Hesitantes em seguir o caminho de Gilberto Gil, filho e netos se dedicaram a outras áreas profissionais, como administração de empresa e cinema, antes de lançarem o trio Gilsons
por Pedro Alexandre Sanches
Soou familiar quando uma voz masculina contida começou a se espalhar por aí cantando os versos cândidos de fossa “várias queixas/ várias queixas de você/ por que fez isso comigo?/ estamos junto e misturado/ meu bem, quero ser seu namorado”. Era familiar mesmo, em primeiro lugar porque trata-se de uma versão introspectiva de um samba-reggae lançado pelo Olodum em 2012. Mas um motivo a mais para a familiaridade é que o trio carioca Gilsons, que regravou “Várias Queixas”, carrega no DNA a hereditariedade musical brasileira: todos são descendentes do tropicalista baiano Gilberto Gil.
Com 30 anos, João, o mais velho dos três, é filho da primogênita de Gil, Nara, que tem atuado historicamente como backing vocal do pai. José, de 29 anos, é filho de Gil e Flora. Francisco, de 26 anos, é outro neto de Gil, filho da também cantora Preta Gil, que foi quem sugeriu aos Gilsons o nome que faz trocadilho com “filhos de Gil” em inglês. O videoclipe de “Várias Queixas”, lançado no fim de 2019, tem mais de 7 milhões de visualizações no YouTube. Outra música, a autoral “Love Love”, nitidamente aparentada do “Samurai” (1982) de Djavan, bateu mais de 5 milhões de acessos no canal.
A chegada do trio formado em 2018 a um sucesso relativamente rápido oculta que os três hesitaram antes de se entregar à música. José Gil, a exemplo do pai nos anos 1960, foi primeiro administrador de empresas. João Gil chegou a estudar design. Francisco trabalhou no cinema antes de se assumir como cantor, simultaneamente em versões solo, em duo com Chico Chico (filho de Cássia Eller) e em trio. “A gente tem um contato que vem de casa, de família, mas tivemos vivências bem distintas para chegar a um ponto de imersão na música”, explica Francisco. “É bonito ver que, na verdade, a gente se conectou [com a música] junto. A gente tinha uma banda e se fortaleceu muito nessa caminhada”, completa, referindo-se à banda Sinara, que os três integraram em meados da década passada. No Gilsons, todos se alternam como compositores.
“A gente ficava muito junto nas férias na Bahia. Eram carnavais e férias de verão muito frutíferas”, detalha José Gil. João relembra esse tempo: “Por termos o privilégio de sermos filhos e netos de músicos, a gente sempre teve instrumento disponível em casa, bateria, guitarra, violão. E a gente, criança, olhava aquilo como uma forma de estar fazendo zoeira como é jogar bola, andar de skate. Cresci ouvindo meus tios Bem e Bela fazendo aula de violão”. Bem Gil, ex-geógrafo, toca com o pai, e Bela Gil fugiu à regra optando pela área gastronômica.
Diferentemente dos outros dois, José diz não ter ainda completa certeza de que seu destino seja a música. Mas foi o êxito de “Várias Queixas” que alavancou a consolidação do trio, que agora começa a pensar em um primeiro álbum cheio. A ligação com a MPB histórica é inescapável, embora os três gostem de chamar o som que fazem de “ijexá-balada”. Uma história de João, colecionador de vinis herdados dos avós, ilustra o vínculo não apenas no DNA: “Tenho o primeiro disco do Caetano com a Gal com uma super dedicatória do Caetano para minha avó [Belina, primeira mulher de Gil], tipo ‘você sabe que eu sempre fui tímido para mostrar minhas músicas, mas espero que você goste. Imagina Caetano Veloso escrevendo isso’”. José acaba de se tornar pai de gêmeas bivitelinas, o que amplia mais um pouco a linhagem iniciada em Ituaçu, na Bahia, onde cresceu Gilberto Gil.
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