Totalmente contrário à intromissão do estado na vida das pessoas e ao mesmo tempo bastante próximo do ditador nacionalista António de Oliveira Salazar, que comandou Portugal com mão de ferro entre 1932 e 1968, Fernando Pessoa morreu há exatos 87 anos completados nessa quarta-feira (30), em Lisboa, a mesma cidade em que nasceu.
Sobrevivente de algumas das mais mortíferas doenças de sua época, com as epidemias de gripe e a tuberculose, o poeta que é considerado um dos mais importantes, mais intrigantes, mais provocadores e, acima de tudo, um dos mais misteriosos do século 20 não resistiu às complicações de uma pancreatite aguda e morreu aos 47 anos.
Pessoa se foi, mas sua vasta obra, da qual inúmeros trabalhos são assinados por seus heterônimos (ou personalidades) como Ricardo Reis, Álvaro de Campos e Alberto Caeiro o mantém “vivíssimo”, e seu nome é até hoje sinônimo de poesia.
“Tudo vale a pena quando a alma não é pequena”, “Tenho em mim todos os sonhos do mundo” e “Pra viajar basta existir” são, para muita gente, ditados populares, quando na verdade tais frases são de autoria dele – que não escrevia em português, como costumava frisar sempre.
Até hoje estudado tanto pelo legado literário que deixou quanto pela pessoa, de certa forma, complexa que foi, Pessoa é lembrado como o criador de algumas das mais belas e tocantes combinações de palavras da língua portuguesa, mas também já foi chamado de fascista, apesar de ter sido um dos fundadores e maiores entusiastas do modernismo português.
Quando o assunto era religião, o autor de “Tabacaria”, que também era astrólogo, se declarava adepto do gnosticismo cristão, uma sopa de dogmas, simbolismos da Bíblia e gnósticos da salvação que a Igreja Católica durante um tempo considerou como a mais séria heresia a ameaçar seu poderio.
Fazendo um exercício hipotético, dá até pra dizer que Pessoa, em 2022, seria uma forte candidato a um “cancelamento”. Causar escândalos e chocar eram seus esportes favoritos, junto com a discussão de ideias futuristas e modernistas sobre as quais escrevia para as revistas “A Águia” e “Orpheu”. E entre seus pares, que concordavam ou não com as opiniões daquele que dominou como ninguém a técnica do metapoema, ou seja, desdobrar a temática de poema dentro dela mesma e de suas engrenagens, Pessoa, em sua multiplicidade de estilos, era rei e pronto.
Essa foi, afirmam biógrafos do gênio, sua capacidade mais destacada: de jamais perder uma rima milimetricamente pensada no sentido metafórico de manter sempre tudo em ordem mesmo em meio ao caos e, assim, jamais permitir que suas poesias, sobretudo, revelassem mais do que o necessário.
- Neste artigo:
- Fernando Pessoa,
- literatura,
- poesia,