1. É cada vez mais evidente que o Brasil não pode mais aceitar passivamente o modelo de desenvolvimento agro-mineral-exportador induzido que lhe está sendo imposto pela “nova divisão internacional do trabalho”: para a China, o fornecimento universal dos bens industrializados; para a Índia, o fornecimento universal dos serviços e, para o Brasil, o de fornecedor residual de produtos agrícolas e minerais.
2. Por que não? Pela simples e boa razão que o setor agro-mineral-exportador será incapaz de dar emprego de boa qualidade a quase 150 milhões de brasileiros com idades entre 15 e 65 anos que viverão em 2030! É exatamente a criação dessa capacidade que abre as portas para a construção da sociedade razoavelmente justa (dar igualdade de oportunidade para todo cidadão) que todos desejamos e que, afinal, nos impõe a Constituição de 1988.
3. Não deixa de ser perturbador como um grande número de pessoas assume um papel “conformista” diante do que supõe ser uma fatalidade histórica que é melhor aceitar do que combater. Aquela divisão internacional do trabalho não tem nada de “natural” ou “inexorável”. É apenas produto de uma inteligente política do governo chinês, oportunamente aceita na OMC, pela sua simbiótica relação com alguns países, em particular, os Estados Unidos, e pela complacência e omissão de outros, por exemplo, o Brasil.
4. É claro que o Brasil faz bem em aproveitar o aumento da demanda física de alimentos e minerais por parte da China e as altas de preços estimuladas pela política monetária americana. Como o dólar nominal é a unidade de conta internacional, quando ele perde valor a contrapartida do mercado é elevar ainda mais os preços das commodities.
5. Apenas para dar um exemplo: há dez ou 11 anos, um “mix” de exportação de 1 tonelada do Brasil comprava um “mix” de 0,9 tonelada da importação. Hoje, 1 tonelada exportada compra 1,4 tonelada importada. Isso correspondeu a um choque de “produtividade” que permitiu a libertação da economia brasileira da permanente situação de iliquidez externa: sua última manifestação foi em 2002, quando tivemos de correr ao FMI para permitir uma eleição tranquila. Mas é uma temeridade e uma grande imprudência supor que isso não vai mudar nos próximos 20 anos…
Por Antonio Delfim Netto
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