De acordo com estudo publicado em janeiro na revista Nature, a bactéria C. acnes, principal microrganismo envolvido no quadro da acne, foi modificada geneticamente para liberar proteína capaz de reduzir a produção de sebo na pele.
Destacamos alguns pontos importantes:
- Atualmente, o tratamento de casos severos de acne é realizado por meio de medicamentos como isotretinoína e antibióticos, que possuem efeitos colaterais importantes.
- A bactéria C. acnes modificada geneticamente surge como alternativa promissora e segura por ser capaz de produzir proteína também liberada pela isotretinoína, que controla a oleosidade da pele.
- A estratégia utilizada pelos pesquisadores para editar a C. acnes, antes considerada uma bactéria intratável, pode ser replicada no futuro para tratar outras doenças, como a dermatite atópica.
Apesar da acne figurar entre as doenças cutâneas mais comuns, seu tratamento ainda representa um grande desafio, especialmente em casos mais severos da condição. “Para casos graves de acne, que não responderam bem a outras medidas, é comum a prescrição de antibióticos, que atacam as bactérias causadoras da doença, ou a isotretinoína, um derivado da vitamina A que reduz a glândula sebácea a fim de inibir a produção de sebo. O problema é que, além de ambas as opções causarem fotossensibilidade, os antibióticos alteram a microbiota da pele por não atuarem seletivamente, enquanto a isotretinoína pode causar ressecamento importante com descamação da pele e afetar o bom funcionamento de órgãos como o fígado e rins”, explica a dermatologista Dra. Paola Pomerantzeff, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia. A boa notícia é que, agora, pesquisadores desenvolveram um tratamento inovador para a doença que utiliza uma versão modificada da própria Cutibacterium acnes (C. acnes) ou Propionibacterium acnes (P. acnes), a principal bactéria envolvida na acne. A descoberta foi publicada em janeiro na revista científica Nature.
No estudo, os pesquisadores alteraram o genoma da C. acnes para que a bactéria passasse a produzir uma proteína chamada de NGAL, que induz a morte dos sebócitos e, consequentemente, reduz a produção de sebo, um mecanismo importante envolvido no quadro de acne. “A C. acnes é uma bactéria naturalmente encontrada na microbiota na pele que consome a oleosidade produzida pelas glândulas sebáceas. Logo, quando há uma produção exacerbada desse sebo, ocorre uma multiplicação dessas bactérias, levando a um desequilíbrio dessa microbiota com consequente surgimento da inflamação e das espinhas características do quadro acneico”, diz a dermatologista, que explica que a isotretinoína também aumenta os níveis de NGAL na pele. “Então, esse novo tratamento, com a bactéria da acne modificada, atuaria de maneira semelhante ao medicamento, controlando a produção de sebo ao reduzir as glândulas sebáceas.”
Em testes com camundongos, essa bactéria, quando aplicada na pele, foi capaz de se fixar, se multiplicar e produzir a proteína envolvida na melhora do quadro. “Mas é importante destacar que a pele dos camundongos possui diferenças importantes em comparação aos humanos: tem mais pelos, menos lipídios e um mecanismo de sudorese distinto”, destaca a Dra. Paola. Então, os pesquisadores dizem que agora precisam testar o tratamento de outras maneiras, como em modelos de pele 3D. No entanto, estão otimistas quanto ao uso em humanos no futuro, principalmente pelo fato de a bactéria ter sido modificada de forma a manter sua segurança.
Além de apresentar um tratamento promissor para casos de acne, o estudo também se destaca por ter conseguido alterar o genoma da C. acnes, que, até então, era considerada uma bactéria intratável, o que quer dizer que era difícil introduzir DNA em seu genoma para fazer com que proteínas fossem produzidas. “Os pesquisadores foram capazes de utilizar uma bactéria encontrada naturalmente na pele de forma que produzisse o que era necessário para o tratamento da acne. Mas as descobertas apresentadas no estudo podem ter implicações importantes para uma série de alterações cutâneas e outras doenças ao possibilitar a edição genética de bactérias antes consideradas não tratáveis”, destaca a Dra. Paola. Agora, por exemplo, os pesquisadores, além de continuarem os testes focados no tratamento da acne, também seguirão a mesma estratégia para editar a C. acnes de forma que possa ser usada no tratamento da dermatite atópica, que, segundo a dermatologista, é uma doença crônica e inflamatória caracterizada pelo surgimento de vermelhidão, coceira e descamação na pele.
Atualmente, a Dra. Paola Pomerantzeff explica que, para controle de acne moderada à severa, o tratamento tópico mais recente com comprovação científica, das cicatrizes atópicas e boa tolerância pelos pacientes é a associação de adapaleno com peróxido de benzoíla. “Essa associação é encontrada em alguns géis de venda livre em farmácia, mas a orientação do dermatologista é fundamental. No caso dos medicamentos orais, o tratamento para casos severos continua sendo o uso da isotretinoína”, diz a médica, que afirma que uma rotina diária de cuidados com produtos específicos para a pele acneica também é indispensável para controle do quadro. “Além disso, a alimentação e os hábitos de vida também influenciam na acne. Por isso, é importante evitar dieta rica em alimentos com alto índice glicêmico e laticínios, tabagismo e exposição excessiva aos raios solares”, finaliza.
FONTE: DRA. PAOLA POMERANTZEFF – Dermatologista, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) e da Sociedade Brasileira de Cirurgia Dermatológica (SBCD), tem mais de 10 anos de atuação em Dermatologia Clínica. Graduada em Medicina pela Faculdade de Medicina Santo Amaro, a médica é especialista em Dermatologia pela Associação Médica Brasileira e pela Sociedade Brasileira de Dermatologia, e participa periodicamente de Congressos, Jornadas e Simpósios nacionais e internacionais. Instagram: @drapaoladermatologista
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