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Caco Ciocler na apresentação de seu filme, em Gramado, e trechos de seu documentário

Por Denise Meira do Amaral, de Gramado

Estreando na direção de seu primeiro longa, o “Esse Viver Ninguém me Tira”, no 42º Festival de Gramado, Caco Ciocler falou durante coletiva de imprensa, nesse sábado, sobre o desafio de registrar a vida de dona Aracy, mulher de Guimarães Rosa e responsável por ajudar muitas famílias judias alemãs a emigrarem ao Brasil na época do nazismo, sem que ela caísse na sombra do escritor de “Grande Sertão: Veredas”. Como a família de Guimarães Rosa não permite que se reproduzam cartas e fotos suas, assim como trechos de sua obra [com exceção de “Grandes Sertões”, cujo direito autoral pertence à famíla Tess, de dona Aracy], o documentário precisou ser inteiramente baseado na figura dela: “O que começou como um problema acabou sendo uma solução. Fizemos com que Aracy reinasse absoluta, sem o Guimarães Rosa”, explicou Caco.

Outro fator que também poderia trazer dificuldade é o fato de haver pouca documentação do período, o que também acabou favorecendo o longa: “Como tínhamos poucos documentos, usamos muito a imaginação. É como eu digo no começo do filme, se eu não consigo achar a Aracy, talvez eu possa achá-la através do olhar de quem se encantou por ela e quis iluminá-la de alguma maneira. Fui através desses olhares, muito mais do que documentos, para construir o nosso olhar”.

“Esse Viver Ninguém me Tira” partiu da ideia de Alessandra Paiva – co-diretora do filme, que já vinha pesquisando a vida de Aracy por três anos, e só depois do roteiro estar pronto é que Caco Ciocler se juntou à equipe. “Foi muito difícil entrar em um projeto que já estava pela metade. Durante muito tempo eu fiquei me perguntando por que é que eu estava fazendo esse filme e ficava desesperado tentando buscar conexões comigo. E durante o processo fui descobrindo que parte da minha existência eu devia a dona Aracy. Pude presenciar e filmar o processo de aproximação e de descobertas das conexões que vieram durante o filme”. Descobertas incríveis, por sinal.

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Durante a exibição do filme, que aconteceu na noite dessa sexta-feira, em Gramado, Caco revelou que teve muitas crises durante o processo de filmagem, mas que seu amigo [Ivan] sempre o lembrava: “Caco, lembra porque você está fazendo esse filme”. Glamurama então quis saber: Caco, por que você queria fazer esse filme? “Eu tinha o sonho de dirigir um longa há algum tempo. E ele me lembrava que eu quis fazer o filme para me exercitar nessa função. E tudo o que estava acontecendo, inclusive de errado, fazia parte do meu aprendizado”.

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Caco Ciocler é, além de diretor, personagem ativo no filme, narrado em primeira pessoa. Os momentos mais bonitos de “Esse Viver Ninguém me Tira” são quando ele vai atrás da busca pessoal, com textos de sua própria autoria. “Ser ator teve suas vantagens e desvantagens nesse filme. Nas entrevistas, atrapalha um pouco. O entrevistado acabava ficando um pouco mais acuado. Por outro lado tem essa narração pessoal, que talvez se eu não fosse ator, teria mais dificuldade”.

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Judeu, Caco confessou que não é uma pessoa muito religiosa, mas que a conexão fala mais alto. Deve ser de sangue, genética. “Me deparei com uma situação curiosa. Durante o processo de conservação de um jornal antigo, em que a mulher passava com uma espécie de um ferro, eu tinha na lente da minha câmera a imagem de uma suástica sendo cuidada. E eu tive uma crise. Eu não tenho relação nenhuma, não tive nenhum parente morto, nada. Mas acho que está no sangue. Descobri uma conexão profunda com meu povo, da minha história, que eu desconhecia”.

 

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