antes da nova temporada de trabalhos, festas em LA e viagens pelo mundo, curte a família e amigos até o fim de agosto no Rio de Janeiro. A cidade é onde a modelo recarrega as energias para continuar abrindo portas para as próximas gerações de meninas negras e brasileiras que sonham em conquistar uma carreira internacional na moda.