O e-commerce de moda luxo começa a pegar por aqui e a briga por esse consumidor é veloz.
por Fábio Dutra e Raul Duarte para a revista PODER de Maio
Em 2008, no auge da crise econômica dos Estados Unidos após a falência do banco Lehman Brothers, pipocava na imprensa local um sem-número de notinhas e de reportagens sobre os novos hábitos dos antes espalhafatosos milionários locais. As butiques passaram a oferecer embalagens discretas, a levar os produtos até a casa dos clientes e as vendas on-line dispararam. Não era, enfim, bem vista a ostentação de qualquer modo em um momento social e econômico tão delicado. Não sabemos se a moda vai pegar por aqui, mas há muito investidor apostando alto no crescimento dos e-commerces.
Na Europa o mercado de luxo antes dominado pelas tradicionais lojas de departamentos já migrou em boa parte para a internet. Para além da discrição, o conforto da tela do computador, ou mesmo do celular, atrai o consumidor que tem diante de si uma variedade muito maior de produtos e a possibilidade de pesquisar e de saber mais sobre o universo daquelas criações. Não por acaso, o londrino Net-a-Porter, focado em conteúdo, tornou-se uma febre desde sua criação, em 2000, na sequência do estouro da bolha da internet. Além de se inteirar sobre moda e de ver as a roupas e as joias que deseja envergadas por belas modelos, há coleções inteiras criadas exclusivamente para o site por alguns dos mais talentosos estilistas do mundo. Em 2013, a loja virtual, fundada pela jornalista de moda Natalie Massenet, lançou a revista The Edit, deixando clara a aposta em conteúdo qualificado – e marcando território no mercado de publicações impressas, que responde por quase 40% da decisão de compra do consumidor de alta renda e concretiza os valores de sofisticação que o gigante digital busca colar em si mesmo.
Em 2015, a italiana Yoox comprou o controle por US$ 780 milhões e o grupo Yoox Net-a-Porter é hoje o maior varejista on-line do mercado de luxo do mundo.
NO INÍCIO
Perto do que acontece na Europa, e mesmo nos Estados Unidos, o mercado de e-commerce brasileiro ainda é incipiente e só agora começa a dar mostras de decolar. Em 2015, por exemplo, enquanto os EUA movimentaram US$ 300 bilhões em vendas on-line, no Brasil esse número não passou de R$ 43 bilhões. A maior parte das empresas ainda está na fase de investimento e não atingiu o chamado break-even point, momento em que o investidor recupera o que pôs na mesa e passa realmente a ganhar dinheiro. Mas o setor que mais vendeu pela internet foi o de moda e acessórios, 14% do total, o que o torna bastante promissor, ainda que o hábito de consumo on-line não tenha amadurecido completamente por aqui. As taxas de devolução, por exemplo, que na Europa e nos Estados Unidos chegam a 20%, por aqui nunca passaram de 12% e mostram que o costume de ir a lojas físicas ainda está bem incrustrado na mentalidade do brasileiro.
As principais concorrentes nacionais no segmento high-fashion são Shop2gether e OQVestir, tendo a seu lado a portuguesa Farfetch, que aposta alto no mercado nacional. Cada uma tem suas particularidades. OQVestir segue o exemplo do Net-a-Porter e acredita em geração de conteúdo. Shop2gether também, porém é apenas marketplace, ou seja, uma loja virtual para as marcas, mas não a loja em si, o que enquadra o site no conceito B2B (business to business ou de negócio para negócio, em tradução livre) e não tem o consumidor final como fonte de receita. É a mesma ideia do Farfetch, cujo slogan “400 boutiques, 1 address” (algo como 400 butiques, 1 endereço) diz tudo. O grande diferencial dos portugueses, que estão há mais tempo no mercado e têm operações em vários países, é o número de grifes tradicionais que reúnem em seu portfólio.
SHOP2GETHER
Fundado em 2012 por Ana Isabel de Carvalho Pinto e Eduardo Kyrillos
VISITAS: 700 mil/mês
INVESTIMENTO INICIAL: R$ 20 milhões (real capital)
FATURAMENTO EM 2015: R$ 70 milhões
TAXA DE CRESCIMENTO: expectativa de 50% em 2016
PRODUTO MAIS VENDIDO: Sapatos femininos
O Shop2gether foca no chamado marketplace: cada marca tem seu espaço e sua identidade, o que parece gerar independência entre as grifes e melhor engajamento com o consumidor.Já são 92 marcas disponíveis. Há uma gestora, a S2G, que gera os espaços customizados para os lojistas de moda e de decoração integradas a um ambiente de compras com vitrines, concierge, serviços exclusivos e atendimento especial. “Queremos o portfólio mais completo de marcas exclusivas e conteúdo de especialistas para oferecer o melhor serviço no segmento premium e garantir a liderança neste mercado”, sustenta a fundadora Ana Isabel de Carvalho Pinto.
OQVESTIR
Fundado em 2009 por Rosana Sperandéo Saigh, Mariana Medeiros e Isabel Humberg
VISITAS: 5,5 milhões/mês
INVESTIMENTO INICIAL: não divulga
FATURAMENTO EM 2015: R$ 78 milhões
TAXA DE CRESCIMENTO: 70% em 2013, 39% em 2014 e 37% em 2015
PRODUTO MAIS VENDIDO: Vestidos
Não é raro ser atingido nas redes sociais pelo conteúdo gerado pelo OQVestir, o maior e-commerce de luxo do país. Desde coleções exclusivas a blogueiras compartilhando fotos com as roupas da loja virtual, é grande o volume de conteúdo que emula os produtos à venda – seguindo o exemplo de sucesso do Net-a-Porter. O site recebeu investimento do fundo Tiger Global, que turbinou as operações e o levou a um crescimento alegado de 1.000% em dois anos, apesar de não revelarem números.“Na crise, investimos em programas de ganhos de eficiência e em tecnologia, como o aplicativo Mobile, que já ocupa 40% de nossas vendas. Na crise, é preciso estar dois passos à frente”, garante o CEO Lars Leber.
FARFETCH
Fundado em 2008 por José Neves, chegou ao Brasil em 2010
VISITAS: 1,3 milhão/mês
INVESTIMENTO INICIAL: US$ 4,5 milhões (para Brasil e América do Norte)
FATURAMENTO: crescimento de 50% em relação a 2014
O gigante global português, fundado por José Neves é avaliado em quase 900 milhões de euros, o que o leva a ser a primeira startup portuguesa a ultrapassar o bilhão de dólares em preço de mercado. “A intenção era criar uma maneira revolucionária de comprar moda ”, informa a equipe Farfetch Brasil. Os maiores mercados são Europa e Estados Unidos, claro, os maiores consumidores de luxo do planeta. Não à toa, a sede fica em Londres. A operação brasileira foca nas grifes internacionais, já que eles estão em mais de 190 países.“Queremos oferecer a chance aos amantes da moda brasileiros de comprar pelo mundo todo – desde Paris, Nova York e Milão até Bucareste, Kuwait e Tóquio”.
FANCY
O nome faz referência a uma maneira quase pejorativa de se chamar alguém de rico ou de chics em inglês, meio como grã-fino. Mas a brincadeira é só no nome. Baseado na ideia do Instagram, esse aplicativo já tem dezenas de milhões de usuários registrados e vende tudo que o se possa imaginar. Navegar por ele via celular, o grande alvo de seus idealizadores, é como olhar um perfil de imagens conceituais no Instagram,em que sempre há algo à venda – e que pode ser adquirido com poucos cliques. Uma ideia interessante num mundo que caminha irreversivelmente para a experiência mobile – e uma boa maneira de limpar a carteira dos compulsivos.
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