Da Revista Joyce Pascowitch de março por Aline Vessoni
Gabriela Shapazian tinha 16 anos quando, em 2015, eclodia o êxodo de refugiados para Europa, a maior crise humanitária desde a Segunda Guerra Mundial. Era 1 milhão de pessoas chegando ao continente europeu – 800 mil só pela Grécia. Foi quando ela não pensou duas vezes em arrumar as malas para partir com a mãe, a jornalista Kety Shapazian, para a ilha grega de Lesbos, onde fariam um trabalho voluntário. Direitos humanos sempre foram assuntos recorrentes dentro de casa, desde que Gabi era pequena. Quando desembarcaram, a região ainda não contava com a ajuda de órgãos internacionais como a Cruz Vermelha, Médicos Sem Fronteiras, nem mesmo do governo grego. Voluntários chegavam vindos do mundo inteiro, e se organizavam na divisão de tarefas como receber os refugiados, trocar as roupas molhadas por secas, distribuir sanduíches, frutas e água e encaminhá-los para campos de transição. “Tinha gente que só se ocupava com a distribuição de roupas ou de comida. Mas tinha também quem estava lá só para abraçar os recém-chegados, pegá-los pela mão e dizer que estava tudo bem”, conta Kety para a J.P. Foram 45 dias ajudando pessoas que haviam cruzado fronteiras a pé ou de barco, tendo de sair às pressas de países como Afeganistão, Irã e Síria, muitas sem família, tendo de escolher a vida à guerra. Depois de tantas histórias de luta, mãe e filha voltaram ao Brasil, mas Gabi sentiu que não se encaixava mais aqui: não fazia sentido algum estudar, prestar vestibular, exercer uma carreira como se nada estivesse acontecendo na Grécia.
A brasileira se colocou no lugar das pessoas que ajudou. Sentir junto ou compreender o que o outro sente, de acordo com a professora e pesquisadora Claudia Feitosa-Santana, é ter empatia. Segundo ela, com exceção dos psicopatas, todos os seres humanos são dotados desse sentimento; já se nasce com um repertório empático automático, que ela chama de contagioso.
“Ele simplesmente acontece. Por exemplo, basta pensar em alguém prendendo o dedo na porta do carro que já nos retorcemos, não é mesmo?” Mas há um segundo tipo de empatia, o cognitivo, que requer esforço e é passível de ser treinado e ampliado. “Uma forma de termos uma sociedade melhor é investir na diversidade. As crianças deveriam estudar em escolas com várias etnias, religiões, porque quando ela convive com a diversidade, ela já é automaticamente mais empática, por enxergar os outros como iguais e não como diferentes. Mesmo assim, vale relembrar que é impossível empatizar com todo mundo.”
Flores para Refugiados
Quando Gabi decidiu voltar para lá, teve o apoio total da mãe, que começou a vender flores no farol de São Paulo para pagar as viagens da filha. Mas o projeto cresceu, saiu dos semáforos e, hoje em dia, além de custear o voluntariado da filha, virou a profissão de Kety. “Refugiado é gente como a gente. Hoje eles são meus melhores amigos”, afirma Gabriela, que continua firme e forte no voluntariado naquele que foi considerado pela mídia estrangeira o pior campo para refugiados em atividade da atualidade, o Moria, na Grécia. “Um dia isso pode acontecer comigo ou com alguém que eu amo. Por isso acredito que todo mundo precisa ter um pouco mais de empatia.”
Como ter mais empatia, segundo Claudia Feitosa-Santana:
• Ser autoempático: reconhecer nossos pontos fortes e fracos e respeitar nossos limites e entender que é impossível empatizar com todo mundo.
• Ser seletivo: ao reconhecer nossos limites, decidimos com quem e quando empatizar, porque esse treinamento da empatia cognitiva requer esforço, por isso é que não podemos nos sentir assim em relação a todo mundo.
• Estar aberto a novas narrativas: ao que tudo indica, nós, seres humanos, aumentamos nosso círculo empático com a invenção da imprensa, que trouxe a expansão da leitura. Hoje, isso também acontece por meio do cinema, TV, internet.
• Ser genuíno: nós somos máquinas de detectar traidores, aquele chefe autoritário ou amigo narcisista, que aprendeu técnicas para se fazer de empático, que usam a pseudoempatia para tentar conquistar alguma coisa da gente. O sentimento precisa ser genuíno para realmente ser efetivo.
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