Nos últimos anos, o ator brasileiro Marcos Oliveira vira e mexe ressurge na pauta nacional bem de repente e sem aviso prévio, logo dominando as manchetes online – não por suas conquistas, mas por suas adversidades. Oliveira, conhecido por seu papel coadjuvante como Beiçola em “A Grande Família”, é uma figura querida na televisão brasileira.
O seriado, transmitido pela maior emissora do Brasil, a Globo, o tornou um nome familiar. No entanto, desde que perdeu seu emprego na gigante de mídia, em 2017, e foi vítima de um golpe financeiro quase que simultaneamente, ele tem enfrentado momentos difíceis.
Dias atrás, novas chamadas virtuais destacavam sua suposta incapacidade de poder bancar sequer uma dieta ideal. E enquanto muitos internautas veem suas constantes aparições em sites de notícias como um triste reflexo de sua queda, que aparentemente os intriga muito, há outro ângulo que merece ser conjecturado: o potencial inexplorado da marca Marcos Oliveira e o poder do branding pessoal na era digital de hoje.
Querendo ou não, o eterno Beiçola da telinha nem integrava o elenco principal da atração global que saiu do ar – frise-se – em 2014, mas desde então é praticamente o único membro do time estrelado por talentos como Marista Severo e Marco Nanini cujo brand appeal continua cativando as massas. E justo as virtuais, mais cobiçadas pela publicidade.
Não são apenas as conquistas passadas de Oliveira que o tornam notável, e tampouco seus perrengues de bastidores nesse momento. Principalmente, é a sua trajetória e as razões que a tornaram tão atrativa para o público que explicam sua ampla aceitação. Ele pode não perceber, mas há um valor intrínseco em sua jornada, que ressoa com muitos nessa era interconectada e em rápida transformação.
Com profissões tradicionais enfrentando ameaças existenciais, de avanços tecnológicos a mudanças na indústria, se adaptar rapidamente é cada vez mais reconhecido como um ativo essencial.
Essa é uma época em que a marca pessoal – ou brand persona – é mais influente do que nunca, e tecnicamente falando, adaptabilidade é a capacidade de se ajustar a ambientes e oportunidades de trabalho em mudança frenética, e de gerir o próprio desenvolvimento profissional e aprendizado ao mesmo tempo.
Uma missão de equilibrismo que envolve quatro dimensões gerais: preocupação, controle, curiosidade e confiança. A Escala de Adaptabilidade de Carreira (ou CAAS, sigla do termo original em inglês Career Adapt-Ability Scale), é o método preferido entre os pesquisadores para medir a adaptabilidade de profissionais em geral, e resumidamente consiste em três dimensões-chave: atitudes planejadas, exploração do self e do ambiente, e decisões adaptativas.
Isso tende a ocorrer mais frequentemente durante fases de adversidade, como a de Oliveira, que recentemente entrou no Retiro dos Artistas, possivelmente convencido de que sua vida profissional acabou. No entanto, um relatório da Gartner sobre as tendências de trabalho para 2023, publicado em dezembro passado, sugere um desfecho diferente para ele.
O isolamento social causado pela pandemia afetou profundamente os jovens: 46% dos trabalhadores da Geração Z entrevistados pela consultoria e empresa de pesquisa americana disseram que a crise sanitária dificultou a busca por seus objetivos educacionais ou profissionais, e 51% afirmaram que sua educação – talvez excessivamente técnica e pouco humana, além de provavelmente desatualizada – não os preparou para entrar no mercado de trabalho.
A Geração Z perdeu a oportunidade de desenvolver habilidades interpessoais, como negociar, fazer networking, falar com confiança em público e ‘se virar nos 30’ quando o assunto é a resistência social para lidar com coisas que livros e universidades não ensinam. Lembra uma conta bancária zerada? Pois é.
Essa falta de experiência e preparação pode impactar negativamente o setor empresarial, especialmente em relação à demanda por talentos baratos em um mercado de trabalho competitivo. Esgotamento, exaustão e insegurança profissional – todos intensificados durante os meses bicudos do novo coronavírus – afetam negativamente o desempenho de qualquer um.
E as empresas, concluiu a Gartner em seu levantamento, precisarão redefinir o profissionalismo para toda a sua força de trabalho a fim de enfrentar esse desafio, pensando bem fora da caixa. Como, por exemplo, valorizando lições de vida daqueles que atingiram o fundo do poço, mas usaram isso como uma base sólida para se recriar e reconstruir.
Vale lembrar a ascensão internacional de Danny Trejo. De jovem problemático a ator prolífico e empreendedor, Trejo, de 79 anos, transformou sua história pessoal em uma marca poderosa. Ainda que inicialmente tenha sido uma escolha automática para papéis de “durão”, ele alavancou sua imagem única e trajetória em diversas oportunidades, desde papéis principais até o lançamento de uma cadeia popular de restaurantes. Sua trajetória é um testemunho da importância de aprimorar a tal da brand persona, sobretudo quando mais parecer que isso nem vale muito.
O último grande feito de Trejo? Um dos atores mais admirados entre os americanos das gerações Y (millennials) e Z, ele lançou, em abril, um livro de receitas inspirado na cultura das cantinas mexicanas, que faz particular sucesso entre os zoomers. Foi o segundo livro dele, intitulado “Trejo’s Cantina” (“A Cantina do Trejo”, em tradução livre). Ambos se tornaram bestsellers instantâneos listados pelo The New York Times.
Como ator, Oliveira, aos 67 anos, agora compete com a Inteligência Artificial (IA). Martin Scorsese, por sinal, causou alvoroço na semana passada ao compartilhar seus pensamentos sobre filmes de quadrinhos, dizendo que cabe aos cineastas criativos “salvar” a sétima arte dos vilões ‘disfarçados de super-heróis’.
Em uma entrevista para a revista GQ, o renomado diretor falou sobre o “perigo” que esse gênero crescente representa para a cultura, ressaltando que “haverá gerações que pensarão que filmes são apenas ‘aqueles’ – e que é isso que são filmes, conteúdo fabricado”.
O hollywoodiano parece ter esquecido que seus longas, todos devidamente digitalizados, estão com a eternidade garantida, e para sempre continuarão monetizando seu legado e garantindo verba suficiente para banque os tipos projetos que considera estarem em risco. Mas o ponto aqui é outro.
Uma vez citadela da criatividade humana, Hollywood está brigando com um vilão intangível. A IA não apenas revoluciona processos de backend cinematográficos, mas cada vez mais também se ameaça substituir atores humanos, especialmente com papéis como os de personagens CGI. Esse panorama amplifica a importância de histórias humanas únicas e o valor intrínseco que contêm. Não se trata apenas de atuar para a plateia, mas de se conectar, identificar e empatizar com ela.
A brand persona atual de Oliveira, embora não intencional, ressoa com muitos desses valores. Sua história toca o coração em um timing em que muitos enfrentam incertezas carreiristas. Há um vasto público, especialmente entre a Geração Z e os millennials, que se sente atraído por histórias de perseverança, adaptabilidade e resiliência. Oliveira, em sua forma atual, quase vacinado contra a rejeição, encapsula todas essas características. Então, por que o Beiçola não capitaliza isso?
A digitalização em que vivemos democratizou a criação e distribuição de conteúdo. Plataformas como YouTube, TikTok e podcasts oferecem um palco para aqueles com uma voz, uma história e autenticidade. Oliveira não precisa da mídia tradicional para monetizar sua marca: as ferramentas já estão ao seu alcance, e são as oportunidades tangíveis que o esperam, quem sabe, desde 2017.
Arco-íris digital: Os revivals em potencial para Marcos Oliveira
O vasto universo de oportunidades digitais é dinâmico e existe em constante evolução. Para Oliveira, sua presença online já destacada pelo tapete vermelho da empatia pode ser um trampolim para novas aventuras. E isso é algo que vale uma análise, ilustrada por 5 exemplos de potenciais caminhos que podem ser tanto financeiramente recompensadores quanto gratificantes:
#1 Influenciador no TikTok
Rede social mais importante de todas, o TikTok redefiniu o consumo de conteúdo. Com sua interface amigável e enorme base de usuários, Oliveira pode criar clips curtos e envolventes. Ele poderia oferecer vislumbres dos bastidores de sua vida, reencenar cenas icônicas ou compartilhar anedotas de seus dias de ator. Considerando sua história única e merecedora de identificação, a autenticidade de Oliveira pode atrair uma vasta audiência. De acordo com as métricas do Influencer Marketing Hub, os principais influenciadores do TikTok podem ganhar até US$ 50 mil (R$ 251,5 mil) por post patrocinado.
#2 Podcaster
Os podcasts são mais do que apenas um formato de áudio. Em suma, são uma plataforma para contar histórias. Oliveira poderia ancorar uma série de podcasts, destacando seus altos e baixos, entrevistando colegas ou discutindo as mudanças na indústria do entretenimento. Um relatório da Acast divulgado em maio, aliás, que podcasters bem-sucedidos podem monetizar através de patrocínios, publicidade e contribuições dos próprios ouvintes.
#3 Palestrante e coach online
Com plataformas como MasterClass e Skillshare ganhando tração, Oliveira pode oferecer aulas sobre atuação, resiliência e superação de desafios na carreira. Suas experiências reais podem ecoar em muitos, proporcionando inspiração e orientação. De acordo com dados da Teachable, os principais criadores podem alcançar rendimentos anuais de seis dígitos (em dólares).
#4 Embaixador de marca
A história de perseverança de Oliveira é poderosa e única. Marcas, especialmente aquelas que focam em resiliência, transformação ou autoaperfeiçoamento, poderiam recrutá-lo como embaixador. Suas colaborações variariam desde conteúdo patrocinado até aparições em eventos. Uma análise recente da Statista destaca que os orçamentos de marketing de influência estão aumentando, com algumas marcas alocando milhões anualmente nisso.
#5 Criador de conteúdo no YouTube
O YouTube continua sendo um serviço dominante para criadores de conteúdo. Oliveira poderia criar um canal, oferecendo conteúdo diversificado, desde oficinas de atuação até vlogs pessoais. A monetização através de receitas publicitárias, mercadorias e patrocínios pode ser lucrativa, como apontam dados do Social Blade, que sugerem que os principais YouTubers podem ganhar entre US$ 3 (R$ 15,09) e US$ 5 (R$ 25,15) por cada 1000 visualizações de vídeo.
A situação atual de Oliveira, embora desafiadora, pode ser uma bênção disfarçada. Seu drama pessoal, intensamente explorado e por vezes ridicularizado pela mídia sensacionalista, atraiu uma enorme atenção, particularmente para a Geração Z, que talvez veja um eco de suas próprias lutas e aspirações na saga do ator.
A pergunta que paira no ar é: por que agentes e representantes ainda não perceberam o potencial de Oliveira, dado que sua própria profissão também corre o risco de extinção em um mundo digitalmente dominado?
Isso destaca a necessidade urgente de Oliveira assumir o controle de sua narrativa e, ao fazê-lo, também lucrar com a monetização de sua história, em vez de ser explorado por possíveis sanguessugas sensacionalistas e vampiros sedentos por cliques.
Ele não apenas reescreveria sua história se o fizesse, mas quem sabe até mesmo se estabeleceria como uma força a ser reconhecida na era digital.
Comumente atribuída ao icônico Nenê Beiçola, uma frase do personagem serviria bem de título pra esse case: “Nada se cria, tudo se copia. E o erro se propaga!”.
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