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Armando Babaioff e Nanda Costa como Ionan e Maura em “Segundo Sol”|| Créditos: Reprodução

As mudanças da sociedade quando o assunto é homossexualidade são inegáveis. Em “Segundo Sol”, o casal Maura e Selma [Nanda Costa e Carol Fazu] é popular, querido pelo público, carismático. As duas deram o antes tão polêmico beijo gay em plena novela das nove e quase passou batido. Ninguém fez um Carnaval em cima disso. Tudo muito natural. Porém, nesse cenário sem rejeições – pelo menos quando a gente analisa no macro – vem João Emanuel Carneiro, o autor, que não gosta de zona de conforto, e desenha uma situação que grita o argumento de “cura gay” já visto como tão retrógrado por grande parte dos telespectadores: Maura se envolve com Ionan [Armando Babaioff], seu colega de trabalho e doador de semen, ou seja, pai biológico do filho que ela espera.

E aí a revolta que não veio pelo beijo gay vem é no sentido contrário, com essa possibilidade do texto reacender essa questão reacionária, como se um homossexual pudesse “voltar atrás” e “escolher” ser hetero. Claro que não é isso, claro que existem mil facetas, que a população mundial não se divide apenas e homo e hetero… Mas que os últimos capítulos estão gerando a maior polêmica não dá pra negar… Com a palavra, Armando! Vem ler o que o ator pensa sobre o assunto! (por Michelle Licory)

Armando Babaioff e Nanda Costa como Ionan e Maura em “Segundo Sol”|| Créditos: Reprodução

Glamurama: Muita gente está usando o termo “cura gay” de novo por conta da situação mostrada na novela, mesmo que para reprovar o casal Maura e Ionan, alegando que dá uma falsa ideia [de cura gay] e assim presta um desserviço…
Armando Babaioff: “Estou vivendo de acordo com o texto escrito. Já sabia que os personagens iam ter um relacionamento. Não esse tipo de relacionamento, mas que o Ionan seria doador de semen para a Maura. O que acho interessante na levada do autor é que o meu personagem vive um relacionamento abusivo com sua mulher, Doralice [Roberta Rodrigues], que está sempre o agredindo… A agressão virou um código desse casal. E na família Falcão ele é o filho do meio. Na minha concepção de criação, o vejo como o cara do meio do caminho, que herda as camisas do irmão mais velho, que está sempre nessa… Não é nem o caçula, nem o mais velho… Eu o vejo como um cara… Não triste, mas resignado. E que sempre esteve nesse lugar de não ser preferido, de ter uma autoestima baixa. Desatento. Acho que ele ama a Doralice, sinto que sim. Mas ele nunca é exaltado por ela, ele não encontra elogios. Ela não diz qualidades que enalteçam o caráter dele, a personalidade dele. E de repente ele acha essa parceria nessa colega de trabalho, e desde o início rola uma grande amizade entre os dois. Acho lindo a forma como eles se relacionam, quase como irmãos. Dedicação, curiosidade e parceria. E a Maura, sim, sempre enalteceu esse homem. Aí de repente ele leva um susto com a forma como aquela mulher o vê. Quando começa esse assunto sobre ela querer ser mãe e jogar a ideia do doador pra fora, falar que Ionan talvez fosse o perfeito doador…”

Glamurama: E ele é mesmo?
Armando Babaioff: “De verdade? Ionan não é o perfeito doador, pelo perfil dele. Não para o que elas queriam. Ele é extremamente paternal! Estava na cara que ele ia querer, de alguma forma, tentar participar, até porque ele tem grande paixão por seus filhos. Dentro da família Falcão, ele reproduz um comportamento de pai, tentando levantar a moral de todo mundo da casa, cuidar. O Beto [Emilio Dantas] é o artista, o Clovinho [Luis Lobianco] é o café com leite e o Remy [Vladimir Brichta] é meio errado, torto. O Ionan é que tenta trazer todo mundo para o centro. Quando a Maura solta essa ideia da doação de semen, isso desperta nele… ‘Nossa, o que está acontecendo… Mas ela é minha amiga, talvez eu possa’… E aí ele se perde nesse caminho. Pagou pra ver… Não conseguiu ficar alheio a isso e acaba se envolvendo”.

Glamurama: Mas eles estão mesmo apaixonados ou é uma confusão de sentimentos?
Armando Babaioff: “Acho que seria leviano da minha parte falar que é apenas uma confusão de sentimentos para tirar o corpo do meu personagem fora… Neste momento, estou vivendo a confusão. Essa resposta definitiva só em novembro”.

Glamurama: Logo agora que não houve rejeição ao beijo gay, ao casal de mulheres…
Armando Babaioff: “Não houve rejeição mesmo … A primeira vez que elas se beijaram foi tão espontâneo, natural, estava dentro da cena de forma tão linda que não percebi. Tive que ver de novo pra prestar atenção no beijo”.

Glamurama: Não vai embaralhar de novo os conceitos em torno da “cura gay”?
Armando Babaioff: “É um pouco reducionista olhar só por uma ótica. Uma coisa que acho imprescindível é não ter tido repercussão negativa para o casal gay. Isso é válido, é um ganho. Mas precisamos prestar atenção em outras questões. Não sei te dizer com todas as palavras se o que eles estão vivendo é só confusão. Eles deram muito suporte um ao outro. Ela passou por aquele momento conturbado com a família, aquele pai homofóbico, machista, misógino, e meu personagem vivendo essa novidade de ter uma parceira policial que age daquela forma, que o valoriza. Os dois vão se encontrando… Sou prolixo porque fico muito preocupado com a abordagem, mas para ilustrar essa questão da naturalidade, vi no Instagram uma enquete… ‘Para qual casal você torce: Maura e Selma, Maura e Ionan ou Ionan e Doralice?’. Quando a gente imaginou essa equidade? Isso também não é interessante?”

Glamurama: Você quer dizer que não é “cura gay”, ela é apenas bissexual? E que também essas pessoas merecem ser representadas?
Armando Babaioff: “Maura não se interessou por qualquer homem, foi por Ionan. Selma é o primeiro relacionamento homossexual dela. Ela nunca havia se relacionado com uma mulher antes. Ionan nunca se interessou por outras mulheres, sempre foi fiel. E se interessa pela Maura. E o interesse é na pessoa. Pessoa! Estou usando essa palavra para ser menos reducionista. Menos específico. Não sei se é bissexualidade. Eu acredito que a sexualidade é fluida. Eu, pessoa física, acredito na fluidez da sexualidade e prezo por isso para a humanidade. Realmente um dos maiores problemas é rotular, colocar as pessoas em caixinhas porque a gente precisa disso para nos defender, para raciocinar dessa forma. É uma defesa colocar tudo em gavetas. Eu sou um ator. Eu não trabalho nesse registro. Artisticamente falando, nem posso ser assim tão fechado para o mundo”.

Armando Babaioff e Nanda Costa como Ionan e Maura em “Segundo Sol”|| Créditos: Reprodução

Glamurama: Esse termo “cura gay” vai ser abordado em cena?
Armando Babaioff: “A gente vai gravar essa cena agora… Quando o pai da Maura descobre que ela esta vivendo isso com o Ionan, que houve esse cruzamento de percurso na trajetória dos dois, ele traz todo esse discurso da rua e da internet para a boca de um sujeito homofóbico e machista. Vamos falar sobre isso? Sim! Isso vai entrar na novela. Eu entendo. É uma ficção. E estamos vivendo numa sociedade na qual tudo é automático, instantâneo. Ninguém tem mais paciência. A história ainda está sendo desenvolvida! Já decretaram [a cura gay]. Não existe calma para se discutir… É uma novela, uma obra aberta. A gente tem que esperar um pouco. Dá vontade de falar: ‘Gente, calma, o fim da novela será esse.. Não aguento mais”.

Glamurama: E a Doralice fazendo esse mea culpa, hein? Mulher sente quando o caldo vai entornar?
Armando Babaioff: “Todo mundo sente quando o relacionamento não está bom e tem alguma coisa acontecendo…

Glamurama: Mas o Ionan, tão bonzinho, está traindo ela…
Armando Babaioff: “Lógico que é traição. Quem disse que o Ionan é bonzinho? Lógico que não é. Um personagem que mente ideologicamente, participa diretamente da falsidade ideológica do irmão, escondeu durante 20 anos, mesmo sendo um policial que prega a honestidade e todas essas coisas bem cartesianas e corretas… Quando tem a oportunidade de prender o Remy, que está traficando drogas, a pedido da mãe ele não faz… E fora outras coisas… Onde Ionan é uma alma boa? Ele está ali também, mundano, também perdido… Óbvio que ele tem um coração enorme, mas existem os desvios de caráter, que são pertinentes à nossa natureza. Que atire a primeira pedra quem não tem teto de vidro… Os personagens são tridimensionais. Não são retos, rasteiros. Tem múltiplas camadas. É uma novela muito refinada. Olha a Rosa [Leticia Colin], como dá voltas: em uma hora você ama, na outra odeia. Isso acontece com todos os personagens na novela. To-dos. É uma característica do João”.

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