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Karl Lagerfeld || Créditos: Getty Images

Pouco mais de quatro meses atrás, celebridades prestavam homenagens ao legado de Karl Lagerfeld no Met Gala em Nova York. Enquanto isso, em um cenário completamente diferente, a herança estimada em €200 milhões (R$ 1 bilhão) deixada pelo falecido estilista alemão encontrava-se em um purgatório fiscal em Paris. Em vez de celebrar, seus oito herdeiros, incluindo o modelo Baptiste Giabiconi e a tutora de sua gata Choupette Lagerfeld, mordiam as unhas de pura ansiedade. Eles aguardavam um veredito sobre os cerca de €20 milhões (R$ 104 milhões) em dívidas fiscais que Lagerfeld acumulou durante a vida, o que ele parece ter feito simplesmente por birra, já que dinheiro nunca lhe faltou.

No dia 21 de abril, alguns dias antes do evento, o tribunal administrativo de apelação de Paris lançou um golpe devastador. O pedido para aliviar as pesadas multas impostas pelas autoridades fiscais francesas foi negado, mantendo o patrimônio de Lagerfeld em um estado de incerteza. Este cenário não era estranho para Lagerfeld, que, antes de sua morte, já havia tomado medidas para contestar as ações fiscais contra ele. Assessorado por especialistas fiscais, ele buscava um alívio que nunca chegou.

O problema maior é que, quanto mais se investigam as nuances dos milhões amealhados pelo diretor-criativo da Chanel entre 1983 até sua morte, mais complicações vêm à tona. Uma das mais intrigantes até agora tornou o imbróglio tão dramático quanto confuso. Isso devido a um documento de 1999 anotado por Dominique Strauss-Kahn, então Ministro da Economia e Finanças francês. O polêmico político delineou certos acordos fiscais que, aparentemente, favoreceram Lagerfeld na época já tentando resolver a situação. Mas, como não tinham base legal, acabaram sendo questionados pela justiça francesa, em 2013, e derrubados.

Além disso, a estrutura do grupo econômico formado pelas empresas de Lagerfeld, que morreu em 2019, formada por sedes ora na Irlanda, ora em Luxemburgo ou na Suíça – todos esses países praticamente versões europeias das Ilhas Cayman, assim como o estado de Delaware, nos Estados Unidos, e as Ilhas Virgens Britânicas -, aponta para uma disputa que não deve acabar tão cedo.

Essa teia complexa de questões fiscais e legais atingiu um novo pico quando o tribunal administrativo de apelação de Paris emitiu sua decisão. Agora, os herdeiros podem enfrentar a possibilidade de vender ativos para saldar as dívidas, diluindo a herança que cada um receberá. No meio de celebrações e homenagens ao legado de Lagerfeld, essa batalha pela sua herança ilumina uma faceta menos glamourosa, mas profundamente humana de sua vida. Um aspecto que, muito provavelmente, continuará sendo uma narrativa paralela, ao lado de seu brilhantismo no mundo da moda.

Mais recentemente, as residências e escritórios de Lagerfeld foram vasculhados, e em meio a isso foram descobertas supostas transações incompletas e investimentos offshore não declarados. Isso resultou em um pedido pela manutenção do bloqueio dos bens que ele deixou, tornando ainda mais desfavorável a vida de seus herdeiros. Embora eles possam ainda recorrer dessa decisão, as perspectivas não são nada animadoras. O desfecho mais provável, por enquanto, é a venda de ativos para saldar as dívidas fiscais, o que deverá causar a diluição da herança de cada um dos oito beneficiários. Some-se a isso os honorários dos advogados que os defendem, e a possibilidade de que esses €200 milhões (R$ 1 bilhão) sejam reduzidos a algo até mesmo inferior ao montante devido ao leão francês começa a se formar claramente no horizonte.

Há quem diga, inclusive, que essa visão estará totalmente nítida antes do fim do ano, com possíveis revelações ainda mais sérias. Enquanto isso, o mundo da moda continua a reverenciar Lagerfeld como uma espécie de realeza, esse complexo embate fiscal nos tribunais europeus pode muito bem ser o último, e indubitavelmente o mais enigmático, capítulo da obra de sua vida.

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