Aos 52 anos, solteira há três, Debora Bloch fala a J.P sobre envelhecer diante de uma plateia, cirurgia plástica, a chatice que é usar óculos de leitura e até de beijo na boca – que para ela não é coisa do passado, não
Por Kanucha Barbosa
Fotos Daniel Klajmic
Quando Debora Bloch chegava em qualquer festa na década de 1980, o som da voz de Cazuza cantarolando “pode seguir a tua estrela…” logo começava a embalar a pista de dança. O trecho é da música “Bete Balanço”, que dá nome a um dos primeiros filmes de sua carreira, lançado em 1984. Hoje, aos 52 anos, ela e suas pernas de quem fez anos de balé não deixam nada a desejar no quesito animação. Já seus pés, bem, andam firmes no chão – nada como a idade. Sem divar, enquanto era maquiada para este ensaio, aconselhou que não deixassem seu olho muito carregado, pois sabe que com ela não rola. Ao experimentar o figurino, mais opiniões sobre o que lhe cai bem, ou não: um vestido vermelho Cris Barros que na teoria funcionava, na prática, Debora achou que não. Sai o tal vestido, então.
Com os filhos criados – Julia tem 21 anos e Hugo, 17, ambos fruto de seu casamento com o chef Olivier Anquier, que terminou em 2006 –, ela tem a liberdade para começar uma nova fase da vida: “Não é fácil envelhecer, mas é algo que você tem de aceitar e viver da melhor maneira possível dentro da sua idade, com uma cabeça boa e, sobretudo, com saúde”, diz Debora, que corre e se exercita todos os dias, usa cremes para a pele religiosamente, mas “detesta” ir ao salão. “Só para pintar o cabelo”, o resto é tudo em casa. Cirurgia plástica? Fez uma aos 20 e poucos anos, no nariz, e depois disso não pensou em entrar na faca. “Acho ok, mas é uma coisa que tem de ter certa parcimônia ao se submeter.” No meio da conversa, ela pausa e pensa: “Lógico que tem uns detalhes: agora eu tenho de usar óculos de leitura, o que é um porre; me exercito mais, como menos, durmo uma boa noite de sono, porque senão, não funciona”.
No departamento romântico, está solteira há três anos, mas garante que ainda beija na boca. No ano passado, em uma premiação de música no Rio, foi vista no maior teretetê com Jamelão Netto, neto do sambista carioca – até onde se sabe comprometido. Ela nega: “Apenas dançamos juntos, mas não aconteceu absolutamente nada. Ganhei a fama sem deitar na cama!”. Mesmo assim, diz que ainda acredita no amor: “Quando você está apaixonada por uma pessoa, acredita que vai ficar com ela pra sempre. É gostoso achar isso”.
CASA HIPPIE
Com o pai ator – ela é filha de Jonas Bloch –, Debora diz que não conseguiria responder se seria outra coisa senão atriz nem em um milhão de anos. “Desde garota, o teatro está dentro da minha casa. Shakespeare e Ibsen fizeram parte da minha infância e adolescência. Tenho uma lembrança que sempre conto aos outros: a de meu pai treinando esgrima com Walmor Chagas, os dois ensaiando para uma cena de ‘Hamlet’”. Como as peças abordavam assuntos muitas vezes densos, os tópicos que eram proibidos para outras crianças acabavam sendo discutidos livremente na casa dos Bloch. “Cresci na época da ditadura militar e a ideia de liberdade, que não existia no país, era um valor muito importante para o meu pai. Ele dizia que dentro de casa a gente iria exercitar a democracia. Era uma ideia humanista, minha casa era meio hippie.”
Depois de virar mãe, ela continuou com a vertente humanista e também fez questão de conversar abertamente com os filhos sobre qualquer coisa, mas a ideia da casa hippie ficou pra trás, já que ela preferiu ser aliada de regras e limites com os pequenos. “Fiz balé por muito tempo e isso me disciplinou.” A fórmula deu certo: Julia mora em Nova York, onde estuda cinema, e Hugo está prestes a embarcar para uma temporada na mesma cidade para a faculdade de game design. “Vai ser difícil quando meu filho for embora, mas é um caminho natural. Criar filho é ensinar ele a viver sem você. Mas não é fácil, não.”
MANTENHA DISTÂNCIA
Para Debora discrição é essencial. O principal motivo é pela arte, já que acredita na premissa de que quando a pessoa física se sobressai à personagem, o trabalho acaba prejudicado. “Gosto de me apagar. Acho que atrapalha bastante construir uma personagem quando a vida do artista fica muito exposta.” Seu perfil no Instagram é fechado e ela não pretende abri-lo tão cedo. “Não sou muito ligada a redes sociais, posto fotos, mas é para os meus amigos”, explica. Mesmo morando no Rio de Janeiro, paparazzi não é uma questão na vida dela. “Não sou muito seguida por eles, mas vou menos a alguns lugares que frequentava quando era garota, como à praia. É um saco ser fotografada na areia”, diz ela, insegura. Por isso, Debora tem a Bahia – é dona de uma casa na praia do Espelho, no sul do estado. Quando está por lá ou tem tempo de sobra no Rio, gosta de se desligar completamente do mundo real. Em casa, lê autores como Ian McEwan e Paul Auster, assiste a séries de TV e a filmes – os diretores Woody Allen e Pedro Almodóvar, aliás, são nomes com quem a atriz adoraria trabalhar. Em contrapartida, no começo deste ano, Debora anunciou em uma entrevista que havia feito um aborto aos 20 anos, o que a deixou exposta na mídia por um bom tempo. A resposta? “Não me arrependo de ter falado sobre isso. Espantei-me porque parece que eu falei sobre uma novidade e esse é um assunto velho. Acho uma hipocrisia as pessoas ficarem surpresas e que isso ainda seja um tabu. Tem gente que finge que não existe, mas na verdade são feitos nas piores condições, muita mulher morre por abortos malfeitos. Estamos muito atrasados no Brasil, né?”.
ATRÁS VEM GENTE
O plano de aposentadoria perfeito para ela seria o inexistente: não pretende parar de trabalhar nem que lhe paguem. “Tenho muito prazer na minha profissão, que é tão rica intelectualmente. O melhor de tudo são as trocas com pessoas de perfis, idades e universos diferentes. Não abro mão”, diz ela, que acaba de viver a jornalista Lígia na última novela das 6, “Sete Vidas”, da Globo, e está produzindo uma peça do dramaturgo americano Will Eno, batizada “The Realistic Joneses”, que contou com atores como Marisa Tomei, Toni Collette e Michael C. Hall na montagem americana. Debora vai trazê-la para o Brasil e chamá-la de “Os Realistas”. “Outro dia fiz uma leitura com amigos em casa. Cozinhei, tomamos vinho e passamos o texto. É desse prazer que estou falando. Ficamos todos na vontade de começar a ensaiar logo, pretendo envelhecer trabalhando.” Estamos de olho.
Styling Luna Nigro
Beleza Lavoisier (Capa MGT)
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