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Michel Temer e Deputado Federal Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR) || Fotos: Paulo Lisboa

Rodrigo Rocha Loures, o homem da mala, atiçou a curiosidade do país inteiro sobre sua trajetória, mas ele não é o primeiro coadjuvante do círculo presidencial a dar o que falar

Por Fábio Dutra para a Revista PODER de julho 

O Brasil assistiu pela televisão, na noite de 18 de maio, à inacreditável cena gravada pela Polícia Federal dias antes: o deputado federal Rodrigo Rocha Loures saindo correndo de uma pizzaria arrastando uma mala com R$ 500 mil entregues por um preposto do empresário Joesley Batista. Depois, em delação premiada, o corruptor informou que o dinheiro seria destinado ao presidente Michel Temer. Espanto geral pelo teor da denúncia e suas implicações políticas – logo passou-se a especular sobre uma deposição ou até uma eventual renúncia do mandatário. E também surgiu a curiosidade: quem é Rocha Loures?

Apesar de desconhecido da maioria do país, ele não era exatamente um novato na política. Já tinha sido eleito deputado federal pelo Paraná, em 2006, e perdido uma eleição para vice-governador, em 2010, para a chapa encabeçada pelo atual governador Beto Richa. Em 2014, foi candidato novamente a deputado federal e não se elegeu, mas garantiu vaga como suplente. Com a nomeação de Osmar Serraglio para o Ministério da Justiça, acabou herdando a vaga. E era como deputado federal, ainda que estivesse longe de Brasília, que ele foi flagrado em seu insólito cooper. Entre as legislaturas tampouco ficou fora do jogo palaciano: foi assessor e braço direito, entre 2011 e 2014, do vice-presidente… Michel Temer.

Chegou-se a aventar na imprensa que a tradicional família curitibana Rocha Loures estaria surpresa por ser citada nas páginas policiais. Ao que parece, não é bem assim. Há um choque natural por ter um ente querido investigado e espanto por ele ser Rodriguinho (Rodrigo é o pai), visto como boa-praça, bom aluno, bom caráter, patrão exemplar. Temido sempre foi o pai, fundador da Nutrimental (das barrinhas de cereal Nutry) e ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná, que chegou a ser investigado pelo Tribunal de Contas por usar recursos da entidade para custear despesas pessoais de parentes e fazer repasses injustificados a aliados. Próximo a Ney Braga, ex-ministro da Educação do ciclo militar, Rodrigo pai achou o caminho dos contratos das merendas escolares para sua indústria alimentícia – filão que perdeu durante o governo Collor, ao ver a Nutrimental protagonizar um escândalo de superfaturamento.

O escândalo, portanto, não é novidade na família; o nome do filho prodígio, contudo, é, sim, motivo de lamento. Ainda mais quando estava em seu melhor momento – pelo alto cargo e por estar a ponto de dar um neta para Rodrigo I – a menina deve nascer ainda este mês.

Se é certo que o deputado Rocha Loures não é novo no baralho da política, tampouco é seu clã. Já foi dito que o poder no Brasil é uma grande árvore genealógica, e, no caso do braço direito de Temer, a afirmação cai como luva. Descendente de fundadores de Curitiba e de políticos importantes, presidentes de província incluídos, os Rocha Loures são trezentões, homens que estão para o Paraná como os quatrocentões para São Paulo, gente que deteve propriedade e poder local desde sempre.

Apesar das particularidades da história do garoto de ouro preso pela Polícia Federal, com direito a tons anedóticos como a corridinha da propina ou o pedido de que suas madeixas fossem preservadas das navalhas dos carcereiros, o parlamentar não foi o primeiro personagem menor da política a surgir de repente como protagonista de grandes dores de cabeça para presidentes do Brasil. Novidade talvez sejam os valores nunca antes publicados: as gravações falam em R$ 480 milhões distribuídos em maletas semanais de meio milhão ao longo de 20 anos.
A seguir, PODER relembra figuras que emergiram do anonimato para balançar os alicerces do Planalto.

PC Farias (esq.), o tesoureiro de Fernando Collor saiu da vida e ficou mal na história || Foto: Roosewelt Pinheiro

PC Farias (governo Collor)
Paulo César Farias é outro personagem a sair das sombras diretamente para o imaginário popular. Tesoureiro da campanha vitoriosa do presidente Fernando Collor de Mello, PC, como ficou conhecido, passou a ver seu nome ser pincelado aqui e ali na imprensa a partir do congelamento de recursos decretado nos primeiros dias do mandato de Collor. Era na porta de PC que todos batiam para negociar facilidades com governo, mormente a liberação do dinheiro confiscado. Soma-se a isso a excêntrica vida do presidente bon vivant e de seus asseclas – que formavam a chamada República das Alagoas – e tem-se a narrativa perfeita. Com o presidente envolto em escândalos, logo veio à tona que PC era quem pagava a vida de nababo que Collor levava operando um propinoduto que se valia de “cheques fantasmas”, ou seja, cujos titulares eram laranjas do esquema. Baixinho, careca e fanfarrão – ele só andava num jatinho preto, apelidado de Morcego Negro, entre outras maluquices –, PC Farias foi depor na CPI contra o governo e atirou para todos os lados. Resultado: tornou-se o bandido número 1 da nação, onipresente no noticiário, e abandonou o Brasil. Localizado na Inglaterra, fugiu para Bangcoc, na Tailândia, onde foi preso e deportado. Fato curioso: o jovem e talentoso repórter da Folha de S.Paulo, Xico Sá, hoje escritor consagrado, era o único jornalista a quem PC dava entrevistas e foi até a Ásia falar com ele em primeira mão. PC Farias foi assassinado em 1996 ao lado de Suzana Marcolino, num caso que até hoje dá o que falar.

Gregório Fortunato (governo Getúlio Vargas)
Esse talvez seja o mais famoso e mais lembrado dentre os vários micro-organismos da vida palaciana que de alguma forma sacudiram o país. Chefe da segurança do presidente Getúlio Vargas, conhecido como Anjo Negro, em agosto de 1954 ele empreendeu uma malfadada tentativa de assassinato contra Carlos Lacerda, pseudônimo Corvo, maior opositor de Getúlio em seu último mandato. O vesgo atirador enviado para a missão fez com que Lacerda aparecesse depois em cadeira de rodas, vítima de um tiro no pé (até hoje diz-se que nada o atingiu, e ele mesmo se feriu para gerar o factoide) e mais virulento do que nunca. O atentado precipitou uma crise sem precedentes que culminou com o suicídio de Getúlio, em 24 de agosto. A história digna de ópera levou o escritor Rubem Fonseca a escrever seu clássico romance Agosto, que tem Gregório como personagem central.

Ibrahim Abi-Ackel (governo Figueiredo)
Ministro da Justiça de João Figueiredo, Ibrahim Abi-Ackel emergiu como personagem do grande escândalo do país em 1983, quando um norte-americano foi preso no aeroporto de Miami ao tentar entrar no país com US$ 10 milhões em pedras preciosas sem certificação. As investigações levaram a um empresário que tinha ligações com Abi-Ackel, e a cobertura da imprensa, recém-liberta da mordaça da ditadura, foi implacável. Ele conseguiu se segurar no cargo, mas seu nome caiu na boca do povo e deu muita amolação ao governo. Posteriormente inocentado, o mineiro atribuiu a virulência do noticiário as suas desavenças com Roberto Marinho, adversário declarado. Abi-Ackel sempre disse a quem quisesse ouvir que, quando ministro, criou empecilhos à importação de equipamentos para as emissoras de televisão, o que gerou a represália. Para um ministro do governo Sarney, “fizeram uma grande sacanagem com o Abi-Ackel”.

Jorge Murad (governo Sarney)
Visto como “eminência parda” do sogro José Sarney, Jorge Murad, o Jorginho, como é conhecido no Maranhão, tinha fama de ser o grande intermediador entre o presidente e o empresariado. Nunca se provou nada, mas, em 1988, com o governo combalido pela crise econômica e a superinflação, ele foi investigado pela CPI da Corrupção (no fim arquivada) por ter usado sua influência para liberar verbas do Ministério do Planejamento para a prefeitura de Pinheiro (MA). À época, o ex-ministro Aníbal Teixeira deu declarações bombásticas ligando sua saída do governo à recusa de ceder às pressões de Murad. Depois, em 2002, quando sua mulher, Roseana Sarney, era pré-candidata à Presidência da República, durante o governo FHC, ele foi flagrado pela Polícia Federal com mais de R$ 1 milhão em dinheiro vivo na sede de sua empresa, a Lunus, em São Luís. Os recursos eram para a campanha, mas arrecadados fora das regras da legislação.
Falou-se muito que a apreensão do numerário teria sido encomendada pela candidatura governista, incomodada com a boa avaliação de Roseana nas pesquisas. Não para por aí: logo após o caso Lunus, o nome do genro notório reapareceu na boca do então presidente do Senado Federal, Ramez Tebet – o depoimento de Jorge Murad à CPI de 1988 havia desaparecido misteriosamente dos anais do Congresso.

Xico Graziano, da tropa aloprada de FHC || Foto: Letícia Moreira

Xico Graziano (governo FHC)
O primeiro grande escândalo do governo de Fernando Henrique Cardoso teve jeito de conspiração de novela das 6: um diplomata e um ministro da Aeronáutica pegos com a boca na botija em grampos telefônicos. Grampos que teriam sido armados, diga-se, por um político próximo de FHC enciumado com o controle da agenda do mandatário, segundo a versão oficial, e com auxílio do chefe da Polícia Federal. O imbróglio era em torno da licitação para compra de equipamentos militares para vigilância da Amazônia, o projeto Sivam, e envolvia valores da ordem de US$ 1,4 bilhão. O chefe do cerimonial do Palácio do Planalto, Júlio César Gomes dos Santos, o ministro Mauro Gandra e até o próprio presidente foram alvo da arapongagem. Santos e Gandra foram pegos beneficiando a norte-americana Raytheon, ganhadora da disputa, e perderam o emprego. Dias depois reportagem da revista IstoÉ cravou que o responsável pela divulgação das escutas era Xico Graziano, então presidente do Incra, que recebeu as transcrições de Paulo Chelotti, da Polícia Federal. Graziano, que imediatamente levou o apelido de “corvo” – mais um – também saiu do governo, mas até hoje é próximo de FHC, tendo sido até assessor da presidência da Fundação FHC.
Graziano voltou ao centro do noticiário duas vezes recentemente. Na primeira, quando a Polícia Federal rastreou os boatos que circularam pela internet dando conta de que os frigoríficos Friboi seriam de propriedade de Fábio Luís da Silva, o Lulinha, filho do ex-presidente Lula. Utilizando seu computador na Fundação FHC, Daniel Graziano, filho de Xico, foi identificado como um dos propagadores da história. Xico Graziano também publicou em novembro passado, em meio à crise política que sacode o país, um artigo na Folha de S.Paulo em que conclamava o “Volta, FHC”.

Freud Godoy ex-assessor do presidente Lula || Foto: Fernando Donasci

Freud Godoy (governo Lula)
Papagaio de pirata de Lula desde a campanha de 1989, onipresente nas fotos do presidente em seu primeiro mandato, o guarda-costas petista virou protagonista durante a campanha de 2006. Às vésperas da campanha presidencial, alguns emissários da campanha petista ao governo de São Paulo foram presos em um hotel com R$ 1,7 milhão destinado a comprar um suposto dossiê contra o tucano José Serra, adversário de Aloísio Mercadante. O presidente, candidato à reeleição, chamou os envolvidos na ação de “um bando de aloprados”, batizando involuntariamente o caso. Um dos presos delatou ter ido ao hotel a mando de Godoy, então assessor especial da Presidência, o que levou a sua exoneração e à especulação de que fora o próprio Lula o responsável pelo envio dos aloprados. Posteriormente, Marcos Valério, já condenado por sua atuação como operador financeiro do mensalão, em tentativa de negociação de delação premiada, chegou a indicar Freud Godoy como destinatário de cerca de R$ 100 mil que seriam para pagamento de despesas pessoais de Lula, mas o caso não foi adiante.

Erenice Guerra, braço direito de Dilma, cujo filho foi acusado de vender facilidades || Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom

Erenice Guerra (governo Lula)
O escândalo ocorreu no governo Lula, é certo, mas a bomba estourou foi no colo de Dilma Rousseff, então candidata situacionista à Presidência da República. Erenice Guerra havia sido braço direito de Dilma no Ministério da Casa Civil e assumira o posto de Dilma quando esta precisou deixar o governo para a candidatura. Em setembro de 2010, a um mês da eleição, veio à tona a acusação de que o filho de Erenice, Israel Guerra, mantinha uma empresa de consultoria que facilitava negócios com empresas estatais mediante o pagamento de 6% do valor dos contratos conquistados. O noticiário caiu como uma bomba na campanha de Dilma em razão da proximidade com Erenice (fotografias da assessora com brincos iguais aos da candidata petista, um presente da chefe, pipocaram na mídia nas semanas seguintes). Até então líder isolada nas pesquisas de intenção de voto, Dilma Rousseff viu seu adversário, José Serra (PSDB), crescer e tornar a disputa acirrada até o último dia do segundo turno, quando ela finalmente foi eleita e respirou aliviada.
Erenice Guerra teve o processo arquivado pela Justiça Federal por não haver indícios de ilícitos praticados por ela, mas recentemente reapareceu citada em delação premiada da Lava Jato como destinatária de repasses da construtora Engevix, uma das investigadas no escândalo da Petrobras.

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