Nas últimas semanas, temos acompanhado cenas desesperadoras do Afeganistão, onde civis tentavam – desesperadamente – fugir do país devido à chegada do Talibã ao poder. Com a retirada das tropas americanas de lá, a organização terrorista fundamentalista viu a brecha perfeita para a retomada, instaurando uma tensão nacional e internacional ao sitiar a capital, Kabul. Nesta coluna, trarei a história do surgimento desse grupo fundamentalista Islâmico para entendermos melhor o que é o Talibã e seus vieses ideológicos.
Vamos voltar alguns anos… O surgimento do grupo foi precedido por um cenário de Guerra Fria. Durante a atuação da União Soviética no Afeganistão (entre 1979 e 1989), os Estados Unidos – juntamente com o serviço secreto do Paquistão – começaram a financiar e treinar milícias fundamentalistas (mujahidins) para combater os soldados soviéticos. Ali, o primeiro líder do Talibã Mohammed Omar foi treinado e armado. Entre 1988 e 1989, os remanescentes da União Soviética bateram em retirada do solo afegão, o que simbolizou uma vitória para o bloco capitalista. Porém, os vários grupos armados duelaram entre si, durante o governo de Mohammad Najibullah, que foi apoiado por algum tempo pela Rússia. Até que, em 1992, estourou uma guerra civil com conflitos intensos, aterrorizando a população.
O Talibã foi fundado por um grupo de estudantes em 1994. Inclusive, na tradução literal do pachto, o nome da orgnanização significa estudantes. Eles se dedicavam aos estudos dos textos sagrados com uma interpretação muito conversadora e extremista. Apontado como líder da organização, Mohammed Omar tinha objetivos bem definidos, como acabar com a corrupção e a criminalidade, além de estabelecer a Shariah (A Lei Islâmica). Os anos de atuação do Talibã no poder foram de 1996 a 2001, com uma tomada extremamente agressiva, começando pela capital Kabul. Naquele primeiro momento, perseguiram, espancaram e torturaram o ex-presidente Mohammad Najibullah. Ele foi morto a tiros e teve seu corpo pendurado em um poste (existem imagens do acontecimento, extremamente fortes).
Durante os anos que se seguiram, o país passou por uma censura gigantesca e ditatorial. Era proibido ouvir música ou assistir televisão e as mulheres não podiam nem trabalhar nem estudar. Houve um episódio em agosto de 1998 em que foram queimados 55 mil livros, coleção de uma bela biblioteca afegã, inúmeras estátuas de Buda e outras esculturas culturais, destruídas a tiros de tanques de guerra.
Em 2001, após o atentado do 11 de setembro às torres gêmeas, surgiu a notícia de que o Talibã estaria escondendo e acobertando Osama Bin Laden, líder da Al-Qaeda (responsável pelos atos). O governo afegão se recusou a entregar o líder terrorista, então os americanos começaram uma reação imediata com bombardeios, que levaria à derrubada do Talibã do governo – uma vitória contra o “Eixo do mal”. Desde 2004, o Talibã vem tentando se reorganizar. Seu primeiro líder, Mohammed Omar foi morto em 2013 e sucedido por Mohammad Mansour, que também morreu em uma investida dos Estados Unidos, em 2016. Mawlawi Hibatullah Akhundzada assumiu a liderança, então, e segue no poder até hoje.
Este ano, o presidente americano Joe Biden retirou suas tropas do Afeganistão, e o Talibã começou a avançar, dominando diversos territórios e cidades pelo país. Até que, em 15 de agosto, os fundamentalistas do Talibã começaram a tomar a capital Kabul. O até então presidente Ashraf Ghani fugiu do país e os fundamentalistas assumiram o poder. Por isso, milhares de cidadãos afegãos vêm tentando fugir de lá nesse momento. O prazo para a retirada total das tropas americanas e embaixadas do país era 31 de agosto, que não foi passível de negociação.
Qual cenário isso nos mostra? Um provável ataque direto aos direitos humanos dos cidadãos, uma instauração de uma teocracia fundamentalista. E, por mais que o governo do Talibã tenha dito que as mulheres poderão continuar a estudar e trabalhar, “estando de acordo com o sistema e o regime vigente”, é duvidoso acreditar na palavra de uma organização que atacou diretamente os próprios civis durante seu regime, perseguindo a liberdade e o acesso à informação naquele país.
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