1. É um pouco ridículo ver em qualquer movimento aparentemente coordenado, intuitos “conspirativos”, “pero que los ay, los ay”! Recentemente, em nome de uma “ciência” monetária inexistente, assistiu-se a uma enxurrada de críticas ao movimento do Banco Central para reduzir o ritmo do crescimento do crédito para a venda de bens de consumo duráveis. De forma superficial, mas agressiva, alguns analistas as classificaram como “mais do que erradas”… Medidas que desde sempre foram usadas pelos Bancos Centrais, chegaram a ser xingadas de “heterodoxas”!
2. No fundo confundiram dois objetivos fundamentais de todo Banco Central: 1º) a manutenção da higidez e da liquidez do sistema financeiro para impedir que por problemas eventuais, ou por desvio de conduta, ou pela assunção de riscos excessivos por parte de seus agentes, interrompa-se o circuito econômico que faz funcionar a economia real e cria emprego e 2º) controlar a taxa de inflação em torno da meta fixada pelo poder eleito, quer seja ela explícita como no caso brasileiro (4,5%) ou implícita como é o caso do Federal Reserve dos EUA (2%).
3. O primeiro objetivo é tão (provavelmente mais!) importante quanto o segundo. O custo de um desvio inflacionário é visível e controlável dentro de algum tempo com custo social relativamente pequeno. A “quebra de confiança” produzida por uma “bolha” de crédito que leve à insolvência o sistema financeiro é invisível e instantânea! O seu custo em termos de PIB e de emprego geralmente é enorme e sua herança pode ser uma longa acumulação de problemas que levam anos para ser resolvidos.
4. Pois bem. As medidas de controle de crédito de bens de consumo duráveis foram tomadas porque há alguma evidência de que ele estava crescendo demasiadamente. O endividamento das famílias começava a revelar algum estresse no aumento da sua inadimplência. Qual é o risco de tal crédito? Principalmente o fato que o valor do bem de consumo durável dado como garantia é extremamente fungível. Um automóvel saído da loja em um ano perdeu 20% do seu valor e em dois anos quase 50% enquanto seu comprador tem ainda 48 meses a pagar… Uma geladeira ou uma televisão financiada a 36 meses não vale grande coisa no dia seguinte da sua saída da loja.
5. De fato, a grave crise que o mundo está vivendo foi produzida pelo descuido do FED americano – e de outros bancos centrais – com o crédito imobiliário que terminou numa terrível “bolha”. Ao explodir, ela consumiu até agora qualquer coisa como 5% do PIB mundial (duas vezes o PIB anual do Brasil) e deixou como resíduo pelo menos 30 milhões de cidadãos honestos desempregados.
por Antonio Delfim Netto
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