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Morta aos 20 anos de overdose de cocaína, a paulista Adriana de Oliveira havia acabado de vencer a etapa brasileira de um concurso que a classificou como uma das 12 modelos mais lindas do mundo

Por Paulo Sampaio para revista Joyce Pascowicth de fevereiro

Quando alguém morre de overdose é comum que a família e os amigos lastimem por não ter conseguido evitar o envolvimento da vítima com as drogas. Quando esse alguém é uma garota como a modelo Adriana de Oliveira, jovem, extraordinariamente bela e com um futuro profissional promissor pela frente, a comoção costuma extrapolar o âmbito doméstico e ganhar a capa das revistas, em matérias em que se pergunta: “Como pode?”. No caso de Adriana, morta aos 20 anos, em 1990, quando passava o fim de semana em um sítio no interior de Minas Gerais, a resposta mais provável era a dobradinha “excesso de responsabilidade/falta de maturidade”. De uma hora para outra, os acontecimentos na vida dela ganharam uma dimensão que fugia ao controle da menina nascida e criada em Santo André, no ABC paulista, filha de um metalúrgico e de uma dona de casa.

A consagração veio em 1989, poucos meses antes de seu fim trágico, quando Adriana venceu a etapa brasileira do prestigiado concurso Supermodel of the World, em que concorreu com 7 mil candidatas.  Na ocasião, em uma entrevista para a TV, ela desabafou: “O ambiente de moda é terrível, pesado demais, não dá para ficar à vontade. Já pensei em abandonar a carreira por causa disso”. Tarde demais. Sua agenda profissional passou a demandar dela tamanho envolvimento, e com tal velocidade, que não havia mais a opção de abandonar o plano de “sucesso a qualquer preço”. Na etapa mundial do concurso, em Los Angeles, ela ficou entre as 12 modelos mais lindas do mundo.

A morte precoce de Adriana antecedeu a explosão do mercado dos desfiles de moda. Nos anos seguintes, o crescimento assustador do número de concursos dava  a dimensão da histeria com que milhões de garotas no Brasil sonhavam em ser “Gisele” – Bündchen, referência maior de todas as aspirantes a modelo –, e entrar para o time das supermodelos/celebridades como Caroline Ribeiro, Isabeli Fontana, Adriana Lima, a própria Gisele e tantas outras. Morena, olhos verdes, sobrancelhas expressivas, 1,75 metro de altura, 58 quilos, seu rosto logo passou a aparecer em comerciais de marcas como Kibon, Palmolive, Lacta e Mappin. Na época, chegou a morar no Japão e estava com editoriais de moda marcados em Milão, Nova York e Paris.
Mudança de Rota

A viagem para a morte aconteceu depois de uma festa de casamento, na madrugada de sexta-feira, 27 de janeiro de 1990. Como tudo na nova vida de Adriana, a ida para o sítio Vale a Vista, próximo à cidade mineira de Ouro Fino, não foi planejada. Inicialmente, o fim de semana seria em Camburi, no litoral norte de São Paulo, mas ela e o namorado, o advogado Ciro Roberto de Azevedo Marques, então com 25 anos, resolveram mudar a rota durante a festa. A sugestão veio do filho do  dono do sítio e amigo do casal, Dagoberto da Costa, que, por sua vez, estava com a namorada, Cláudia Bassaneto, também modelo. Adriana não chegou a comunicar aos pais que não iria mais para a praia. Na verdade, os quatro saíram do casamento já bem calibrados, a bordo do Gol branco dela, e chegaram ao sítio na alvorada do sábado. Para acompanhar o espetáculo do nascer do sol, acenderam um cigarro de maconha. Por volta das 14h, quando começou a sofrer as convulsões que a levariam à morte, Adriana de Oliveira já havia bebido, cheirado e fumado.

Tão logo começou a se debater na varanda da casa, em agonia, Ciro (que hoje é pai de uma adolescente) e os amigos entraram em desespero. O medo de ter ido longe demais, e de arcar com a responsabilidade caso acontecesse o pior, levou-os a adiar a busca por auxílio médico. Para tentar apaziguá-la, a fizeram ingerir o tranquilizante Diazepam.  Não adiantou. À convulsão se seguiram asfixia e parada cardíaca. Garotos que brincavam na região ainda ouviram gritos vindos do sítio, mas só avisaram a um dos vizinhos cerca de duas horas depois, quando então a modelo foi transportada para a Casa de Caridade de Ouro Fino. O cardiologista Carlos Alberto Azevedo, que atendeu Adriana, afirmou que a modelo já chegou ao hospital morta. No dia seguinte, ao perceber uma picada em seu braço, uma tia da vítima suspeitou que os amigos haviam injetado cocaína nela. Mas Azevedo disse que a marca foi produzida por uma punção que ele havia feito como último recurso para tentar reanimá-la. Segundo o médico, a modelo provavelmente morrera havia mais de uma hora.

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Nelson e Amélia de Oliveira, pais de Adriana, com foto da filha no álbum de família

 

Acidente Neurológico

Até a publicação do laudo oficial, em cerca de dez dias, as especulações sobre o caso aumentaram na mídia em proporções geométricas. Enquanto Ciro e seus amigos tentavam provar que as convulsões de Adriana tinham sido provocadas por algum acidente neurológico, o delegado encarregado do caso, Carlos Augusto Camargo da Silva, afirmou que decretaria a prisão preventiva dos três, caso houvesse vestígios de cocaína nos objetos recolhidos pela perícia no sítio. Para se proteger, Ciro afirmou que não sabia se a namorada tinha usado “algo escondido”. “Se descobrirem coca nos exames, todos nós ficaremos surpresos”, disse, em uma entrevista para a TV. Em sua inspeção no sítio, os peritos encontraram vários cacos de espelhos, ao lado do local onde Adriana foi vista caída por moradores da vizinhança. A polícia levantou duas hipóteses: ou os espelhos tinham servido de base para estirar as carreiras de pó, ou para verificar se Adriana ainda respirava, depois das convulsões. No mesmo local, os técnicos acharam canudos feitos com papel-alumínio. Dentro da casa, graças a uma faxina feita no mesmo dia, a polícia não encontrou garrafas vazias, nem sequer um copo usado – apesar de a autópsia ter acusado presença de álcool no sangue de Adriana.

Na tarde de quarta-feira, 8 de fevereiro, o Instituto Médico Legal (IML) de Belo Horizonte tinha encerrado os exames. De acordo com o laudo assinado por dois médicos, ela havia cheirado nas horas antes de morrer cerca de 2 gramas de cocaína, tomado o equivalente a três doses de uísque, fumado maconha e ingerido o tranquilizante Diazepam. O delegado Camargo desembarcou em São Paulo disposto a prender preventivamente Ciro, Dagoberto e Cláudia, mas não encontrou nenhum dos três. Eles permaneceram foragidos durante algum tempo até que seus advogados concordaram em apresentá-los à Justiça. Alegaram que, apesar de ficar claro que os três assumiram o risco da morte de Adriana (por não tê-la levado logo ao hospital), não havia provas concretas das responsabilidades. “O juiz entendeu que não houve dolo (intenção). Então, a condenação não foi por homicídio, mas por negligência”, disse a J.P o advogado Dalmo Ribeiro Silva, que defendeu Ciro. Em novembro de 1992, três desembargadores da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Belo Horizonte decidiram pelo impronunciamento, o que livrou os réus do júri. Por fim, a defesa conseguiu provar que se tratou de uma fatalidade que poderia ter acontecido a qualquer um do grupo. A reportagem tentou entrar em contato com o promotor que atuou no caso, mas foi informada que ele havia morrido. O assistente de acusação, José Ronaldo Barsi, encontrava-se de férias.

Como sempre acontece em eventos que juntam rostos conhecidos e mortes trágicas, Nelson e Amélia de Oliveira, pais de Adriana, tiveram de amargar a lembrança da tragédia pela superexposição na mídia durante muito tempo. Nelson morreu há cerca de três anos, mas Amélia ainda corre o risco de, ao virar a página de uma revista, ou mudar o canal da TV para assistir ao noticiário, dar com o rosto deslumbrante da modelo associado a mais um caso de overdose. A dentista Yane Benaglia, amiga de Adriana dos tempos de escola, nega-se gentilmente a fornecer o telefone de Amélia. Ela lembra que, por ironia do destino, a reportagem ligou justo no dia em que a tragédia completava 25 anos (27 de janeiro).

 

 

 

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