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A história de amor com o ex-morador de rua, Paulo Sergio, é um dos relatos da obra de Soninha Francine || Créditos: Reprodução FaceBook

“Eu sempre pensei em escrever um livro com o título “Quase tudo que eu queria deu errado, e tudo bem”. Contar os perrengues da minha vida, sonhos, planos abortados, até chegar – em vários momentos, inclusive o atual”. É assim que Soninha Francine começa sua entrevista com o Glamurama para falar sobre o momento que vive com o lançamento do livro “Dizendo a que veio”. Atrevida, feminista, jornalista, ex-VJ, budista e tudo mais, ela se apaixonou por um morador de rua, e por essa paixão lutou muito.

A história desse amor tão improvável, entre uma mulher de classe média e um sem-teto alcoolatra, é um dos relatos da obra, que ainda apresenta seu lado mais pessoal ao contar detalhes da infância, a gravidez na adolescência, depressão e a experiência com a leucemia da filha caçula.

Detalha ainda os bastidores de seu convívio com protagonistas da política brasileira, como José Serra e João Doria, a pressão e as lutas internas pelo poder na Prefeitura de São Paulo. Política, inclusive foi a pauta principal do nosso bate-papo, em que ela revela que apesar de querer mais tempo como vereadora, sua maior pretensão é ser prefeita. De olho na conversa!

Glamurama: O que tem no livro que você ainda não contou nas entrevistas que deu?
Soninha:
Detalhes. Os “bastidores” de algumas situações bem conhecidas na política e na vida pessoal ou alguns momentos específicos não revelados antes.

Glamurama: Acha que o Brasil tem jeito?
Soninha:
Quando desanimo, olho para avanços incríveis que tivemos nas últimas décadas, apesar dos imensos problemas. A pauta LGBT, por exemplo, tem conquistas e mais conquistas! Quando nem assim me animo, olho para casos extremos – a Alemanha foi palco de atrocidades na Segunda Guerra, Muro de Berlim, e hoje é um lugar exemplar em muitas pautas (meio ambiente, energia, direitos civis, entre outras).

Glamurama: Ainda pretende se candidatar a algum cargo?
Soninha:
Quero ter mais um tempo como vereadora, e minha maior pretensão é ser prefeita.

Glamurama: Se fosse presidente do Brasil, quais medidas adotaria?
Soninha:
Em um mundo em que uma presidente pudesse tomar algumas decisões sem precisar do Congresso, eu estabeleceria regras para regulamentar o comércio de maconha, de modo a tirar essa atividade muito lucrativa das mãos do narcotráfico (e reconheceria imediatamente a autoridade dos médicos para receitar remédios devidamente testados à base de canabidiol, sem submetê-los a procedimentos ridículos); deixaria de considerar culpadas de homicídio as mulheres que interrompem uma gravidez até oito semanas após a fecundação; determinaria que estupro e homicídio são crimes e não atos infracionais, independentemente da idade dos autores. Mas como nada disso é tarefa de presidente, embora as pessoas perguntem isso aos candidatos o tempo todo, vou ser mais realista: de cara mudaria o nosso regime tributário para deixar mais recursos nas cidades, em vez de concentrar uma parte brutal para a União.

Glamurama: No seu ponto de vista, o que é mais urgente para o país hoje em dia?
Soninha:
URGENTE deter a violência. Estamos em uma escalada medonha que tem de ser revertida. Jovens sem perspectivas, as pessoas perdendo cada vez mais o respeito umas pelas outras – idosos, crianças, ninguém escapa do desprezo pela vida. O tecido social está comprometido demais, precisamos de um grande pacto em torno de um projeto de reconstrução de valores!

Glamurama: Já tem candidato para essa eleição? Na sua opinião qual será o resultado?
Soninha:
Ainda preciso decidir porque existem várias candidatas e candidatos que apoio… E acho que, embora a campanha seja curtíssima, o resultado vai ser muito diferente do que as primeiras pesquisas apontam! Além de milhões de eleitores indecisos, outros que já tem certeza de seu voto vão mudar de opinião.

Glamurama: O que acha do Bolsonaro brigando pela liderança nas pesquisas?
Soninha:
As pessoas escolhem o Bolsonaro muito mais por rejeição para determinadas situações (concretas, imaginadas ou simbólicas) do que por outras razões. Odeiam a esquerda, e em grande parte porque associam à corrupção e “pouca-vergonha”, não sabem identificar com clareza o que significa ser de esquerda. Tem gente que realmente pensa como o Bolsonaro e aprova sua trajetória, mas tem quem acredita que ele representa moralidade, eficiência, honestidade, etc… e nem sabe exatamente o que já fez, como é e o que pretende. Minha convicção é de que os que realmente pensam como ele e seu vice (“não merece nem ser estuprada”; “herdamos a indolência dos índios e a malandragem dos negros” e outras barbaridades) não são nem de longe a maioria dos eleitores do Brasil. Quanto mais conhecer, mais gente honesta e consciente vai concluir que ele não é a solução de nossos graves problemas.

Glamurama: Como foi sua experiência de secretária de assistência social da administração Dória? E sua relação com ele?
Soninha:
Foram dois capítulos diferentes. No primeiro – de novembro de 2016 a janeiro de 2017 -, o prefeito me ouviu bastante, não só em relação à Assistência Social mas também outros assuntos, mobilidade, por exemplo, e acatou várias sugestões e pedidos. Depois passou a não acreditar mais em mim – principalmente nas dificuldades ou impossibilidades que eu apontava, que ele considerava serem resultado de limitações minhas. Então foi difícil ser Secretária sem ter muito respaldo do chefe; mesmo assim, consegui fazer algumas coisas importantes, daquelas que dão fruto com o tempo – e saí de lá sabendo dez vezes mais sobre a Assistência Social no município do que seria possível saber sem ter dado esse mergulho.

Glamurama: Falar do amor com o Paulo em um livro não é assunto fácil. Qual a importância de se abrir sobre esse relacionamento?
Soninha:
Ter um relacionamento que foge da “regra”, alcoolatra, reprovado na família e na sociedade são situações que causam sofrimento em muitas pessoas. Quem sabe a minha história pode ser um alento para leitoras e leitores, tanto quanto a vida de outras pessoas me serviu como inspiração.

Glamurama: Como é a relação entre vocês? Ele superou o alcoolismo?
Soninha
: União instável [brincadeira]. Moramos juntos, dividimos tudo, fazemos planos, brigamos. Casamento, sabe como é. Alcoolismo é uma doença crônica sujeita a ter crises ocasionais, e elas acontecem. Como dizem, “não existe ex-alcoólatra”. O Paulo pegou verdadeira aversão à pinga, com a qual viveu uma relação diária e intensa por 20 anos, e nunca mais tomou. Mas é difícil resistir ao álcool mais suave, como um vinho ou licor, que estão nas situações mais “inocentes”.

Glamurama: Como foi construir essa relação cheia de desafios e preconceitos?
Soninha:
Pode parecer bonito de longe, mas muitas vezes foi feio. Houve momentos em que não estava suportando lidar com ele, com o alcoolismo, com a instabilidade emocional, com o tumulto – e não tinha para onde correr e pedir “apoio moral”. As pessoas que normalmente me ouviriam estavam “contra” mim…

Glamurama: O fato de ser um desafio e tanto aumentou seu interesse por ele?
Soninha:
Apesar de ele ter ostensivamente me ignorado quando o conheci, sabia que lá no fundo ele tinha sido afetado por mim. Desafio seria só descongelar aquele coração empedernido.

Glamurama: O que sua família acha dessa relação? Como tem sido lidar com isso?
Soninha:
Algumas pessoas acham “valente” da minha parte. Outras não conseguem entender e reprovam completamente. Tem também quem não compreende muito bem o que foi que eu vi nele, mas concluem que precisam se conformar com minha escolha. Na prática tento descobrir primeiro se meu marido será aceito, tolerado ou rejeitado em cada situação, e decido se vou ou não às reuniões de família, etc. Já perdi algumas festinhas por causa disso… Prefiro não ir do que ter de ir sozinha.

Glamurama: Não pensou que poderia ser arriscado colocar um morador de rua dentro de casa com uma filha jovem?
Soninha:
Acharia arriscado colocar uma pessoa desconhecida, mas ele não era “um morador de rua”, era o meu amigo e namorado. É verdade que já coloquei pessoas razoavelmente “estranhas” pra dentro de casa – um ex-interno da Febem ameaçado pela bandidagem, meninos pedindo esmola em noites de frio – e coloquei todo mundo em risco, mas esse não era o caso.

Glamurama: O que aprendeu com o Paulo e o que acha que ele aprendeu com você?
Soninha:
Aprendi a cuidar melhor de mim e da casa, por incrível que pareça. Ele aprendeu a ser menos radical no julgamento de outras pessoas, a compreender as dificuldades dos outros. E vem ampliando o repertório de referências: filmes, lugares, cultura e arte em geral.

Glamurama: Qual a maior diferença entre ele e os outros caras com quem se envolveu?
Soninha: Ele não tem um pingo de ciúme de outros homens, o que é maravilhoso, mas fica puto com o trabalho invadindo os horários que seriam “nossos” pelo celular ou computador. Quanto às diferenças: ele me pôs na linha (aparência, organização), coisa que os outros nem tentaram. Hoje escolho roupa antes de sair de casa – antes vestia a primeira camiseta da pilha e pronto – e paro de usar um tênis bem antes de ele se desfazer por completo.

Glamurama: Já tinha percebido que sua vida ia caminhar para esse lado, que sua cara metade não estava no universo que frequentava?
Soninha:
Sempre vivi em universos diferentes e soube que não seria capaz de adivinhar de qual deles viria meu próximo amor!

Glamurama:  O que acha que aconteceu para se apaixonar por uma pessoa com outro repertório?
Soninha:
Eu acho sinceramente que, a menos que uma pessoa tenha um gosto muito exigente, a gente pode se apaixonar por qualquer um.

Glamurama: Quais seus projetos atuais?
Soninha:
Tenho tratado muito do Rio Pinheiros buscando unir forças e trazer recursos para obras de despoluição dos córregos que o alimentam, oferta de moradia para quem vive “pendurado” nas margens e implantação de Parques Lineares, além de outras intervenções. Também apoiamos a implantação de hortas urbanas, reciclagem e compostagem. Estou conduzindo um debate sobre o funcionamento dos Conselhos Tutelares na Comissão da Criança e Adolescente, presidindo a CPI dos Valets, analisando o PL da Política Municipal de Drogas e estudando profundamente o orçamento da cidade para ver de onde dá pra tirar recursos pra ter mais dinheiro para tudo que a gente quer fazer. Adianto uma conclusão: vai ter de ser daqui mesmo, do Legislativo (Câmara Municipal e Tribunal de Contas). A gente vive com um orçamento folgado enquanto a cidade toda está no aperto – não dá. (Por Morgana Bressiani)

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