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Florencia Ferrari, Elaine Ramos e Gisela Gasparian da Ubu
Florencia Ferrari, Elaine Ramos e Gisela Gasparian da Ubu || Créditos: Bob Wolfenson/Divulgação
Florencia Ferrari, Elaine Ramos e Gisela Gasparian da Ubu || Créditos: Bob Wolfenson/Divulgação
Florencia Ferrari, Elaine Ramos e Gisela Gasparian, da Ubu || Créditos: Bob Wolfenson/Divulgação

Para quem trabalhou na extinta Cosac Naify, que ficou conhecida por suas publicações de alto nível, abrir uma editora pode ser muito arriscado. Pois é exatamente isso o que as sócias da Ubu estão fazendo este mês.

Por Antonio Bender Mammì para a Revista PODER de setembro

Ubu não é uma palavra indígena nem uma fruta do Nordeste. É o nome do personagem principal da peça mais famosa do escritor francês Alfred Jarry, Ubu Rei, sátira protagonizada por um líder político autoritário e em descompasso com a realidade social. A obra coroou uma produção intelectual pluralíssima: Picasso revelou ter se inspirado nessa figura ao retratar o ditador (espanhol Francisco) Franco; Paul McCartney manteve um programa de rádio, nos anos 1990, que se chamava Oobu Joobu, adaptação do título da peça; o filósofo francês Gilles Deleuze chegou a dizer que Jarry foi o precursor do filósofo austríaco Martin Heidegger, um dos pensadores mais importantes dos últimos 100 anos.

Foi a peculiaridade do nome e o fato de a obra proporcionar uma infinidade de conexões entre diferentes áreas do conhecimento que Florencia Ferrari, Elaine Ramos e Gisela Gasparian a escolheram para batizar sua editora, que entra no mercado este mês. “É um nome que tem matriz literária, mas que não é conhecido. E é uma palavra curta, um palíndromo, dá alternativas visuais que permitem muitas releituras”, diz Gisela. Em um primeiro momento, releitura é um exercício inevitável. Afinal, Florencia e Elaine trabalharam por mais de uma década em uma das mais celebradas editoras do país: a Cosac Naify. A primeira foi diretora editorial de 2012 até o encerramento das atividades da casa, ano passado, enquanto a segunda capitaneava o departamento de arte que revolucionou o design de livros no Brasil. Nesse contexto, como se desvincular da imagem da antiga empregadora? A começar pelo perfil de Gisela, a terceira sócia, que trabalhou na McKinsey, Somos Educação (nova denominação da Abril Educação depois que passou a ser controlada pelo fundo de investimentos Tarpon) e tem mestrado em desenvolvimento econômico em Harvard. Sem falar que Gisela foi criada em um ambiente inevitavelmente literário – seu avô, Fernando Gasparian, era dono da Paz e Terra, uma das mais importantes editoras do país no passado, e sua família é proprietária da livraria Argumento, no Rio de Janeiro.

Com panilha

Se tomarmos a Cosac Naify como comparativo do ponto de vista empresarial, de acordo com reportagem publicada na revista Piauí em abril deste ano, a extinta editora só passou a utilizar planilhas de cálculo cinco anos depois de sua fundação. Depois do fechamento da casa em que trabalharam durante 13 anos e vacinadas contra os percalços do mercado, Florencia e Elaine quebravam a cabeça tentando esquematizar um modelo de negócios viável. Foi quando conheceram Gisela, que começou a ajudá-las a estruturar o plano comercial, pro bono mesmo. Em abril, a sociedade estava selada.

Florencia, que viveu o drama da Cosac, conta que a relação entre despesa e faturamento era impossível por se tratar de uma editora que fazia tudo com muito esmero, mas que tinha uma estrutura inchada. De fato, o organograma da Ubu é bem enxuto: além das três sócias, há uma funcionária tocando o departamento comercial e dois estagiários. O restante do trabalho é realizado por freelancers, o que dá à empresa o curioso epíteto de editora sem editores. O local escolhido para a sede também representa uma tremenda economia: seis mesas em um espaço de coworking no Largo do Arouche, no centro de São Paulo. Quanto às despesas pesadas, como custos editoriais, gráficos e de distribuição, espera-se que sejam atenuadas pela experiência de Elaine e de Florencia. A última, aliás, considera os primeiros resultados animadores. “Para a edição crítica de Os Sertões, de Euclides da Cunha, nosso primeiro lançamento, vamos dividir os custos de impressão com o Sesc, R$ 100 mil ao todo. Valor a que chegamos depois de a Elaine ter conduzido uma baita negociação com a gráfica, reduzindo 25% do orçamento inicial”, conta. Além disso, a Ubu vai editar o livro em duas versões, uma comercial e outra para especialistas, e elas selaram um acordo de exclusividade com a Livraria Cultura para a segunda.

Importante dizer também que a Ubu tem um bom colchão financeiro para se proteger em períodos de turbulência econômica. Já no fim do ano passado, pouco depois de a Cosac Naify ter anunciado o encerramento de suas atividades, Florencia e Elaine acordaram com Charles Cosac, o dono, o repasse de 35 obras do antigo catálogo, entre as quais se destacam títulos de antropologia, de design e da coleção Exit, que debate questões contemporâneas. São livros com expectativa de vendas relativamente previsível, sendo que alguns são adotados por universidades.

Mesmo assim, em um mercado em que 15 editoras foram responsáveis por 60% das vendas no ano passado e que têm, em suas listas de mais vendidos, majoritariamente, livros religiosos, de autoajuda e infantojuvenis, é possível prosperar sendo uma editora de nicho? “Nosso perfil não vai ser de massa. A Cosac tinha mil títulos no catálogo, lançava mais ou menos dez títulos por mês, e vendia. O problema nunca foi faturamento, havia um público fiel – basta ver a comoção quando a editora fechou. Não queremos vender 10 mil exemplares, mas vender livros formadores de opinião, que deem elementos para as pessoas discutirem a sociedade contemporânea. Há um vácuo que podemos ocupar”, sustenta Florencia.

A captação de recursos para abrir o negócio foi menos espinhosa do que imaginavam. Financiada principalmente por amigos e familiares das sócias, a Ubu se apresentou como um investimento sólido. “Não somos um aplicativo que vai multiplicar qualquer investimento por 80, mas o risco é muito mais baixo. Conhecemos o mercado, sabemos fazer livros, temos redes de fornecedores e livreiros”, explica Gisela. Sem falar em valores, o trio projeta que em três anos vai chegar ao break-even, equilibrando capital investido e receita. Para pagar o investimento, coisa de cinco a seis anos. Como devem ter dito a Jarry antes da estreia de Ubu Rei nos teatros parisienses, em 1896: “Merde!”.

Próximos capítulos 

Este mês, a Ubu entra em campo com o lançamento da edição crítica de Os Sertões, em comemoração aos 150 anos do nascimento de Euclides da Cunha.

Até o fim do ano, entre reedições da Cosac Naify e títulos originais, serão lançados mais nove livros. No pacote, o trio de sócias pretende lançar o site da editora, plataforma para vender não só os livros da casa, mas também publicações de instituições culturais (como Instituto Moreira Salles, Masp e Pinacoteca) e de editoras independentes. Abaixo, os outros lançamentos que a Ubu coloca nas livrarias ainda este ano:

• Arquitetura em Diálogo – Alejandro Zaera-Polo

• Design para um Mundo Complexo – Rafael Cardoso

• O Supermacho – Alfred Jarry

• Jacaré, Não! – Antonio Prata

• Metafísicas Canibais – Eduardo Viveiros de Castro

• 24/7: Capitalismo Tardio e os Fins do Sono – Jonathan Crary

• Ressaca Tropical – Jonathas de Andrade

• A Casa Butantã – Paulo Mendes da Rocha

• Cartas de Areia – José Rufino

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