O Masp, em parceria com o Museu Lenbachhaus, da Alemanha, faz o seminário “Histórias da Ecologia”, nos dias 09 e 10 de novembro, com participação de teóricos, curadores, artistas, ativistas e pesquisadores de áreas diversas, antecipando a programação da entidade sobre o tema que será dedicado durante o ano de 2025.
Os encontros serão transmitidos por meio do perfil do MASP no YouTube, com tradução simultânea para Libras, português, inglês e alemão. Para receber o certificado de participação, é necessário realizar um cadastro por meio de um link que será fornecido durante o seminário. Os certificados serão enviados ao e-mail cadastrado dos participantes inscritos que assistirem aos dois dias de evento.
Confira a programação:
09.11.2022
11H – INTRODUÇÃO
Adriano Pedrosa, diretor artístico, MASP
Matthias Mühling, diretor, Lenbachhaus
11H10—13H
NEGO BISPO
As fronteiras entre o saber orgânico e o saber sintético
Orientado pela oralidade e pelos conhecimentos tradicionais, Nego Bispo apresentará algumas das concepções que estruturam a sua epistemologia, e que buscam oferecer outras formas de compreender o mundo que nos cerca.
Antônio Bispo dos Santos é escritor, mestre quilombola e lavrador, formado por mestras e mestres de ofícios e morador do Quilombo do Saco-Curtume (São João do Piauí).
RACHEL O’REILLY
O cinema contra a imagem antroecológica
Serão abordados temas em torno da produção cinematográfica a partir da revisão do olhar cúmplice de uma repetição ecogeográfica racial, que teve um papel de profundo impacto no estabelecimento do modelo humano/natureza da razão iluminista e da linha divisória mundial de cor do trabalho. Também serão colocadas reflexões, no contexto das recorrentes crises do capitalismo, como o colapso climático e ecológico, acerca da experiência indígena de envolvimento com a agricultura e o extrativismo de colonização que reconfigurou a planetaridade, para criar uma legibilidade além e dentro da cinepolítica materialista existente.
Rachel O’Reilly é uma artista/escritora/curadora e doutoranda no Goldsmiths Centre for Research Architecture. Ela é fellow de Ecologia no Sandberg Institute.
STEVE KURTZ
Estética, necropolítica e luta ambiental
Nesta apresentação, Kurtz irá expor preocupações sobre a pobreza da linguagem em relação ao ativismo ambiental, que tende a enfocar a biopolítica, sob a perspectiva de uma estética romântica, ao mesmo tempo em que ignora a necropolítica (a organização da morte). Embora seja fácil construir um consenso em torno da ideia de que a causa primária da acelerada degradação ambiental (uma expressão estetizada em si mesma) são as atividades humanas — ou, mais simplesmente, os próprios humanos —, desenvolver uma ideia do que fazer a respeito do “problema humano” é muito mais difícil — exatamente porque não há linguagem para se falar desse problema de uma forma que não soe totalmente monstruosa. Qualquer tentativa de solucionar essa contradição exigirá o reconhecimento explícito de sua dimensão necropolítica maciça, seguido pela determinação de uma política estratégica que aborde o dilema necropolítico. A seguinte pergunta deve ser feita: os seres humanos são capazes de realizar tal tarefa?
Steve Kurtz é professor emérito e membro fundador do Critical Art Ensemble.
Mediação: Stephanie Weber, curadora, Lenbachhaus
14H30—16H30
BRIGITTE BAPTISTE
Transecologia
Desde que o termo começou a ser usado, no final do século 19, há várias formas de entender a ecologia. O uso da ecologia como um recurso heurístico produziu um campo muito rico de abordagens interpretativas, não apenas na área da biologia, mas para negócios e empresas, instituições, leis e em muitos outros domínios afins. A ecologia também ajudou a compreensão do papel da diversidade na evolução e na inovação — esse é o motivo por trás da luta cultural para considerar sexo, gênero e estratégias de cuidado como recursos-chave para a adaptação e, afinal, para a construção da sustentabilidade. A mudança transformadora, uma importante expressão que passou a ser usada nos estudos ambientais e sociais, está se tornando parte de um vocabulário compartilhado com os estudos transgêneros e as ecologias queer — talvez esse seja um resultado surpreendente da crescente conscientização dos seres humanos como formadores do mundo, um papel no qual também pode ser necessário aceitar novas identidades e modos de ser.
Brigitte Baptiste é bióloga pela Pontifícia Universidade Javeriana (Bogotá) e mestre em Preservação e Desenvolvimento Tropical pela Universidade da Flórida. Atualmente é reitora da Universidade Ean.
JAIME VINDEL
A nação estética fóssil: imaginários industriais, colonialismo americano e modernidade espanhola
Esta apresentação complementará a narrativa de Andreas Malm, para quem há uma relação direta entre as novas formas de exploração do trabalho nas fábricas e indústrias e a crescente concentração atmosférica de gás carbônico (CO2), que desencadeia a dinâmica que causa as mudanças climáticas na atualidade. Destaco a importância que os imaginários fósseis da modernidade industrial tiveram nesse processo: na minha perspectiva, a cultura fóssil é, nesse sentido, inseparável da economia fóssil. Isso será feito a partir do contexto espanhol, com o objetivo de destacar como esses imaginários são compreensíveis apenas no longo prazo da modernidade colonial, bem como em relação às próprias tensões sociais que ocorreram na história da Espanha nos territórios americanos e peninsulares. Para isso, tomo como tema de discussão o projeto de um monumento a Colombo, criado pelo engenheiro basco Alberto Palacio para a Exposição Universal de Chicago, realizada em 1893, que refletia em imagens a ideia de uma “nação fóssil estética”.
Pesquisador de pós-doutorado do Programa de Bolsas Ramón y Cajal (2018), do Instituto de História do Conselho Superior de Pesquisa Científica da Espanha. É autor de Estética fósil: Imaginarios de la energía y crisis ecosocial (Arcadia, 2020), entre outros livros.
TXAI SURUÍ
Nós somos a floresta
Os povos indígenas acreditam fazer parte da floresta. “Nós somos a floresta” é uma frase que Suruí escutou de indígenas de diferentes etnias, inclusive a dela própria. A cosmologia e o modo de vida das comunidades indígenas fizeram com que estas fossem consideradas as melhores guardiãs da floresta, principalmente porque fogem da lógica capitalista e olham para a floresta não apenas como um cifrão. Meio ambiente e povos originários são temas ligados e o olhar dessas comunidades é cada vez mais importante para contornar a crise climática e humanitária que o mundo vem vivendo. No entanto, na história da ecologia e do meio ambiente nem sempre foi assim. Como valorizar o conhecimento ancestral para salvar o futuro? Como ouvir a floresta?
Ativista do povo Paiter Suruí, fundadora e coordenadora do movimento da Juventude Indígena de Rondônia, acadêmica de Direito e colunista da Folha de S. Paulo.
Mediação: Daniela Rodrigues, assistente curatorial, MASP
10.11.2022
11H—13H
VANDANA SHIVA
Democracia da Terra: proteger o nosso futuro comum em tempos de extinção
Segundo Shiva, o mundo enfrenta a humanidade enfrentamos uma crise existencial. Os povos indígenas foram desenraizados, deslocados e exterminados ao longo de 500 anos de colonialismo. A colonização de terras e povos transformou a Mãe Terra, a Terra Viva, em Terra Nullius, a terra vazia, matéria-prima inerte e propriedade privada. Essa transformação e essa colonização continuam, ameaçando extinguir diversas espécies e de diversas culturas. A humanidade não está separada da Terra – ela é um fio na teia da vida, membro de uma Família Terrestre. A Democracia da Terra tem como fundamento Economias Vivas, Democracias Vivas e Culturas Vivas, todas tecidas na teia da vida por meio de sua diversidade. Cada forma de vida apoia e sustenta todas as outras, em uma relação de mutualidade, cooperação e harmonia. A sociedade e a economia devem refletir isso. Na Democracia da Terra, a economia é um subconjunto da ecologia, que tem como base as leis da Mãe Terra. A Democracia da Terra cria o potencial para uma interconexão mais profunda entre humanos e os outros seres. Ela permite que se reconheça que, em um planeta interconectado, a emergência da extinção é uma extinção indivisível. Proteger outras culturas e outras espécies significa proteger o futuro comum.
Vandana Shiva é física e cursou doutorado na University of Western Ontario, no Canadá. Fundadora da Research Foundation for Science, Technology and Ecology e criadora do Navdanya.
FILIPA RAMOS
A noite americana de Ana Vaz
Na instalação É noite na América, Ana Vaz acompanha alguns animais do Jardim Zoológico de Brasília com a sua câmera de filmar. Olhando para eles como indivíduos, únicos em si mesmos, a artista revela as suas histórias de cativeiro e resgate e partilha as suas vidas fascinantes e terríveis. Esta obra, ao mesmo tempo celebração e memento mori da vida selvagem do cerrado, será o ponto de partida para uma série de linhas de análise sobre o potencial da criação artística e cinematográfica na partilha e na criação de narrativas sobre o passado, o presente e sobretudo o futuro do nosso mundo em transformação.
Filipa Ramos é doutora, escritora e curadora. É diretora do Departamento de Arte Contemporânea da Cidade do Porto.
CHICO MANDIRA
Quilombo e Reserva Extrativista do Mandira, exemplo de sustentabilidade
Chico Mandira falará da formação de sua comunidade, situada entre o Vale do Ribeira e o litoral sul paulista, e de como conseguiram se adaptar às circunstâncias de uma política ambiental restritiva e inovar por meio dos trabalhos com o extrativismo e o manejo de ostra na formação de uma reserva extrativista. A atuação de Chico e dos mandiranos vem garantindo renda, preservando o meio ambiente e tornando sua comunidade reconhecida nacional e internacionalmente por aliar o social, o racial, o econômico e o ambiental.
Chico Mandira é líder do Quilombo do Mandira, localizado em Cananéia, São Paulo. Foi premiado na Conferência Mundial das Nações Unidas sobre Sustentabilidade, a Rio+10, em Johannesburgo.
Mediação: David Ribeiro, assistente curatorial, MASP
14H30—16H30
STEFANIE HESSLER
Erótica ecológica da água
Foi nadando nas águas gregas, ao longo da costa de Milos, que, pela primeira vez, Hessler considerou sua própria relação com o oceano como algo erótico. Foi Anne Carson, poeta e especialista na Era Clássica, quem a ajudou a encontrar palavras para expressar seu sentimento de desejo corporal e psíquico pelo oceano. Carson descreve Eros como uma questão de limites: Eros faz com que se queira dissolver os limites entre o eu e o outro e, ao mesmo tempo, depende dessas divisões. Nesta fala, pensando juntamente com ecofeministas queer e decoloniais, Hessler questiona se a crise ambiental atual e suas interseções sociais estão impregnadas pela erotofobia — pelo medo de se querer estar perto da natureza, de reconhecer que o humano é parte da natureza. Por meio do trabalho das artistas Katerina Teaiwa, Anne Duk Hee Jordan e outras, em cuja prática a interseção de natureza, sexualidade e gênero é cada vez mais colocada em evidência, será proposta uma erótica ecológica.
Stefanie Hessler é curadora, escritora e editora, e seu trabalho enfoca as ecologias e suas várias interseções sociais. É diretora do Swiss Institute, instituição internacional sem fins lucrativos, em Nova York.
GABRIEL MANTELLI
Histórias das temperaturas: descolonizar o clima é aquecer a justiça?
Uma história única da ecologia é temerária porque não alcança as múltiplas relações do humano construídas com o não humano em nosso planeta. Mais recentemente, em tempos de “modernidade” e “ciência”, a aliança do colonialismo com o sistema capitalista tornou difícil a tarefa de “recontar” a história do binômio cultura/natureza como também, em termos substanciais, a própria sustentação física, biológica e artificial do que convencionamos chamar de “vida”. Parece não haver espaço para adiar o fim do mundo. Em um mundo onde as mudanças climáticas imperam nas negociações globais, moldam os empreendimentos e abrem espaços discursivos para o “bem” e para o “mal”, temáticas como justiça climática, colonialismo do carbono e racismo ambiental estressam nossos campos de visão, impondo abismos na própria definição do que sejam “Direito” e “Justiça”. As propostas de descolonização, no âmbito dessas questões, traçam caminhos virtuosos, deslocam epistemologias e, ao mesmo tempo, servem de greenwashing refinado, dentro e fora de um olhar antropológico dos direitos. No argumento da fala, está a urgência, em um mundo em emergência climática, de descentralizar as “temperaturas” e encarar, de forma crítica, o fenômeno da descolonização do “aquecimento”.
Advogado de direitos humanos e socioambientais e professor de direito em São Paulo. É assessor da Conectas Direitos Humanos e doutorando em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Universidade de São Paulo.
JUDY CHICAGO
Antes que seja tarde
Nesta fala, será traçado o desenvolvimento das preocupações ambientais e ecológicas no trabalho da artista, que remontam à década de 1960. Serão apresentadas imagens de toda a sua carreira que tratam de questões que envolvem meio ambiente, ecologia, justiça climática e direitos dos animais.
Judy Chicago é artista e autora de quinze livros. Sua carreira já dura quase seis décadas, período no qual ela produziu um prodigioso conjunto de obras que foi exibido em todo o mundo.
Mediação: Isabella Rjeille, curadora, MASP