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Mesmo colhendo frutos de avanços e barreiras rompidas, há quem diga que a geração atual sofre com um novo pensamento pra lá de careta e que vivemos tempos enfadonhos, nos quais nada se pode e tudo parece incorreto. J.P foi investigar

Por Julia Reina para a revista J.P

Não há quem não caia naquela velha discussão, seja na sala de aula ou no boteco, que a história é cíclica. Ou seja, caminhamos para frente e depois para trás, fazendo paradas, de tempos em tempos, em problemas e questões políticas e sociais muito similares. Assim, depois de uma era de liberdade, paz e amor, nos deparamos com uma turma que aparenta ser uma das mais caretas de todos os tempos – em pleno 2016 – e é também conhecida como os politicamente corretos. Afinal, estamos chatos demais?

O dicionário informal define: careta é aquele que sempre segue os padrões antigos, que não se arrisca a coisas novas, é fora da moda e antiquado. “É não conseguir lidar com o novo ou com o diferente e se fechar, não se permitir”, diz o psicólogo Diego Bragante, especialista em psicoterapia cognitivo-comportamental. Em outros tempos, ser careta era ser tradicional, ter uma postura retrógrada e até apoiar regimes ditatoriais. Uma linha de pensadores modernos suporta a ideia de que, embora haja um clamor por direitos e liberdade, ao contrário de caminhar na direção de uma cultura libertária, uma parcela da sociedade está mais controladora e opressora. “A caretice prega que exista uma atitude determinada para cada situação. Os caretas fazem patrulha, criticam e julgam o que é diferente, independentemente de suas crenças. Todos se colocam na radicalidade e não percebem que, quanto mais a gente se organizar dessa forma, mais polarizados estaremos. Se fôssemos livres, não brigaríamos”, afirma a filósofa Viviane Mosé.

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“Se você analisar a história, vemos que estamos mesmo mais certinhos. A geração anterior, a dos anos 1960, por exemplo, foi a que quis quebrar barreiras. A atual, por outro lado, quer mais certezas e estabilidade, é um movimento natural. As pessoas buscam na religião, na moral e nos costumes um parâmetro de segurança”, completa Bragante. Para ele, embora esses parâmetros sejam vistos como retrocesso, são necessários para manter o equilíbrio geracional, já que, historicamente, os valores de uma geração tendem a se contrapor à geração anterior. “Toda vez que alguns conceitos são desconstruídos, há quem defenda o novo e quem preserve o antigo. Mas nem tudo o que é conservado pode ser considerado um retrocesso”, afirma.

Power to the people

Atualmente, a expressão “empoderamento” permeia cada vez mais discursos de diversas naturezas. Mas será que essa nova forma de ser careta não está, na verdade, impondo uma falsa liberdade, exigindo que todos pensem da mesma forma? Seriam os “novos caretas” os tiranos da ideologia? “É ilusão achar que não é antiquado brigar por direitos de forma exagerada”, dispara Viviane. A opinião vai ao encontro da do também filósofo Luiz Felipe Pondé: “A fúria, que é típica da caretice política, está tomando todos os pilares da sociedade moderna. As pessoas estão, além de caretas, violentas e hipócritas”. Para o filósofo, o moralismo visa acabar com o sofrimento e a angústia que são naturais do ser humano. O conceito prega um homem plenamente limpo, saudável, sem contradições, polido, e um mundo perfeitinho. No entanto, existe uma diferença entre ser careta e apenas ter disciplina. “Para quem valoriza o caos, acordar cedo e ser geração saúde é careta, mas você pode ser comunista e disciplinado. O problema está nos excessos, tanto de um lado como do outro”, reflete Bragante.

Na busca superficial pela igualdade e por sentimentos como plenitude, liberdade e felicidade é talvez onde esteja a maior caretice: “A vida é sem garantias, incoerente e confusa, e o novo careta, que eu prefiro chamar de neopuritano, é aquele que se apega a essa busca por uma vida asséptica para não sofrer. Essa ideia de todo mundo igual, do politicamente correto, isso é uma chatice”, analisa Pondé.

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Estaria, então, tudo mais enfadonho e quadrado? Com a presença tão intensa de redes sociais, regras são ditadas o tempo todo e, para os radicais, quase nada é permitido e ter qualquer posicionamento contra a maré é praticamente colocar um alvo nas costas – ou na timeline. “Vivemos a época dos ofendidos, a geração do ressentimento. É tudo histérico, não podemos opinar porque qualquer coisa vira falta de respeito, mas a hipocrisia é o que está na base dessa nova caretice social”, define Pondé. E Viviane ainda vai além: “Nesse modelo das redes sociais, as pessoas se relacionam só com os amigos e os amigos dos amigos, em guetos, sem noção do todo. Isso é o que há de mais retrógrado”.

Então não temos saída? A resposta é a liberdade de fato, não a teórica. “A não caretice seria todos os grupos convivendo com suas diferenças, sem essa burrice ideológica de não pode fazer isso, não pode falar aquilo. Estamos nos abrindo para o novo? Não, então estamos retrocedendo”, afirma Viviane.

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