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“Rosemary Noronha é uma companheira que nunca me fez mal. O que estão fazendo com ela é masacre”, diz Paulo para a PODER

por Paula Bonelli  para revista PODER de agosto

Paulo Okamotto aprendeu a correr da polícia cedo. Em 1981, aos  25 anos, ele era fresador de ferramentaria da Inbrac, fabricante de condutores elétricos em Diadema, quando se tornou dirigente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.  Sucedeu a diretoria do ex-presidente Lula, que havia sido cassada pela ditadura por conta das históricas greves de campanha salarial. Foi nessa época que passou a ter contato diário com Lula: organizava piquetes e conta que enfrentou um momento dificílimo quando  ficou na linha de tiro de um empresário que disparou contra os grevistas. Saiu ileso. Por causa dessa militância, Okamotto foi detido algumas vezes por curtos períodos de tempo: “Nunca cheguei a ficar preso. Até porque eu corria bastante. Era muito jovem naquela época.” Descreve a primeira vez em que viu Lula, de quem viria a se tornar devoto, em cores míticas: “Foi em uma madrugada na porta da fábrica da Brastemp. Eu sabia que a gente tinha um dirigente sindical que era um protagonista importante, mas não imaginava encontrá-lo panfletando na porta da fábrica; me chamou a atenção”, lembra. Desde então,  a vida dos dois sempre correu em paralelo. Okamotto foi tesoureiro da campanha presidencial de Lula em 1989, presidente do diretório estadual do PT de São Paulo, diretor-financeiro e depois presidente do Sebrae no governo de seu companheiro Lula. Com o fim do mandato de presidente, Lula confiou a ele a presidência de seu instituto – uma casa de três andares de cor creme e vidros fumê à beira do Parque da Independência, localizada no bairro do Ipiranga, zona sul de São Paulo. Foi lá que Okamotto, 57 anos, em uma sala despretensiosa, recebeu PODER.  Logo no início da conversa, ao ser questionado se ultimamente havia muitos jornalistas que o perturbavam, batucou na mesa como quem esquenta os tamborins para mais uma batalha: “Não. Só os da página policial”.

DE BRAÇOS DADOS

Okamotto, sempre fiel a Lula, defende Rosemary Noronha como companheira de partido. Rejeita o título de ser o homem que sempre cuidou do dinheiro do ex-presidente: “Quem faz isso é dona Marisa Letícia”, garante. Mas assume que, por ser presidente do Instituto Lula, além de comandar cerca de 20 funcionários, cuida dos negócios pessoa jurídica de Lula, ao lado de Clara Ant, tesoureira da entidade. Durante a carreira, denúncias sempre respingaram perto de Okamotto. Ele, por exemplo, foi alvo da oposição na CPI dos Bingos, que queria saber de onde veio o dinheiro para pagar a dívida de despesas pessoais de cerca de R$ 30 mil de Lula. Foi acusado ainda por Marcos Valério de ameaçá-lo de morte se revelasse o que sabia sobre o esquema do mensalão.

Nesta entrevista, dá sua versão sobre essas denúncias,  diz que deve muito a Lula, que sua relação com o ex-presidente é “de peão”  – por isso, pagou do próprio bolso a dívida de Lula com o PT – e declara que não pretende processar Marcos Valério porque “é muito caro processar alguém”. Com seu jeito de quem conhece os meandros da política, Okamotto toca o Instituto Lula. Se a própria presidente reconhece que Lula nunca saiu do poder, muitas decisões passam por ali: ministros, políticos, autoridades brasileiras e estrangeiras são recebidos no local. Okamotto só se queixa de o ex-presidente andar tão ocupado com  demandas internas, o que o impede de trabalhar mais para integrar a América Latina e também na missão de ajudar a resolver os problemas da África. A seguir, os principais trechos da entrevista:

PODER: Como o senhor acredita ter contribuído para a trajetória de Lula?

PAULO OKAMOTTO: Acho que não dei nenhuma contribuição, mas ele contribuiu muito para a minha trajetória. Sempre levei em consideração as coisas que Lula falava. Lembro que uma vez ele me disse: “Lá no sindicato, as meninas vão ficar paparicando você, mas não é você. Elas paparicam o diretor do sindicato, o tesoureiro do sindicato…”. Então, sei separar a pessoa física do que sou publicamente.

PODER: Sua família se ressente de sua carreira política?

PO: Eu não acompanhei o crescimento de meus filhos, não participei muito da juventude deles, não tive tempo de discutir com eles. Realmente, foi uma vida de muita ausência em casa, nas principais datas dessa molecada, no aniversário, no meu aniversário de casamento.

PODER: Seus filhos seguiram seus passos na política?

PO: Não. Mas todos são petistas e gostam do PT, o que já é um grande avanço. Tem muito filho que rejeita política ou o partido do pai porque ele era ausente.

PODER: Qual é o perfil do Instituto Lula: de manutenção do acervo, de organização da agenda do ex-presidente ou de gestão de suas intervenções internacionais?

PO: Acho que é um pouco de tudo isso, porque Lula é a figura sem mandato mais importante do Brasil. Ele tem muita coisa a ensinar para a classe política. Quem quer ser um bom político tem de observá-lo. Fico pensando: “Se sou político e tenho oportunidade de conversar com Lula, que é o mais extraordinário político brasileiro, por que não iria conversar?”. Então, essas coisas acontecem muito aqui.

PODER: Por que nem todas as agendas são públicas?

PO: Porque não somos uma instituição pública. Então, não temos obrigação de ficar divulgando nossa agenda.  Mas ela não é secreta. As pessoas podem vir aqui e entrar. Não tem nenhum túnel secreto, não fazemos reuniões à noite. Mas, se alguém liga e o presidente pode, ele recebe essa pessoa – e  isso fica fora da agenda.

PODER: Como vocês tratam internamente o fato de Lula dar palestras para empresas que têm interesses no governo?

PO: Mas não há empresas que não tenham interesses no governo. Aliás, se houvesse, seria ótimo. Se você conhecer alguma…

PODER: Mas, então, qual é o limite? Lula já comentou em palestra da Tetra Pak que agiria para baixar o imposto das embalagens junto ao governo, o que é de interesse dessa empresa.

PO: As pessoas têm de entender o seguinte: Lula está dando uma palestra para animar, para jogar o país para cima. Então, quem o contrata não faz isso para jogar a coisa para baixo. E, às vezes, é preciso falar a verdade e se colocar a favor daquele problema que foi levado. Esse tipo de coisa acontece. Está claro para a empresa e para o Lula que não estamos fazendo lobby, mas uma palestra de animação e de aprendizado.

PODER: Por que todo mundo sempre diz que você cuida do dinheiro de Lula?

PO: Porque as pessoas gostam de fazer calúnias e de me difamar. Fui tesoureiro da campanha de Lula em 1989 – e só. Fui presidente, mas nunca fui tesoureiro do PT.  O que eu cuido mais é da infraestrutura, do operacional.  Por exemplo: se for preciso montar um comitê, eu monto; se for necessário rodar material na gráfica, eu providencio. Mas nesses casos não estou arrecadando, estou gastando dinheiro. Do dinheiro de Lula pessoa física quem cuida é dona Marisa Letícia.

PODER: E quem cuida do dinheiro da pessoa jurídica de Lula, então?

PO: Sou o presidente do Instituto Lula e a Clara Ant, a tesoureira. Nós cuidamos.

PODER: É uma missão fácil?

PO: Não, muito difícil. Primeiro porque recurso no Brasil não é uma coisa fácil, abundante. Tem de ser cauteloso, levar com muita seriedade na hora de gastar porque os recursos são oriundos de doações, de mensalidades e não é fácil conseguir doações. Certa parte da imprensa sempre tenta atribuir que uma doação necessariamente tem uma contrapartida de outro jeito.

PODER: Quando era presidente do Sebrae, o senhor pagou uma despesa de cerca de R$ 30 mil do próprio bolso para o PT em nome de Lula. Com isso, acabou alvo da oposição, vinculado ao esquema do mensalão. Que balanço o senhor faz desse episódio?

PO: É claro que ir para uma CPI e ter toda aquela pertubação é muito ruim. Nesse episódio, de R$ 29 mil e qualquer coisa, fui o responsável porque a gente fazia naquela época o Caravana da Cidadania (campanhas itinerantes que Lula promovia pelo país). Eu pegava os recursos junto ao partido, em nome de Lula, para pagar hotel, gasolina, um conjunto de despesas. Fazia vales em nome dele, que era dirigente. Por falta de documentos, de entendimento, não foi feita a prestação adequada dessas contas. Achei que tinha a responsabilidade de pagar, de assumir isso. Era o procurador dele e não cuidei bem dessa prestação de contas. Por isso, acabei assumindo a dívida.  O  Lula fez muita coisa por mim.  Um de meus filhos teve uma apendicite supurada  e Lula ajudou a achar o doutor Raul Cutait (conceituado cirurgião gastroenterologista), que ele conhecia, para salvá-lo. Existe uma solidariedade entre nós, metalúrgicos,  que talvez  seja estranha para a classe média.

PODER : Mas o senhor tinha esses cerca de R$ 30 mil?

PO: Quando trabalhava como operário, eu ganhava R$ 3 mil por mês. Depois que fui para o Sebrae, meu  salário melhorou um pouco. E eu sempre soube que esse salário que venho ganhando nos últimos anos, de R$ 25 mil, 30 mil, não é algo que vou ganhar para o resto da vida. Como digo lá em casa: tem de fazer um pé-de-meia. Então, eu tinha condições de pagar essa dívida. Não era o fim do mundo.

PODER : Por que o senhor foi parar na CPI dos Bingos?

PO: Aquele momento que o país atravessava, vamos chamar assim, virou quase briga de rua. Para mim, ir para a CPI foi a melhor coisa. Eu queria entrar nessa briga também (bate uma mão contra outra). Era só alegria.

PODER: Acha que financiamento público de campanhas eleitorais acaba com o caixa dois e a submissão dos candidatos aos interesses dos financiadores?

PO: Acho que o financiamento público de campanha coloca um limite. Tira todas as desculpas quando alguém quer fazer caixa dois na campanha, que alguém queira gastar mais. Acabar nunca vai acabar, mas melhora a situação. Porque hoje existe uma coisa ridícula: cada um estabelece o quanto vai gastar de acordo com o que tem na cabeça, um orçamento fictício, e declara que vai arrumar esse dinheiro. Aí, sai fazendo dívidas. Se gasta e não arrumou o dinheiro, o que faz? Desaparece com essa dívida, ou fica devendo, vira tudo caixa dois.

PODER: Marcos Valério declarou à Procuradoria-Geral da República que o senhor o ameaçou de morte, caso ele revelasse o que sabia sobre o mensalão. O que tem a dizer sobre isso?

PO: Que é uma grande mentira. Como é que vou ameaçar de morte um cara que teoricamente fez vários favores para o PT? Acho esquisito ele ter dito isso, aliás. Duvido que ele tenha feito, que tenha falado isso. Mas já que estão dizendo que ele falou…

PODER:  O senhor não vai processá-lo?

PO: Não. Processar as pessoas custa caro…

PODER:  Qual é o balanço do julgamento do mensalão?

PO: O julgamento não foi justo, foi politizado. Mas cometemos erros de procedimentos e contábeis, de busca de financiamento. Demorou muito para ser julgado. Se fosse mais rápido, talvez tivesse havido uma condenação de crime eleitoral. Então, para dar satisfação ao público, resolveram forçar a barra para condenar sem as devidas provas.

PODER:  O senhor é amigo de  Rosemary Noronha?

PO: Amigo, eu não sou. Ela não frequenta a minha casa nem eu a dela. Conheço a Rose Noronha, que foi secretária do escritório da Presidência da República em São Paulo, secretária do Zé Dirceu, trabalhou no PT. É uma companheira que conheço e que nunca me fez mal. Não é porque ela está sendo acusada, que está se defendendo, que vou deixar de ter uma relação de companheiro com ela.

PODER:  Mas Rosemary fazia tráfico de influência em troca de favores pessoais quando era chefe do escritório da Presidência da República em São Paulo.

PO: Mas quanta gente não recebe favor pessoal? Ela pode até ter cometido erros, mas o que estão fazendo com ela é um massacre.

PODER: Como fica o instituto se Lula voltar a concorrer à presidência ou a um cargo político?

PO: Essa hipótese não existe. Trabalhamos com a hipótese que a nossa candidata é a presidente Dilma Rousseff e vamos tocar nossa vida aqui com o ex-presidente Lula.

PODER: No passado, o senhor também foi uma pessoa importante para viabilizar o partido, quando o PT era pequeno e quando ganhou as primeiras prefeituras. Como foi aquela época em que o partido começava a conhecer o poder?

PO: Nunca fui tesoureiro do PT. Só fui tesoureiro da campanha de Lula em 1989. Esse episódio a que você se refere é o caso Cpem (Paulo de Tarso Venceslau, secretário de Finanças de São José dos Campos na década de 1990, o acusou de ser um tesoureiro informal buscando recursos paralelos em administrações petistas e acabou expulso do partido). Essa é uma história mentirosa. Tive a oportunidade de debater isso na CPI dos Bingos com uma acareação. Eu o chamei (Paulo de Tarso Venceslau) de mentiroso. Há muita coisa que falam sobre mim que são calúnias.   n

FONTE DE INSPIRAÇÃO

Filho de mãe mineira e pai nissei (seu avô era japonês), Paulo Okamotto é o segundo de quatro filhos. Tinha 6 anos quando o pai, que era agricultor, morreu por causa de um trator que virou em cima dele. Na época, sua  mãe foi trabalhar como ajudante de cozinha na Volkswagen, em São Bernardo do Campo. Foi ali que conseguiu uma oportunidade ao se tornar aprendiz do Senai na mesma empresa. Mesmo com uma trajetória em que sempre foi alvo de suspeitas e acusações, Okamotto é bem-humorado. Tem na ponta da língua a explicação para os dois “t” que traz no sobrenome: “Meu pai queria diferenciar porque, no Japão, Okamoto é igual a Silva. Então, ele tentou transformar nosso sobrenome em italiano, um japonês da Mooca”, comenta, rindo.

Recentemente, ele deu um up no currículo em que constava apenas a formação de técnico industrial. Formou-se administrador de empresas na Universidade Católica de Brasília, o que relatou com os olhos mareados. Gosta de ler biografias para conhecer os personagens da história brasileira. Atualmente, está debruçado sobre a obra que conta a vida de Domitila de Castro Canto e Melo, a célebre amante do rei dom Pedro 1º. Os próximos livros da lista são os da  trilogia sobre Getúlio Vargas, de Lira Neto.

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