HOMENAGEM
A Flip teve início nessa quarta, 1º, com conferência do crítico literário David Arrigucci Jr. e show de Adriana Calcanhotto, e vai até o domingo, 5. Neste período o Canal Livraria da Vila estará em Paraty acompanhando as notícias mais interessantes sobre as mesas literárias, os lançamentos de livros e outros eventos do universo da literatura para contar para você.
* Para começar fizemos uma seleção de livros de Manuel Bandeira (1886-1968) – o homenageado da Flip neste ano – que foram reeditados há pouco, além de coletâneas inéditas e alguns de seus versos que se tornaram marcos da poesia brasileira. É indiscutível que a obra poética de Bandeira tem lugar de destaque na história da literatura brasileira, e um dos motivos disso é que ele, como ninguém, soube olhar com delicadeza para coisas prosaicas da vida, que geralmente passam despercebidas pela maioria de nós, e transformá-las em poesia. Como em “Porquinho-da-índia”, do livro “Libertinagem”:
Quando eu tinha seis anos/ Ganhei um porquinho-da-índia./ Que dor de coração eu tinha/Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!/ Levava ele pra sala/Pra os lugares mais bonitos, mais limpinhos,/ (…) Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas…/ – O meu porquinho-da-índia foi a minha primeira namorada.
Manuel Bandeira não foi somente um grande poeta, consagrado como um dos autores mais importantes do modernismo brasileiro, atuou também como crítico literário e de artes plásticas, professor, cronista, compositor, autor de obras infantis e tradutor de clássicos da literatura, como Shakespeare, Schiller e Proust. Vamos à obra de Bandeira! A editoras Nova Fronteira e Nova Aguilar lançam nessa quinta, 2, no Armazém do Cais de Paraty, as novas edições de “Poesia Completa e Prosa” e “Estrela da Vida Inteira” (R$29,90). Organizada por André Seffrin, “Poesia Completa e Prosa” tem mais de 1.700 páginas e se constitui numa edição revisada e ampliada de um trabalho que estava há mais de três décadas ausente das livrarias. (Sug. Colocar foto da capa de Poesia e Prosa) Já “Estrela da Vida Inteira” compila as obras “A Cinza das Horas”, “Carnaval”, O “Ritmo Dissoluto”, “Libertinagem”, “Estrela da Manhã”, “Lira dos Cinquent’anos”, “Belo Belo”, “Opus 10”, “Estrela da Tarde”, “Mafuá do Malungo” e “Poemas Traduzidos”, além de incluir um CD de áudio com leituras de poemas feitas pelo próprio Manuel Bandeira.
* E lembramos aqui versos do poema “Belo Belo”, do livro homônimo: Belo belo minha bela/ Tenho tudo que não quero/Não tenho nada que quero/Não quero óculos nem tosse/Nem obrigação de voto/Quero quero/ (…) Quero quero tanta coisa/Belo belo/Mas basta de lero-lero/Vida noves fora zero.
* Em “Libertinagem e Estrela da Manhã” (R$ 9,90), também da Nova Fronteira, estão reunidos dois livros de Manuel Bandeira que configuram fases diferentes de sua produção poética. O primeiro, de 1930, é composto por 38 poemas, sendo dois em francês, e, de acordo com especialistas em sua obra, é nele que o autor configura-se como “verdadeiramente modernista, quer nos temas, quer na forma”. O segundo, de 1936, é composto de 28 poemas, sendo um em francês, e marca o início da última fase do poeta, chamada por alguns críticos de pós-modernista – é a fase mais madura de sua obra: “O estilo simples, lírico, emotivo e humilde permanece, sendo porém mais fortes o erotismo, os versos surrealistas, a melancolia e a desilusão de viver”. Em “Estrela da Manhã” é inesquecível a “Balada das Três Mulheres do Sabonete Araxá”: As três mulheres do sabonete Araxá me invocam, me bouleversam, me hipnotizam./ (…) Que outros, não eu, a pedra cortem/ Para brutais vos adorarem,/ Ó brancaranas azedas,/Mulatas cor da lua vem saindo cor de prata/ Oh celestes africanas:/Que eu vivo, padeço e morro só pelas três mulheres do Sabonete Araxá!(…)
* A editora Cosac Naify acaba de relançar “Apresentação da Poesia Brasileira” (R$ 69,00), escrito por Manuel Bandeira em 1946 para apresentar nossos melhores poetas ao leitor estrangeiro. Na verdade, esse livro é constituído de duas partes. A primeira traz um panorama crítico dos poetas, escolas e movimentos que marcaram a poesia no país, de José de Anchieta ao Concretismo. Já a segunda se organiza como uma antologia, gênero em que, segundo Antonio Candido, Bandeira se tornou perito: 125 poemas de 55 poetas, dos grandes clássicos como a “Canção do Exílio” e o “Navio Negreiro” aos achados bandeirianos como os bissextos Pedro Nava e Pedro Dantas, chegando até Augusto de Campos e Ferreira Gullar, então com vinte e poucos anos de idade.
* Ainda são da Cosac Naify os volumes 1 e 2 de “Crônicas Inéditas” (R$65,00 e R$69,00). No volume 1, pode-se ter um panorama da vida cultural brasileira no século XX. Em textos inéditos, como diz o título, Bandeira discorre sobre pintura, música erudita, arquitetura, teatro, cinema, poesia e o mundo das artes num tom de quem conhece bem os assuntos, mas sem ser formal. Bandeira também recupera a vida carioca nos anos 1920 em seus episódios curiosos como o primeiro arranha-céu do Rio, o sucesso do cinema falado e os personagens pitorescos da boemia da cidade. O “Crônicas Inéditas” vol. 2, reúne todos os textos em prosa que Manuel Bandeira publicou na imprensa entre 1930 e 1944 e não foram incluídos por ele em “Crônicas da Província do Brasil” (1937), um clássico fundador da crônica moderna no país.
* E, para terminar, citemos “Vou-me Embora pra Pasárgada”, afinal, não se pode falar em Manuel Bandeira sem falar de Pasárgada: Vou-me embora pra Pasárgada/ Lá sou amigo do rei/ Lá tenho a mulher que eu quero/ Na cama que escolherei/Vou-me embora pra Pasárgada/Aqui eu não sou feliz/Lá a existência é uma aventura/ (…) Em Pasárgada tem tudo/É outra civilização/Tem um processo seguro/De impedir a concepção/Tem telefone automático/Tem alcalóide à vontade/Tem prostitutas bonitas/Para a gente namorar/ (…) Vou-me embora pra Pasárgada.
por Anna Lee
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