O nome de André Carvalhal é uma constante quando o assunto é sustentabilidade, meio-ambiente e consumo consciente. O jornalista e publicitário carioca, com especialização em branding e sustentabilidade, hoje atua como palestrante e professor em algumas das principais faculdades do país, e ainda escreve colunas, produz conteúdo, dá consultoria e idealiza projetos para gigantes do mercado. Como se não fosse suficiente, Carvalhal tem quatro livros publicados – todos best-sellers!
Autor de “A Moda Imita a Vida”, “Moda com Propósito” e do finalista ao Prêmio Jabuti 2019 “Viva o Fim”, Carvalhal lançou, no ano passado, “Como Salvar o Futuro – Ações Para o Presente” (selo Paralela), onde compartilha reflexões sobre o que podemos fazer hoje para evitar um colapso amanhã.
“Nossas ações como indivíduo, em todas as esferas da vida, são o que fazem a diferença e comprometem ou ajudam a salvar o mundo”
André Carvalhal
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Em vez de trazer um passo a passo, seu livro propõe inúmeras reflexões que podem resultar em uma mudança de comportamento, ou não. Você realmente acredita no trabalho de formiguinha?
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Sim, super! Acho que durante muito tempo essa questão de ações individuais X ações coletivas colocaram as pessoas em um lugar de consumidor. É como se a gente sempre falasse que as mudanças individuais só pudessem se dar através do consumo. A própria pauta do consumo consciente e da sustentabilidade muitas vezes é baseada nisso. Mas, na verdade, a noção que precisamos ter é que as nossas ações como indivíduo, em todas as esferas da nossa vida, são o que fazem a diferença e comprometem ou ajudam a salvar o mundo. Isso significa que dentro da nossa casa, na nossa família, no nosso trabalho, exercendo nosso direito de voto, de cidadão, em todos esses momentos temos a chance de trazer mais consciência e fazer escolhas melhores que vão impactar outras pessoas e ajudar a causar grandes transformações.
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Qual era a expectativa para “Como Salvar o Futuro”? Ele dialoga com seus livros anteriores?
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Foi muito curioso o processo porque se trata do meu quarto livro e vem depois de “Viva o Fim”, que é o que mais gosto. Nele, eu falava que estamos vivendo o fim desse mundo, de todas as coisas e instituições que conhecemos, dizia que precisamos reconstruir e criar um novo mundo mais urgente e necessário. Trouxe uma série de casos, referências, exemplos, movimentos e pessoas que já estavam agindo e funcionando de uma forma diferente, mas ficou uma vontade de trazer isso para o leitor, sugerir reflexões do que ele poderia fazer. E foi desse desejo que nasceu “Como Salvar o Futuro”.
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Você se considera um otimista sobre o futuro?
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É difícil falar de otimismo diante de tudo que estamos vivendo. Não dá para entrar em um lugar de positividade extrema, negando toda a realidade e o que está acontecendo, mas acho que é importante termos esperança e acredito muito em um conceito que fala sobre esperança ativa. Diferente do otimismo ou daquela esperança passiva, que acredita que as coisas vão melhorar, que tudo vai dar certo, na ativa, nós, movidos pela esperança, agimos em direção aquele mundo que acreditamos, esperamos e sonhamos. Em direção ao mundo onde a gente gostaria de viver. Então, ao invés de dizer que sou um otimista, talvez eu diria que sou um esperançoso ativo.
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Quando o assunto é mudança de hábitos, a sensação é de que ainda temos muito a fazer. Por onde começar?
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De fato, porque é como se a gente tivesse vivido durante muito tempo desconectados daquilo que é essencial, da natureza, da preocupação com o meio-ambiente e da preocupação com os outros. É como se muitas coisas no mundo nos levassem para um lugar de individualidade, concorrência, competição e sobrevivência – cada um dentro da sua realidade, claro. E os processos inconscientes vêm muitas vezes da falta de consideração com o próximo, com os recursos e com a natureza. Então, é realmente muito difícil. É quase um processo de desconstrução, como se a gente tivesse que desaprender muitas das coisas que passamos a vida inteira aprendendo. Por onde começar? Depende muito de cada pessoa. Cada um tem uma história e cada um está em um momento diferente de vida. Mas, talvez, uma coisa importante seria despertar para a necessidade de se ver como um ser coletivo, entender que dependemos de outras pessoas e do planeta. Compreender que a gente também é o planeta. Acho que isso pode ajudar a mudar a nossa lente. E aí, a partir dessa noção, tem pessoas que vão mudar suas relações, sua alimentação, a forma de se vestir… Cada novo hábito puxa um outro, uma atitude vai estimulando outra.
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Estamos caminhando, ainda que a passos lentos, para a volta da “normalidade”. O que esperar desse futuro desconhecido que se aproxima? Como se preparar para a volta da coletividade?
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Acho que a volta à “normalidade” vai ser bem desafiadora. Em “Viva o Fim”, eu trazia essa provocação de que nós estávamos vivendo muito desconectados da realidade e das necessidades do mundo e acho que a pandemia escancarou isso e nos forçou a entender e tomar atitudes. Muitas pessoas entenderam, conseguiram e transformaram, outras muitas não, e acredito que essa volta vai ser um reflexo disso. E aí mais uma vez a importância de transformarmos nossas ações individuais em movimentos coletivos, expandindo cada vez mais para que possamos impactar e transformar outras pessoas, sistemas e instituições.
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Quais sequelas sociais a pandemia deixará?
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Já ouvi vários terapeutas, analistas, psicanalistas falando que a pandemia vai deixar sequelas parecidas com as de um efeito pós-traumático. Para muitas pessoas foi realmente um trauma gigante. Teve gente que perdeu emprego, familiares, dinheiro… Mas também não podemos negar que muitas pessoas não tiveram suas vidas afetadas, tiveram aqueles que ganharam dinheiro na pandemia, muitos negócios cresceram e prosperaram. Então, acredito que as sequelas vão ser diferentes para cada um e vai ter muito a ver com a pandemia que cada pessoa viveu e a partir dali a chance de algumas coisas terem se transformado. Por exemplo, vejo pessoas falando que o ano de 2020 nunca deveria ter existido, pessoas querendo riscar o ano de suas vidas. Para mim, ao contrário, foi o ano que talvez eu tenha mais aprendido e me transformado de todos os anos anteriores da minha história. Então, provavelmente quando a pandemia passar, vou ter dado um salto muito grande em diversas áreas da minha vida, mas não posso achar que vai ser assim com todo mundo, né?
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O que aprendeu nesse período de isolamento que vai levar para sempre? E o que pretende esquecer?
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Aprendi que não existe “todo mundo”. A gente gosta muito de usar essa expressão e fazer generalizações, e ficou cada vez mais claro para mim que vivemos realidades, jornadas e experiências diferentes. Isso me fez entender melhor as pessoas e mudou minha relação com muita gente. Foi um grande aprendizado entender que as pessoas têm momentos e tempos diferentes. Posso não concordar e não compactuar com uma série de coisas, mas hoje é mais fácil entender quais são os gatilhos de cada pessoa. Esquecer? Não tenho vontade de esquecer, não. Acho que tudo de ruim que a gente está passando também é aprendizado e muitas dessas coisas nos ajudam a ser mais críticos. Tudo é superimportante e muito necessário.
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