As boas maneiras não representam mais um código de conduta próprio de membros da monarquia europeia e suas perucas cintilantes. A tal etiqueta que antes ditava expressões, gestos, vestimentas, entre outros aspectos do bem representar de famílias e países, sofreu mutações, como é natural das expressões humanas. O avanço no campo das liberdades individuais e o fenômeno do estilo “hi-lo”, por exemplo, chocaria qualquer um no início do século 20. O que diriam os trabalhadores do mercado financeiro daqueles tempos ao ver um homem trajando terno e tênis hoje? Este século 21 está sendo palco de uma reinvenção do dress code tradicional, até mesmo na esfera dos negócios, desde quem trabalha em startups até nas profissões mais tradicionais como a medicina – nada de paletó e sapato: entrou em cena jaleco com crocs. Outro exemplo: a história do homem abrir a porta do carro para a mulher e pagar a conta do jantar é old school. O que se via como cavalheirismo, agora tem a ala que afirma que é puro machismo, uma maneira de afirmar “que a mulher é mais fraca”. A questão ganha contornos ainda mais complexos com a internet e no avanço diário da conectividade. A vida real e virtual parecem se misturar e estão divididas por uma zona cinzenta com limites de difícil percepção. Sem referência, as boas maneiras surgem do bom senso e não de blogueiros e youtubers teens. Afinal, todo mundo acha que sabe se comportar. Mas será que sabe mesmo?
SOCIAL
Eventos e grandes encontros são pratos cheios para escorregadas homéricas. Do lado do hóspede, não se deve chegar de mãos vazias mesmo em uma festividade simples. Se houver alguma restrição alimentícia, como vegetarianismo ou veganismo, não custa avisar o anfitrião para ele se prevenir, pois criar expectativa pode ser frustrante. Sempre cumprimente todos e na dúvida de optar por um beijo ou aperto de mão, estique o braço. No caso de uma refeição, espere todos os presentes para começar a comer e deixe que os idosos se sirvam primeiro. Se, por algum motivo, o convidado se ver impossibilitado de frequentar alguma celebração em que havia confirmado presença, ligue e peça desculpas – ninguém é obrigado a esperar em vão. Também não leve embora nada sem pedir – roubar amenities é mais que falta de educação, ok? Da parte dos anfitriões, não cobre os seus convidados e não se sinta ofendido se alguém não pôde estar presente. Durante encontros, o celular deve permanecer guardado, seja na bolsa, no bolso ou em qualquer outro recipiente. Quando conversar, olhe nos olhos das pessoas, não corte uma história alheia para mostrar crônicas de vida mais interessantes. Se interesse pelos outros e deixe o narcisismo na rua – se quiser conviver com sua arrogância fique em casa, o mundo agradece. Não saque o celular no meio de um papo, nem interrompa um interlocutor por seu interesse no “stories” de outras pessoas, na mensagem de sua amiga ou qualquer outra notificação da tela do seu celular. Aliás, nem deixe em cima da mesa o aparelho. Jamais interrompa a música que está tocando em uma festa e só conecte o seu Spotify se essa for a vontade do anfitrião. Se não foi possível mudar o som, apenas aceite, jamais fale mal do que se ouve. É melhor desistir daquele encontro, voltar ao lar e ouvir exatamente o que se quer – a sós ou acompanhado.
CELULAR
O celular é um dispositivo ótimo no que tange a sociabilidade, mas a conectividade tem alto potencial de impulsionar o mau comportamento. No cinema e no teatro ele deve ser desligado e lembre-se que utilizá-lo em silencioso também pode incomodar e é extremamente egoísta. No caso de um chefe, evite acionar seu funcionário fora do horário comercial: todos têm direito ao descanso e se você busca um trabalho evite mandar mensagens no fim de semana. Se for adicionado em um grupo no qual deseja sair, o faça à francesa e evite chatear alguém. A troca de mensagens intergeracionais deve ser evitada e se realizada: com muito cuidado. Há um abismo comportamental no modo de usar essas ferramentas entre nativos digitais e gerações mais experientes. Se o jardim de uma pessoa for lindo, pode tirar fotos e postar sem problemas, porém o interior da casa deve ser respeitado, peça permissão. O mesmo se aplica se for um bebê, um pet pode ser postado nas redes, mas em hipótese alguma um ser humano sem a permissão da mãe pode ser clicado. Inviolável é o vestido da noiva — jamais poste em suas redes antes do casamento e nem mande em grupos do WhatsApp. Se recebeu um convite, não é uma boa ideia postá-lo a não ser que se queira o desconvite.
POR FIM
Existem muitas possíveis situações além das citadas aqui: no avião, por exemplo, pergunte a quem senta atrás de vocês antes de reclinar a cadeira. Sempre que possível dê seu assento a idosos, grávidas e afins. Na rua, seja como motorista, ciclista ou usuário de patinetes: pare na faixa de pedestres. As boas maneiras já não integram uma cartilha rigorosa de monarquistas sobre o ordenamento e o manuseio de talheres. A imposição saiu de moda e a boa educação é contrária à intolerância. É importante lembrar que a própria etiqueta é sobre tratar as pessoas com consideração e respeito e lembre-se de se perguntar: “É o que eu gostaria que fizessem comigo?”. A resposta pode apresentar um caminho interessante. O que vale, no fim das contas, é sempre o bom senso.
SIGA AS REGRAS NA…
REDE 1. Não forme grupos para organizar uma festa: o mistério faz parte do seu show. 2. Se quiser sair de um grupo, saia à francesa. 3. Quando encontrar algum amigo de redes sociais na vida real, cumprimente. 4. Cada um tem o direito de fazer seu próprio anúncio de noivado.
PAQUERA 1. Fotos com mais de três anos são “fake news”. 2. Termine o relacionamento por mais efêmero que ele seja: não suma. 3. Pode perguntar o signo, mas desenhar mapa astral é forçar a barra.
FESTAS 1. Durante a refeição guarde o celular. 2. Não troque a música do evento sem permissão. 3. Não chegue de mãos vazias. 4. Avise sobre restrições alimentares, mas não espere nada.