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Ilustração Modaholics by Bruna Bertolacini

Conheça os brasileiros que compram direto das passarelas ternos, bolsas e sapatos como quem coleciona arte: pensando mais na coleção de grife que vão juntar do que no look

Por Chico Felitti para a revista J.P. de julho || Ilustrações Bruna Bertolacini

Se um historiador quiser fazer um museu com as criações de Alexandre Herchcovitch, estilista brasileiro que alcançou maior destaque nos últimos 20 anos, não precisa visitar uma loja. É só se encaminhar até o apartamento de Charles Cosac, em São Paulo. É em seu dúplex em Higienópolis que está um dos maiores acervos de peças do estilista no mundo. Cosac, que fundou a editora Cosac Naify e hoje dirige a Biblioteca Mário de Andrade, comprou por anos toda e qualquer peça que Herchcovitch desfilasse, devidamente ajustada para o seu tamanho.

O que não quer dizer que ele as usasse. A maioria das criações nunca foi para a rua, já que o colecionador de arte tende a se apaixonar por algumas poucas roupas e usá-las com frequência. Nos últimos meses, ele está obcecado por sapatos tachados de Christian Louboutin. “Eu gosto muito de moda”, disse o fleumático Cosac numa manhã recente. É o máximo que ele se estende sobre sua coleção – a não ser quando elogia a camisa com uma mancha de sangue usada pelo interlocutor, pergunta de onde é e diz que vai entrar em contato em breve com o criador da peça, o alfaiate João Pimenta.

Cosac é um exemplo vívido de modaholic. A palavra foi cunhada por um stylist de celebridades globais para definir as pessoas viciadas em moda que obtêm um prazer sem tamanho com o ato da compra, sem necessariamente se importar com colocar aquela roupa para bater.

Nomes como Yohji Yamamoto, Rick Owens e uma tropa de estilistas coreanos recheiam o guarda-roupa de Tude Bastos, o único herdeiro de um bairro que leva seu nome na Praia Grande, litoral de São Paulo. Mas nem sempre conseguem ver a luz do sol. “Muita coisa eu não uso por falta de ter um lugar adequado para usar.” Um dos modelos que espera no armário do empresário de 59 anos, que mora entre Chicago, Taipei e o Brasil, leva uma etiqueta de Lino Villaventura, um dos estilistas mais autorais que já passou pelas semanas de moda brasileiras. “Comprei uma roupa do Lino que era cheia de brocados e miçangas. Um top e uma calça bem bordados. E estão lá, lindos e parados. As chances de eu usar são poucas.”

Para Bastos, faltam lugares “mais glamourosos”, onde “as pessoas tenham informação”. Um dos poucos oásis onde ele pode dar vazão ao seu estilo é o restaurante Pump, em Los Angeles. “É de uma das Real Housewives of Beverly Hills (reality show sobre ricas que, com uma exceção ou outra, não trabalham). As mulheres são todas lindas, cabelos maravilhosos, saltos altíssimos.” Ele comprou na Versace, em uma só tacada, um jogo de dezenas de peças de roupa de cama e de almofadas. “Tem um grafismo colorido, um material muito delicado. Nunca usei, porque tenho cachorro, sabe como é. São feitas para um quarto que fique trancado o tempo todo.” Apesar de nunca ter usado essas peças (e outras, como um casaco de chinchila), Bastos diz saber o número exato de compras que faz.

Já a apresentadora e modelo Andressa Suita perdeu a conta faz algum tempo. “Sempre tive muitas opções por minha mãe ter uma loja de bolsas e sapatos na infância, mas nunca cheguei a contar a quantidade”, diz ela, que foi Miss Brasil Juvenil em 2002. Mas uma rápida ronda por suas fotos já eleva a cifra de acessórios para as centenas. Seus quase 2 milhões de seguidores nas redes sociais veem um desfile diário de bolsas YSL, Gucci, Prada, Chanel e mais outros tantos nomes de grife que poderiam montar não uma semana, mas um mês de desfiles. “Quando comecei a trabalhar e ganhar meu próprio dinheiro, comecei a investir mais em mim, no meu estilo e nas peças que eu mais gostava”, conta Andressa, que deu a entrevista grávida de 38 semanas de Gabriel, filho do cantor sertanejo universitário Gusttavo Lima. Mesmo prestes a dar à luz, ela não havia desistido do salto.

Mas acontece com frequência de os modaholics serem mal interpretados. A empresária Marina Morena, filha de criação de Gilberto Gil, gravou semanas atrás um vídeo falando sobre a sua fixação por moda. Mostrava sua coleção e contava causos. Disse, por exemplo, que estava começando a se enjoar de uma bota roxa que vai até o alto da coxa e é feita de spandex, um tecido elástico. A peça custa US$ 1.500 e é idêntica à usada por Anitta no videoclipe de “Paradinha”. Narrava ainda no vídeo que o afã de ter uma bota Givenchy que estava com a sola ainda quentinha da passarela fez com que acabasse amealhando um modelo uns números maiores, que usa sem problemas – está, inclusive, com ele na sua foto de WhatsApp.

Houve comentaristas da internet de plantão que não gostaram do que ouviram. “Bem pobre de espírito!”, criticou um. “FÚTIL”, cravou outra, em letras maiúsculas. Convidada para dar um depoimento sobre a predileção de investimento para esta matéria, Marina declinou. “Não quero mais falar sobre moda. As pessoas distorcem as coisas neste momento no Brasil.”

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