Antes de o skate se tornar esporte olímpico e virar a sensação do momento, Karen Jonz quase não tinha sossego. Ainda que não tenha participado dos Jogos Olímpicos de Tóquio – sua especialidade, a modalidade vertical, não foi incluída na competição – e tenha se tornado, como comentarista da SporTV, uma das atrações mais comentadas, os desafios que Karen enfrentava anteriormente eram de outra ordem: convencer a quem quer que cruzasse o seu caminho que o esporte era a solução para todos os males. “A sensação que tenho andando de skate é grande demais para ser só minha e sempre quis que outras meninas compartilhassem”, conta a atleta, que é tetracampeã mundial e havia se tornado, segundo a própria, uma espécie de pregadora. “Se via uma amiga emburrada, já pensava que estava assim porque não andava de skate.”
Mas se a taxa de conversão, antes da Olímpiada, era baixa, agora a atleta comemora as pistas cheias e o fato de várias pessoas ao seu redor – da sobrinha a vizinhas – já recorreram a ela para pedir dicas do esporte. “A gente está em um momento tão grande para o skate feminino, a Rayssa [Leal, prata nos Jogos de Tóquio] foi campeã [em agosto, na Liga Mundial de Skate Street], mas isso não começou agora”, explica. “Se não tivesse as gerações anteriores, a Rayssa teria que brigar por tanta coisa que gastaria a metade da energia para conseguir existir.”
E quando Karen menciona toda essa energia, sabe exatamente o que diz. Antes de conseguir seu primeiro skate, comprado à custa de muitas vendas de bolo de banana na escola, a atleta havia pedido inúmeras vezes a seus pais para ganhar um de presente. Logo que começou a participar de competições locais não existia a categoria feminina e, quando ganhou o primeiro X Games, ela se preparou sozinha, sem treinador nem patrocínios. Para as mulheres, tampouco havia equivalência nas premiações e somente em 2006, depois de muita luta, o X Games igualou o valor do prêmio para ambos os gêneros. “Vivia arrumando briga para todo lado. Ia a um evento, queria participar, tentava convencer as pessoas”, lembra ela, que chegou a criar o site “Garotas no Comando” para divulgar as conquistas femininas.
Karen desistiu de tentar uma vaga na Olimpíada em uma modalidade que não era a sua – a park –, mas, durante dois anos, enfrentou as dificuldades de se preparar sozinha, arcando com os custos das viagens para participar de campeonatos. Além disso, tentava se adaptar aos desafios para conciliar a rotina de treinos com a da filha – Sky, 5 anos, do seu relacionamento com o músico Lucas Silveira. “Eu literalmente bati cabeça até ter certeza absoluta que não era pra ser”, conta. O que mais ela quer agora, em contrapartida, é retomar o sentimento de andar de skate por pura diversão. “Comecei a andar para me divertir, tinha uma coisa de liberdade, e depois me peguei entrando em uma que eu tinha que ser a melhor”, explica.
Por Layla Motta Por Layla Motta Por Layla Motta
Esse novo equilíbrio, no entanto, está longe de significar descanso. O sucesso como comentarista na Olímpiada, com expressões que se tornaram virais como “xerecou”, lotou a agenda da skatista de tal modo que há compromissos marcados com pelo menos um mês de antecedência. “Achei que esse hype fosse acabar junto com a Olímpiada, mas parece que não será só uma moda e sim um caminho mais lento e estruturado”, analisa. E essa visibilidade Karen quer utilizar para concretizar projetos. Além do lançamento de um disco autoral, planeja viabilizar um documentário sobre o skate feminino que, segundo ela, ainda é subestimado. “Se você procura material, quase não encontra. E essas histórias têm que ser contadas”, pontua.
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