Parece até história de filme de Hollywood, e não é de se duvidar que algum dia ainda renda um: na semana passada, nada menos que 25 quadros assinados por Jean-Michel Basquiat foram exibidos para um grupo de VIPs que marcou presença no Museu de Arte de Orlando, que fica na cidade da Flórida que lhe dá nome, antes de serem expostos ao público em uma exposição organizada pela instituição e intitulada “Heroes & Monsters: Jean-Michel Basquiat, The Thaddeus Mumford, Jr. Venice Collection”, que abriu nessa sexta-feira e vai até o dia 30 de junho. Mas o que realmente se tornou intrigante foi o fato de que essas obras foram produzidas por Basquiat quando ele tinha 22 anos e morava de favor na casa do galerista Larry Gagosian, em Venice, na Califórnia. Todos foram pintados na residência na qual o artista morto em 1988, aos 27 anos, ocupava o porão com seu estúdio e lar.
Antes de se tornar a lenda eterna que virou, Basquiat vendeu os tais quadros para Thad Mumford, um roteirista de televisão indicado a quatro Emmys e vencedor de um (pela série educacional para crianças “The Electric Company”, que ficou no ar entre 1971 e 1977), por US$ 5 mil (R$ 25,7 mil), ou cerca de US$ 14 mil (R$ 71,8 mil) em valores atualizados pela inflação. E sem o conhecimento de Gagosian, que possivelmente o teria impedido de concretizar o negócio.
Mumford, que morreu em 2018, aos 67 anos, os manteve durante quase três décadas em um espaço alugado em um galpão de Los Angeles, até que em 2012 ele deixou de pagar o aluguel e teve os pertences que mantinha lá revelados. Além dos Basquiats, havia itens raros ligados às atrações de TV nas quais trabalhou e memorabilia de baseball.
William Force, um americano especializado em encontrar tesouros perdidos, e seu parceiro Lee Mangin ficaram sabendo da história e também que Mumford, que vivia naquela época um momento financeiro complicado, decidiu vender tudo que guardava desde o começo dos anos 1980 em um leilão no qual a dupla fez questão de marcar presença. Force e Mangin, no entanto, fizeram lances apenas pelos Basquiats, que foram arrematados em lote por eles pela soma de meros US$ 15 mil (R$ 77 mil).
Daí pra frente, Force e Mangin procuraram vários especialistas para averiguar se seus 25 Basquiats eram legítimos, e ouviram um “sim” de praticamente todos (há ainda um ou outro conhecedor de artes que questiona a legitimidade dessas raridades, mas nenhum que as tenha dado como falsas com certeza). O próximo passo foi orquestrar uma exposição para exibi-los ao público, o que conseguiram com o pessoal do Museu de Arte de Orlando.
Agora que se tornarão mais conhecidos, os Basquiats de Force e Mangin também se tornarão mais caros – e isso de acordo com os valores pagos em leilões nos últimos anos por trabalhos de Basquiat, como a tela “Untitled”, leiloada em 2017 por US$ 110,5 milhões (R$ 567,1 milhões) para um bilionário japonês. O próximo passo pode ser a venda de todos ou alguns desses Basquiats no martelo, e tanto a Sotheby’s quanto a Christie’s – as duas maiores casas de leilões do mundo – já mantiveram contato com Force e Mangin para oferecer aos dois seus serviços. E olha que ainda existem espalhados por aí pelo menos 2,1 mil trabalhos de Basquiat, alguns dos quais valendo milhões de dólares, e que, para a tragédia de seus donos e também de todos nós, talvez jamais voltarão a ver a luz do dia.
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