Em seis meses, o publicitário Ricardo Al Makul triplicou o tamanho de seu negócio ao criar um programa que leva empresários para viagens de imersão em centros tecnológicos como o da Nasa e do Google, nos Estados Unidos
Por Valéria França para Revista Poder de Junho
Durante uma viagem de negócios, o publicitário paulistano Ricardo Al Makul, de 42 anos, teve um insight: “o mundo está mudando muito rápido – compartilhamento de carros, bancos digitais, blockchain [validação de transações via internet], neurociência – e as pessoas têm dificuldade em lidar com a velocidade dessas transformações”. Resolveu pedir demissão do grupo ABC [conglomerado de empresas de comunicação que hoje pertence ao grupo Omnicom, dos Estados Unidos] e montou o KES Knowledge Exchange Sessions [Sessões de Troca de Conhecimento, em tradução livre], plataforma de conteúdo que promove encontros entre especialistas em comportamento e criatividade e empresários e altos executivos.
Um ano depois, no fim de 2016, Makul começou a ficar inquieto de novo, apesar do sucesso meteórico do KES, que já contava com dez patrocinadores e uma lista de espera de gente interessada em participar dos eventos. Dessa vez, a causa da ansiedade era a maneira como os associados do KES encaravam a tecnologia. “Era como se estivéssemos falando de um futuro muito distante – quando, na verdade, se trata de uma transformação que começou há um bom tempo”, diz. “As start-ups estão fervendo e quebrando empresas que viraram dinossauros de um dia para o outro. A mudança, portanto, é mais do que urgente.” Para comprovar sua teoria, no início deste ano, Makul resolveu dar uma cartada e levou um grupo de 36 empresários e altos executivos para uma viagem ao Vale do Silício, em São Francisco, na Califórnia. A ideia? Apresentar o futuro para eles in loco. Graças aos bons contatos dos seus tempos de publicitário, ele conseguiu montar um roteiro de visitas a empresas como Google, Twitter e Microsoft, além do parque de pesquisa da Nasa na Singularity University [centro de inovação apoiado pelo Google e outras empresas] e do Neuroscape Research Lab, especializado em neurociência e em tecnologia e ligado à Universidade da Califórnia, em São Francisco. No programa, almoços, discussões e palestras com diretores e cientistas dos locais visitados. Foi o primeiro pacote de viagem da KES Trek, novo braço da empresa que fez o KES triplicar de tamanho em apenas seis meses. “Sou a prova de que não existe mais essa história de five-year plans”, diz Makul, apontando para os post-its coloridos na parede de seu escritório que fica em Moema, zona sul de São Paulo. “Tudo ficou tão rápido que meu business plan é assim. Informalidade é com ele mesmo, aliás. Está sempre de jeans e camiseta, anda mais a pé do que de carro, a academia onde faz spinning, a escola dos filhos – Frederico, de 10 anos, e Guilherme, de 8 – e o escritório ficam em um raio de três quarteirões de sua casa. E quando precisa ir mais longe, prefere chamar um Uber a tirar o carro da garagem.
TURMA DE PESO
Um pouco por esse seu jeito prático de lidar com as coisas, o KES já estava se encaminhado para virar um clube de amigos empresários – mesmo antes de Makul criar a KES Trek. Com um network invejável, ele tem em sua lista nomes como Ronaldo Pereira, CEO da Óticas Carol, Artur Grynbaum, presidente do Grupo Boticário, Alexandre Costa, fundador da Cacau Show, e Paula Bellizia, presidente da Microsoft Brasil, entre outros. Depois da viagem para o Vale do Silício, todos se tornaram muito próximos. E para a sorte de Makul, os melhores garotos-propaganda de sua KES Trek. “Viajo muito a negócios, mas nunca vi um grupo tão seleto. E não estou falando do cartão, da pessoa jurídica, mas da qualidade das pessoas mesmo. A interação e a troca foram imensas. Mudei meus valores de diversidade e de urgência de transformação”, diz Pereira, da Óticas Carol. Grynbaum, do Grupo Boticário, também é só elogios: “Aprendemos que podemos desafiar o formato existente e criar um novo sem pensar em limitações. Que é preciso desafiar o modelo tradicional de pensar em tudo antes de executar e que, em vários momentos, é melhor não pensar muito e ir fazendo e aprendendo….”.
Makul conta que percebeu que havia acertado na escolha das pessoas logo no primeiro dia, quando estavam a caminho da Singularity University. O ônibus que levava o grupo ficou preso em um congestionamento de quase duas horas. “Quando chegamos, o Alexandre (Costa) virou para mim e falou que a viagem já havia valido a pena, pois durante o percurso conversou com a Paula [Bellizia, presidente da Microsoft no Brasil] coisas que nunca seriam discutidas durante uma reunião.” A KES Trek dura uma semana e o esquema é de imersão com atividades o dia inteiro, mas o programa é pensado para que os integrantes consigam não só assimilar e debater, mas também se divertir com os conteúdos apresentados. Em vez de hospedagem em um cinco-estrelas, por exemplo, a organização preferiu colocar o grupo no Hotel G, em São Francisco, localizado em um charmoso edifício do século 19, que resistiu a um terremoto. Ou seja, a experiência de sair da zona de conforto e de quebrar paradigmas já começou ali e continuou durante toda a viagem, mas sempre de um jeito muito natural – em alguns casos, literalmente. “Terminamos um de nossos debates à beira de um rio, na hora do pôr do sol. Alguém comentou que, para completar, só faltava um violão. Arrumei um e ficamos tocando até duas da manhã. Foi inesquecível”, conta Makul.
LAVAGEM CEREBRAL
“Resolvi largar a publicidade em 2015.” Ou seja, no meio de uma das maiores crise econômicas da história do país. Haja coragem! “Ah, não se trata apenas de coragem, mas de autoestima, eu acho. Tudo culpa da minha mãe [Vera, filha de italianos]. Quando eu era criança, todas as noites, na hora de dormir, ela falava no meu ouvido que eu era o mais talentoso e o mais bonito de todos.” A lavagem cerebral deu certo.
Em 2015, quando o KES ainda era um PowerPoint, o Google se interessou e entrou como patrocinador, o que acabou atraindo outras grandes empresas como Allianz Seguros e Adobe para a empreitada. Makul tratou logo de encontrar dois investidores – que preferem o anonimato – e duas sócias que tivessem habilidades complementares às suas para colocar a mão na massa. Carla Mayumi, de 47 anos, e a colombiana Maria Juliana Giraldo, de 35, que já eram parceiras na The Mob, plataforma especializada em palestras, tornaram-se curadoras dos eventos do KES. “Ninguém cria uma empresa sozinho. Cada um tem um universo diferente. Essa mescla é que surpreende”, diz Juliana. A próxima Trek já tem data e local definidos: vai ser em outubro, em Israel. O que Makul vai aprontar dessa vez? Surpresa.
OVELHA NEGRA
Um dos grandes talentos de Makul, com certeza, é gostar e saber lidar com pessoas, característica que colocou em prática logo cedo, na infância. Um dos herdeiros da Casa Fortaleza [loja de tapetes, carpetes, cortinas e afins], ele costumava passar as férias em São Paulo trabalhando com o pai, Jorge, descendente de sírios, nas lojas da rua 25 de Março, no centro, e da rua João Cachoeira, no Itaim Bibi. Contrariando as expectativas da família, não fez carreira na empresa. “Oito primos já trabalhavam lá. Sabia que não sobraria nada para mim quando chegasse a minha vez”, brinca. Makul fez publicidade e passou por grandes agências: começou na DM9DDB, foi para a Lew’Lara e, depois, montou a própria agência, a Centoeseis, mais tarde incorporada pelo grupo ABC.
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