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Ana Cañas | Crédito: Instagram

Depois do sucesso de uma live, Ana Cañas foi quase que obrigada a registrar sua interpretação das obras de Belchior, que morreu em 2017. Durante a pandemia, em que vários artistas ficaram vulneráveis, a cantora recebeu a ajuda dos fãs através de uma vaquinha online para entrar no estúdio e dar vida aos sucessos do compositor. O resultado? Um EP com quatro músicas, mas que chegará a 14 canções. Comentando ao Glamurama sobre o processo de criação do trabalho, a paulistana garante que as letras do cantor são mais atuais do que nunca. (por Baárbara Martinez)

Glamurama: Como foi o processo de criação do EP?
Ana Cañas: Estamos fazendo esse projeto lindo que saiu de uma live ano passado. Não tinha nenhuma pretensão de fazer um disco, foi uma loucura. O pessoal se prontificou a criar uma vaquinha (financiamento) para fazer o álbum porque eu não tinha condições de gravar um disco em um momento em que não estou trabalhando, mas eles me pediram muito, e aceitei. Achei que era um pedido, uma voz do universo que eu tinha que ouvir. Foram muitas pessoas que me escreveram pedindo, até fora do país, fiquei muito comovida com a repercussão. Gravamos o disco com essa vaquinha, foi lindo, e a primeira vez que me vi nesse lugar de tamanha vulnerabilidade financeira, emocional. A gente que é artista está tendo muitos desafios. Lançamos o “Coração Selvagem”, que foi o primeiro single, e agora o primeiro EP. Mês que vem tem o segundo EP, com outro clipe, participação de muitos artistas, vai ser muito legal. Por último, vamos deixar “Como Nossos Pais”.

G: Por que não lança mais músicas de uma só vez?
AC: Na verdade, a gente está lançando um disco inteiro em homenagem ao Belchior. Estamos fazendo um lançamento desmembrado por conta deste cenário pandêmico. As músicas são profundas, complexas. Acho que se eu lançasse um disco com 14 ‘porradas’ de uma vez, com todo mundo com essa mente fragmentada da internet, não iria dar certo. Considerei que esses blocos seriam interessantes para uma maior absorção das músicas. Não são músicas fofinhas, o Belchior é a síntese da transcendência, da reflexão, do questionamento.

G: Você acredita que esse é um momento especial para celebrar Belchior?
AC: É curioso que uma pessoa tenha escrito letras que estão completando quase 50 anos e soem tão atuais, tão contemporâneas, que falem sobre a nossa realidade, é muito louco isso. Por um lado, demonstra a genialidade dele, de observar esse alicerce do que nos faz humanos, ao mesmo tempo que tem uma constatação de tristeza porque percebemos que é um cenário que não se modifica, as décadas passam e a gente continua fazendo as mesmas coisas que não deveríamos fazer mais, desde um plano coletivo até o individual. Ele é esse observador da dicotomia humana. Como ele mesmo diz, não é um mensageiro só de coisas positivas.

G: Você convidou a Maria Casadevall para esse projeto. Como aconteceu?
AC: A Maria é uma lindeza, uma atriz talentosíssima, minha amiga. Foi curioso porque há uns três anos ela foi ao meu show e cantou comigo “Alucinação”. Foi uma surpresa, me aproximei dela. Após esse episódio, ela passou a frequentar meus shows e sempre cantava “Alucinação”. Quando percebemos que essa seria a música cabeça do EP, que ganharia o clipe, não tive dúvidas que teria que chama-lá para compartilhar esse devaneio visual, que acabamos fazendo inspirado no [Ingmar] Bergman, no filme “Persona”.

Ela é muito interessante, a Maria está em um caminho de questionamentos, mudanças, prioridades, está namorando uma mulher. São várias questões, acho que tinha que ser alguém com essa profundidade porque a música flerta muito com o social, ela olha para a miséria, para o caos social, para a complexidade das grandes cidades, e a Maria está muito imersa nessas questões todas. Eu achava que tinha que trazer essa vida real, mas tinha esse apontamento.

G: Qual a sua música favorita do EP? Tem alguma que ficou de fora e você se arrepende? 
AC: Olha, eu fiz uma pesquisa enorme antes de gravar o disco, antes mesmo de fazer a live ouvi toda discografia dele, li os livros, assisti diversas entrevistas. Quis fazer algo bem feito e mergulhar no universo dele. Escolhi as canções que mais gosto, o disco vai ter 14 [músicas], mas obviamente ele é um compositor que tem 30, 40 músicas no mínimo. “Mucuripe” é uma canção linda e ficou de fora, “Tudo Outra Vez” é outra. Vou garantir que tudo que eu quis gravar, eu gravei, inclusive “Como Nossos Pais”, que é um grande desafio. Fiquei insegura, afinal de contas… mas considerei. Minha versão é muito diferente da Elis, que amo, mas foi um processo de muito aprendizado.

G: Teria algum outro artista que você gostaria de celebrar com outro EP?
AC: Curioso você me perguntar isso porque o Belchior foi uma surpresa, mas como comecei como interprete nos bares aqui de São Paulo, onde cantei uns quatro, cinco anos na noite, sempre tinha músicas de outros compositores. Tenho uma admiração muito grande pelo Cazuza e Rita Lee. Acho que se fosse fazer outro projeto, homenageando outros compositores, seriam esses, do meu coração. Eu gravei um Som Brasil Cazuza, lá para 2009, 2008, tem no YouTube com milhões de views, é uma loucura!

Play para confrir o EP 1 do disco “Ana Cañas Canta Belchior”:

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