Após grande sucesso na pele de Sophia em “O Outro Lado do Paraíso”, mulher empoderada, rica e cheia de sex appeal, Marieta Severo se prepara para mostrar ao público uma mulher que vem na contramão da malvada personagem. O próximo trabalho da atriz – em fase de produção – será ‘Noites de Alface’, em que as gravações acontecem na Ilha de Paquetá, no Rio de Janeiro. Estrelado por ela e Everaldo Pontes, o filme é inspirado no romance de mesmo nome da escritora Vanessa Bárbara que mostra a solidão de Otto (Everaldo Pontes) após a morte de sua esposa, Ada (Marieta Severo). Para entender essa linda história de amor entre dois velhos, Glamurama conversou com a atriz que entregou detalhes do longa (ainda sem data de estreia), falou abertamente sobre a velhice, a marginalização da classe artística, lei Rouanet e seus planos para 2019. Vem ler! (por Paula Barros)
Glamurama – Por que “Noites de Alface”? Qual mensagem a produção quer passar para o público?
Marieta – “O nome é por causa de um chá de alface que o protagonista [Everaldo Pontes] toma. Ele tem insônia e minha personagem, que é mulher dele, prepara esse chá para tentar lidar com o problema do sono. Apesar de ser pouco provável que o alface tenha esse poder todo é uma mensagem que simboliza a vida desse casal. É um casal sem filhos, já velhos e que passaram uma vida boa e feliz cuidando um do outro. É um pouco lírico e o filme aborda tudo isso com muita leveza, um clima muito interessante que se faz jogar com a fantasia e a imaginação. Com as ilusões dele, no final do filme não dá saber o que realmente aconteceu e o que é mentira e ilusão da cabeça.”
Glamurama – E você tomou esse chá de verdade?
Marieta – “No tomei o chá. Tomava chá preto. Não quero relaxar, estou sempre a procura da cafeína (risos).”
Glamurama – O que mais te fascinou no filme?
Marieta – “É um filme que dá margem a uma linguagem cinematográfica muito especial e isso determina o que o filme vai ser. Tenho vontade de contar essa história para o mundo. Como uma vida a dois, vai passar a ser vivida solitariamente. Ela era o Sol da vida dele. E é tudo sobre as pequenas coisas, são duas vidas normais, sem grandes acontecimentos, mas que se bastam.”
Glamurama – O que o longa te trouxe de novo como artista e mulher?
Marieta – “A maneira de falar com a velhice e com a morte é uma maneira leve, lírica, poética, doce e que tem humor sobre esse casal que viveu a vida toda junto. Gostei muito desse envolvimento dos assuntos. Qualquer personagem que um ator faz é escolhido porque nos leva para caminhos inusitados e essa é a mola propulsora. Quero um papel quando me traz conhecimento.”
Glamurama – Você se separou de Chico Buarque depois de mais de 30 anos casados. Apesar da situação ser diferente da trama, a falta de um companheiro no dia a dia também foi difícil para você? Como superou esse momento?
Marieta – “É uma situação diferente porque a única coisa que é definitiva na vida é a morte. No meu caso foi uma escolha, então é completamente ao contrário. A morte você não escolhe, ninguém escolhe uma viuvez, não ouve nenhum livre arbítrio. É uma situação bem mais difícil, na qual temos que nos deparar com o definitivo, sem argumentos.”
Glamurama – Aos 72 anos, o que mais te assusta na velhice?
Marieta – “Não só a mim, mas a todo mundo que eu converso, o grande pânico é perder o domínio das suas faculdades mentais. Apesar deste medo, não foco muito no problema. Eu trabalho tanto que já é uma boa fórmula de escape dessa situação. Tenho uma gerência da minha vida e da minha família, sou extremamente ativa, vou vivendo a vida que inventei.”
Glamurama – Qual o pior julgamento que as pessoas fazem dos velhos?
Marieta – “Acho que é colocar a velhice fora do ciclo da vida. Isso é o mais cruel. É uma época como qualquer outra da vida. Perder essa mão de obra física e intelectual da pessoa mais velha é uma bobagem e um desperdício. Existe muita sabedoria na velhice.”
Glamurama – Acredita que o mundo avançou para diminuir o preconceito contra os idosos?
Marieta – “Sim. Existe muito mais atenção, cuidados e atividades para a terceira idade, mas mesmo assim talvez ainda não seja o suficiente.”
Glamurama – Quais os projetos profissionais para 2019?
Marieta – Vou rodar um filme em março, dirigido pelo Vicente Amorim. E estou realmente muito feliz com essa fase. Acabei a novela e é o quarto filme que eu emendo direto neste período. Está sendo muito bom, gosto quando isso acontece. Cinema é um clima diferente e mudar de cenário realimenta a gente. Ir para outro veículo com outras exigências profissionais é perfeito para a profissão. Depois que o ator sai de uma novela ele está com uma intimidade muito forte com a câmera. É necessário reativar o frio na barriga.
Glamurama – Você e a Fernanda Montenegro – principalmente – se posicionaram no Faustão sobre a marginalização da classe artística. Acredita que isso vai passar? Como acabar com essa imagem equivocada?Marieta – “Como vai passar? Isso é algo que está sendo plantado, tem um pensamento atrás disso. Nunca aconteceu nos meus 50 anos de carreira. Acho que a própria imprensa tem colocado muitas matérias esclarecendo, por exemplo, a lei Rouanet. É mais fácil para o público acreditar no que falam, do que ler e se informar. Se colocar como artista, se coloca quem quer. Eu não cobro de jeito nenhum que alguém se posicione. Senti necessidade de falar porque eu sofro muito com isso. Essa sensação de injustiça me deixa doente e daí comecei a falar. A Fernanda, por exemplo, falou e foi agredida de uma forma cruel. Não sei que lado é esse do ser humano.”
Glamurama – Quais as suas expectativas para o Brasil no próximo ano?
Marieta – “Quando eu penso no Brasil que eu quero para 2019, quero que não exista um terreno que estimule essa crueldade. Ter a voz oficial do país estimulando a violência, a fake news, a censura, é um terreno para isso se desenvolver cada vez mais. Queria uma lugar para a gente se desenvolver e extrair o melhor do ser humano principalmente porque hoje tudo o que é falado corresponde a muitos ataques depois.”
Glamurama – Lei Rouanet, sim ou não? Por quê?
Marieta – “É sim como sempre foi e como todas as leis tem que ser aperfeiçoadas. 90% vai para os pequenos projetos, atende grandes musicais, pequenas fundações, mas tem que ser reavaliada porque a realidade vai impondo novas circunstâncias. Não sou a favor que tenha um lucro enorme, é preciso estabelecer um critério, mas não detonar. Dizer ‘mamando na lei’ o que é isso? Vamos nos informar. Vários governos já tentaram aperfeiçoa-la e corrigir, fazer novos alcances da cultura. Mas muita gente foca no que não sabe com intenções que eu gostaria de entender os motivos.”
Glamurama – Você não ter redes sociais é um reflexo dessa situação?
Marieta – “Me sinto muito de dentro [do mundo], sem ter uma rede social. Não sinto necessidade. Às vezes, as minhas filhas me mandam algo selecionado, mas não tenho essa vontade. No meu tempo livre, gosto de me ocupar culturalmente, vendo algo interessante na televisão, ficando com minhas netas, não sei o que é tédio e ter algum tempo sem fazer nada. Falo que se na minha infância existisse essa classificação de hiperatividade e outras doenças teriam me dado remédios. Sempre fui a mil por hora, tenho muita energia. Só me chateia que na velhice o corpo não aguente tanto. Mas faço ginástica pra isso. Sempre me perguntam ‘o que eu faço pra ficar assim’ e minha dica de vida é ‘faça ginástica’.”
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