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Mauricio de Sousa com seus personagens da Turma da Mônica || Crédito: Divulgação

“Sou a Mônica, sou a Mônica, dentucinha e sabichona”. A música de fundo enquanto aguardava na linha para entrevistar Mauricio de Sousa, em seu estúdio no bairro da Lapa, em São Paulo, já é um acesso direto às recordações de infância. É ele o grande responsável por uma geração de adultos que cresceu com as histórias mirabolantes do Cebolinha e do Cascão para destruir a Mônica no fictício bairro do Limoeiro, um lugar onde ainda se brincava de bolinha de gude e se andava de carrinho de rolimã. O criador da turminha mais simpática e de mais de 400 outros personagens – entre eles, todos os seus dez filhos – bateu um papo com a gente no dia de seu aniversário de 81 anos, para explicar a razão do sucesso de seu reinado. Ele ainda falou sobre seu processo de amadurecimento: “Anos atrás, quando alguma coisa não dava certo no estúdio, eu pegava o telefone e jogava na parede. Até que um dia me vi no espelho da sala jogando o telefone na parede. Achei aquilo tão pré-histórico que falei para mim mesmo que nunca mais iria fazer aquilo. Agora meus telefones continuam intactos”.

Por Denise Meira do Amaral

Glamurama – Como foi sua infância? Já li que seus pais eram poetas e você cresceu rodeado por livros.

Mauricio de Sousa- Por livros, poesias, música, rodas de samba, chorinho… Toda semana os amigos do papai iam em casa. Eles eram compositores, poetas, músicos. E eu acompanhei aquilo criança. Cresci num ambiente litero-musical. Minha casa era em Mogi das Cruzes [na Grande São Paulo], e lá tinha uma preocupação intelectual muito interessante. Todo mundo queria ser escritor, poeta, jornalista ou radialista. A cidade também permitia que as crianças brincassem na rua. Passei a infância livre e solto.

Glamurama – E o interesse pelos quadrinhos, como começou?

Mauricio de Sousa- Meu pai me dava gibi no tempo que nenhum outro dava. Aprendi a ler nos gibis. E pensei que um dia queria fazer gibis. Desde que iniciei a leitura, não parei mais. Quando era mais jovem lia um livro por dia. Lia gibis do Fantasma, Mandrake, Super-Homem, Batman e alguns do Disney. Depois comecei a fazer gibis feitos à mão e distribuía na minha classe. Meus amigos viravam os mocinhos na minha história e os não tão simpáticos a mim eram os vilões (risos). Depois fui para São Paulo, aos 17 anos. Comecei a procurar emprego e fui cair na redação da “Folha de S. Paulo” [na época, “Folha da Manhã”] como repórter policial, coisa que nunca tinha pensado. Foi uma aventura. Eu era investigativo, sempre queria mais. Ganhei vários prêmios de reportagem… Quase que a reportagem policial me roubou do desenho.

Glamurama – Como começou a desenhar no jornal? 

Mauricio de Sousa- Depois de algum tempo senti que a reportagem policial levada a sério era um pouco perigosa e comecei a desenhar. Fazia charges, tirinhas e criei meus primeiros personagens. Eles resolveram publicar e eu continuei lá mesmo. Em três ou quatro anos minhas tirinhas já atingiam mais de 400 jornais no Brasil. Foi uma coisa maluca, mas conseguimos divulgar os personagens. O Bidu foi o primeiro, depois vieram a Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali. Depois vieram as revistas. A primeira foi em 1970. Hoje em dia tenho o maior estúdio do gênero do Brasil, e talvez do mundo.

Mauricio de Sousa- A que se deve tamanho sucesso?

Mauricio de Sousa- Eu lia muito. Então, logicamente, quem lê bastante aprende técnicas de narrativa e assimila estilos. Fui influenciado pelos melhores escritores e com isso aprendi a entender o que o público gostava mais. Faz mais de 50 anos que faço isso, mantendo os personagens ativos e vivos. Claro que também tem técnicas que usamos, truques na hora de criar o desenho, a movimentação dos personagens. Sempre no estilo alegre-pop. São histórias bem humoradas, que passam boas mensagens. É muito difícil que uma criança pegue um material nosso e não siga lendo e gostando. Conquistamos na base da simpatia.

Glamurama – As histórias da Turma da Mônica são sempre politicamente corretas. Qual a preocupação de vocês em passar isso para as crianças?

Mauricio de Sousa- Tem uma frase que eu sempre falo para eles: “O que vocês estão fazendo no estúdio, desenhariam para entregar para seus filhos em casa? Se vocês têm dúvidas, não façam.”

Glamurama – Os desenhos já são todos feitos no computador hoje em dia?

Mauricio de Sousa- Os desenhos são feitos à mão e depois finalizados no computador.

Glamurama – O que você está lendo hoje em dia?

Mauricio de Sousa- Tenho lido menos do que gostaria. Leio as revistas semanais e gosto muito de livros de história do Brasil. O Laurentimo Gomes, com o “1822”, é um dos meus autores preferidos no momento.

Glamurama- Você teve dez filhos, quantos trabalham com você [Maurício Spada morreu aos 44 anos no meio deste ano]?

Mauricio de Sousa- Cinco trabalham aqui. A Mônica na área comercial, a Marina ajuda nos roteiros, a Valéria na área internacional, a Vanda no arquivamento de dados e o Mauro cuida dos espetáculos e shows. Maurício trabalhava na parte de computação. Mas também tenho sobrinhos e netos que trabalham comigo. A parte de games está com meu neto, por exemplo.

Mauricio com as filhas Mariângela, Mônica e Magali
Mauricio com as filhas Mariângela, Mônica e Magali || Crédito: Acervo Pessoal

Glamurama – Todos seus filhos viraram personagens?

Mauricio de Sousa – Sim. O Maurício era o doutor Spam, um vilão. Tinha a Mônica, Magali, a Mariângela era a Maria Cebolinha, a Vanda e a Valéria fizeram pontas. Tem a Marina, o Mauricio Takeda é o Do Contra, e o Mauro Takeda é o Nimbus. E o Marcelo Pereira já, já vai sair história dele.

Glamurama – Você tem mais carinho por algum dos personagens?

Mauricio de Sousa – Lógico que não (risos).

Glamurama – Depois da chegada dos 80, o que mudou?  

Mauricio de Sousa- Estou ficando cada vez mais calmo. Agora posso me chamar Mauricio Zen. Nada me tira do sério. Antes eu era “brabinho”, nervosinho. Anos atrás, quando alguma coisa não dava certo no estúdio, eu pegava o telefone e jogava na parede. Até que um dia me vi no espelho da sala jogando o telefone na parede. Achei aquilo tão pré-histórico que falei para mim mesmo que nunca mais iria fazer aquilo. Agora meus telefones continuam intactos.

Glamurama – As crianças hoje em dia passam bastante tempo na internet. Acha que o caminho é migrar também?

Mauricio de Sousa – Acho importante os gibis não saírem do papel, mas podemos fazer experimentações em diversas categorias. Nada é proibido.

Glamurama – Qual seu próximo projeto depois dos 80?

Mauricio de Sousa – Vem vindo filmes de longa metragem, da Turma da Mônica criança e da Turma jovem. Vai ser com crianças de verdade, de carne e osso, em live action. Vamos escolher crianças que se pareçam com os personagens. Vamos lançar ano que vem. Vai se chamar “Laços”, baseado em uma graphic novel nossa.

Glamurama – Quais seus sonhos ainda não realizados?

Mauricio de Sousa  – Acho que ainda dá tempo de fazer muita coisa. Quero ter livros em maior quantidade, filmes de longa metragem para exportação. Temos que entrar nos cinemas com bons filmes e entrar na educação formal das escolas.

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