Lázaro Ramos está radiante como diretor e não é para menos. ‘Medida Provisória’, filme de estreia no posto e que chega ao Brasil no segundo semestre de 2021, acaba de desembarcar na Noruega, com sucesso de crítica nos Estados Unidos e considerado como o “melhor filme brasileiro desde a ‘Cidade de Deus'” no festival Pan African Film.
Como já contamos aqui no Glamurama, o longa, que tem elenco de peso com nomes como Alfred Enoch, Taís Araujo, Seu Jorge, Adriana Esteves e Renata Sorrah, é uma ficção que passa no Brasil do futuro, em que uma medida de reparação social afeta diretamente a vida de uma família, composta pelo jovem casal formado pela médica Capitú (Taís Araújo) e pelo advogado Antonio – (Alfred Enoch), além do primo, o jornalista André (Seu Jorge), que mora de favor na casa da dupla. Certo dia, uma medida de reparação financeira pelos tempos de escravidão no Brasil é proposta e respondida com outra medida: a de que todos os negros (chamados no filme de “melaninas acentuadas”) voltem para a África. Com esta decisão, o casal acaba se separando sem saber se poderão se reencontrar.
A felicidade de Lázaro com o feedback positivo pôde ser notada até mesmo no nosso papo leve e divertido em que o ator fala sobre a repercussão internacional: “Muitas do que tem no filme achei que só seriam compreendidas pela audiência brasileira”, conta o artista que ainda relata como como é estrear na pandemia: “Nos adaptamos para o filme chegar o mais longe o possível”.
O lado de diretor aflorou várias ideias para Lázaro que espera tirar em breve do papel, além de uma produção baseada em um livro nacional, que ainda está guardada a sete chaves. Tem mais sobre Lázaro na frente e atrás das câmeras na entrevista abaixo. (por Luzara Pinho)
Glamurama: Como tem se sentido com a repercussão internacional do filme?
Lázaro: Para falar bem a verdade está sendo um susto! Ano passado foi muito frustrante ter que cancelar o lançamento do filme. Quando a pandemia chegou e o primeiro festival que íamos participar foi cancelado, confesso que fiquei desanimado. Os festivais não tinham se organizado e esse ano foi totalmente diferente, pois conseguiram criar divulgação adequada, muita gente assistiu e já estamos com 22 críticas. Muitas das referências do filme eu achei que só seriam compreendidas pela audiência brasileira. Mesmo com atores de projeção internacional achei que o filme teria um impacto mais forte no Brasil. Em meio a tudo que está acontecendo é uma grata surpresa e estou tentando lidar.
Glamurama: Com tanta repercussão, prêmios, críticas positivas de ‘Medida Provisória’, o Oscar vem?
Lázaro: O que me deixa feliz é que quando começamos a planejar esse filme, em 2012, a gente sempre quis que as pessoas se emocionassem com ele e estamos vendo isso com os jornalistas e críticos. As pessoas estão envolvidas com a história, emocionadas. Isso para mim já é um prêmio gigantesco: conseguir fazer um filme que mistura gêneros, comédia, thriller e drama, que já é algo que pode dar errado porque o público sempre assiste ‘empacotado’ com um gênero só, e esse mistura os três.
Glamurama: O filme chega no Brasil no segundo semestre deste ano. Como é estrear em plena pandemia? Vocês criaram alguma estratégia diferente?
Lázaro: Ano passado foi de muita frustração porque não sabíamos o que fazer. Agora estamos nos organizando para esperar minimamente a vacina e conseguir ir para o cinema, por outro lado também estamos preparando para exibir no streaming e queremos tentar reproduzir as experiências que o filme oferece nos critérios da pandemia com debates, além de um ‘making-off’ especial que criamos para redes sociais. Nos adaptamos para o filme chegar o mais longe o possível.
Glamurama: Qual a mensagem que mais gosta em ‘Medida Provisória’?
Lázaro: Uma coisa que me deixa muito feliz com o filme é que ele não deixa ninguém para baixo no final. É uma injeção de ânimo, fala sobre questões dolorosas mas tem esse ponto de vista que gosto de colocar em tudo que faço. Se você vê minhas redes sociais, meu livro, minhas peças, é tudo para as pessoas se sentirem possíveis. O tema do filme é difícil e doloroso, mas no final das contas a mensagem que eu quero deixar é que as pessoas têm potência, sem deixar de discutir as questões necessárias.
Glamurama: O que pode adiantar do filme?
Lázaro: Estou muito contente de ter reunido essa equipe e esse elenco que é muito difícil. Só com o Alfred Enoch passamos um ano para negociar uma data, o Seu Jorge tem uma agenda de shows grandes, Taís com todos os seus trabalhos…além desses atores todos, a gente conseguiu um elenco com 77 atores e também a estreia de Emicida como ator de cinema, Renata Sorrah e Adriana Esteves na mesma produção, o que é um privilégio para mim como diretor ter a confiança dessas atrizes. Temos um núcleo especial que a princípio seria de figurantes, mas a gente entendeu que ali era um lugar importante para ter atores de teatro, cinema e televisão que estão naquele núcleo são a grande potência desse filme, é a reunião desses artistas para contar essa história.
Glamurama: Já tem novos projetos como diretor ou ator?
Lázaro: Tem sim, foi basicamente o que eu fiz em 2020 quando a pandemia se estabeleceu e a gente conseguiu organizar minimamente a cabeça: criar projetos. Tenho escrito desde então coisas e espero um dia conseguir filmá-las.
Glamurama: Do outro lado das câmeras, no cinema você também está em ‘Papai é Pop’ em que você vive um pai de primeira viagem. Qual aspecto do Lázaro usou para construir o personagem?
Lázaro: O livro do Piangers que deu origem ao filme já nos conduz para o melhor jeito de contar essa história. Eu, há muitos anos, tinha vontade de fazer um filme sobre paternidade e mais especificamente uma comédia. Fiquei muito feliz quando Caíto Ortiz me convidou para fazer e o longa tem a ver comigo, com a minha vida. Tem uma fase que é uma realidade de todas as minhas dúvidas de quando meu primeiro filho nasceu. Todas essas descobertas estão ali. Esse personagem tem uma característica que é muito comum dos papéis que gosto de fazer. Esses homens que têm momentos da vida infantilizados, como Foguinho, o Mister Brau, o meu personagem em ‘Papai é Pop’ é primo desses personagens (risos), fiquei muito feliz de ter contado essa história.
Glamurama: Além disso, outro projeto de sucesso foi ‘Falas Negras’, na Globo. Considera um marco na TV brasileira? Existe a chance de uma segunda parte do programa?
Lázaro: Eu acho que é um marco sim e falo isso sem timidez porque é um trabalho que é fruto de um coletivo. Eu estava ali na direção, a Manuela (Dias) no roteiro selecionando os textos, mas é fruto de um trabalho daqueles atores todos, alguns deles estreando na televisão, alguns trabalharam outras vezes mas não tiveram oportunidade de ter personagens daquela qualidade. Um projeto doloroso, mas foi abraçado pelo público e espero que sejam feitas outras versões.
Glamurama: Qual o caminho para aumentar a diversidade de forma real no entretenimento/cultura brasileira?
Lázaro: São várias situações, mas acho que vai da consciência de cada profissional. Uma coisa é inegável, temos uma qualidade de profissionais para essas histórias e a gente tem muitas delas que ainda não foram contadas. Quem diria, por exemplo, que ‘Falas Negras’ teria essa repercussão? Só foi possível descobrir porque foi feito. Acho que o mercado ganha muito, precisamos de novas histórias, nos entreter, quanto mais o tempo passa, mais streamings aparecem… tem muito lugar precisando de conteúdo e esse é um tipo que o público quer e gosta.
Glamurama: Tem alguma história do povo negro que gostaria de contar?
Lázaro: Tem sim, mas é projeto secreto! Posso dizer uma coisa, é um livro brasileiro de relativo sucesso que estou tentando comprar os direitos autorais.
Glamurama: Esses dias você fez um post no Instagram para ‘chamar a atenção’ do Will Smith. Esse post teve mesmo esse intuito ou já está rolando algum contato entre vocês?
Lázaro: De três em três meses eu falo com o Will Smith na internet, até ele me notar, quero virar ‘brother’ dele (risos). Essa não é a primeira que eu faço não, de vez em quando eu entro na página dele, converso, até agora ele não respondeu, mas sigo na investida.
Glamurama: Qual produção gostaria de fazer com ele? Ele é seu ídolo?
Lázaro: O Will Smith tem algumas características que eu admiro muito que é essa coisa de ele ser empreendedor, fazer um drama sobre Muhammad Ali , outro baseado na biografia de um cara que ficou pobre, criava o filho sozinho e ao mesmo tempo ele faz filme de super-herói. Ele e a mulher criam uma parceria de produção que é muito interessante. Gosto do discurso dele, como se comunica. É um cara que tenho uma identificação real, é um pouco o jeito que gosto de exercer a minha profissão também, não me limitando a fazer um gênero de trabalho.
Glamurama: Assim que a pandemia acabar, o que pretende fazer?
Lázaro: Espero poder lançar os filmes que estão guardados, ‘DPA 3’ que sou o bruxo Elergun, ‘Silêncio da Chuva’, do Daniel Filho, ‘As Verdades’, de José Eduardo Belmonte. 2020 era o ano da minha reaproximação com o cinema depois de um tempo sem lançar filmes. Essas produções estão aí, foram feitas com muito amor e carinho e espero poder lançá-las. Por enquanto, nenhum plano para TV.