O apresentador e jornalista Manoel Soares esteve no Rio de Janeiro para participar do G20 Favelas, um evento paralelo ao G20 que reuniu líderes, empreendedores, influenciadores e moradores de favelas, com o intuito de debater temas essenciais ao desenvolvimento social, econômico e cultural dessas comunidades. Organizado pela Central Única das Favelas (CUFA) em parceria com a Frente Nacional Antirracista (FNA) e a Frente Parlamentar em Defesa das Favelas, o evento também contou com o apoio da UNESCO. A seguir, Manoel compartilha suas reflexões sobre a importância de dar visibilidade às questões que afetam as favelas e o impacto do G20 Favelas nas discussões sobre a melhoria da qualidade de vida nessas áreas.
G20 vira G1000 – Por Manoel Soares
“G20 é o tipo de evento em que a plateia é mais relevante que o espetáculo. Por mais que pareça contraditório, quem esteve nele como eu se dá conta disso. A declaração final ressaltando o combate à fome e o apoio a causas humanitárias diante dos conflitos armados, dançam no quadrado do óbvio. Tentar dar uma agulhada nos países mais ricos e jogar luz sobre a soberania fiscal dos países mais pobres até cria uma coceira na garganta de quem se senta no conselho de segurança da ONU, mas nada que já não esteja nos livros de Marcus Garvey.
Mas, quando olhamos para a plateia, entendemos que tem micro revoluções acontecendo em favelas, ruas e casas, que são invisíveis para as lentes de alta resolução que documentam e alimentam os indicadores de desenvolvimento humano. Pessoas que com pouco recurso cuidam do mundo que seus pés alcançam, pessoas que diluem o micro PIB de suas casas com operações que chegam a beirar a irresponsabilidade estrutural, pois salvam vidas com recursos que garantiriam a sua própria. Pessoas com coragem de fazer aportes que a proporcionalidade mundial se compararia a China, Rússia e EUA comprometerem seus tesouros para promover equidade de oportunidades. Algumas dessas pessoas foram documentadas no registro do estudo Cuidadores do Mundo que trás em sua coordenação Maria José Gouvêa, Marina Vieira e Raquel Diniz.
O documento fala de quem se senta nas cadeiras das palestras abertas, pessoas que não tem credenciais de Estado, pessoas que saem para comer um “joelho” com guaraná do lado de fora do evento porque é mais barato. Pessoas como o enfermeiro Alexandre Ernesto Silva, professor da Universidade Federal de São João Del Rei-UFSJ. Doutor em cuidados paliativos, ele conta que, por muito tempo, foi conduzido pela pergunta: como as pessoas morrem na condição de favela? A curiosidade e anos de pesquisa o levou a criar, em 2018, com um grupo de moradores e de profissionais de saúde, o projeto Favela Compassiva da Rocinha Vidigal, comunidades da Zona Sul do Rio de Janeiro. Um projeto pioneiro no Brasil para assistir pacientes que estejam vivenciando doenças ameaçadoras da vida e a seus familiares.
Em um palco que é custeado e promovido pelo Estado, pessoas como Eliane Vieira seria considerada uma voz semitonada ou até desafinada, pois ela é integrante de movimentos de mães que tiveram seus filhos violentados pelo Estado, ela é uma ativa combatente na luta pelo desencarceramento. Em sua trajetória de luta, fez parte da Rede Nacional de Mães e Familiares Vítimas de Terrorismo do Estado, foi promotora legal popular, atuando como liderança comunitária capacitada para ajudar a população a reconhecer e combater a violência e a discriminação, além de oferecer suporte para mães em todo o Brasil. Hoje, atua como perita no Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura, órgão público vinculado à ALERJ, resultante de diretrizes da ONU, Lei Estadual nº 5.778 de 30 de junho de 2010.
Corações como esses dois acima, são oxigenados pelo G20, mesmo que não sejam computados na equação final do evento. Assim como o que um dia foi o Fórum Social Mundial, a logomarca G20 tem seu Social Shower para governos e empresas, mas a essência de sua existência está nos olhos atentos das plateias que sentem um calor em seu peito protestar de maneira veemente os pedidos de desistência feitos pelos tribunais das dificuldades cotidianas, nessa hora o G20 vira G1000.”
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