Se em “Pantanal” Maria Bruaca vem lidando com a dificuldade de sair da relação abusiva com Tenório (Murilo Benício), após descobrir que o marido tem até uma segunda família, na vida real, a intérprete Isabel Teixeira ficou mais próxima do pai e do irmão, os cantores e músicos Renato e Chico Teixeira, após a novela.
A atriz de 48 anos foi criada pela mãe em São Paulo, enquanto o pai fazia sucesso na música. “Eu fui criada pela minha mãe, claro que pelo meu pai também, mas não existia a popularização da guarda compartilhada na década de 70”, conta Isabel em conversa exclusiva com o GLMRM. “Minha mãe era atriz de teatro em São Paulo, eu vivia nas coxias e comecei a fazer teatro por causa dela, enquanto a realidade do meu pai era a música. Eu não fui pra música e o Chico trilhou o caminho dele, era natural.”
Com canções suas na trama, Renato Teixeira fez uma participação em “Pantanal” como Quim, peão interpretado pelo filho Chico Teixeira na primeira fase da trama. Pai e filhos não chegaram a contracenar, mas Isabel conta que o encontro nos bastidores reuniu a família.
“A novela nos uniu. Não éramos uma família tradicional, eu nunca convivi com eles. O trabalho fez a gente perceber que como família ainda temos muito que viver juntos.”
Com uma carreira consolidada no teatro, a atriz caiu nas graças do público em seu segundo papel em novelas – antes, viveu a médica Jane em “Amor de Mãe” –, mas acredita que chegou à televisão no momento certo. “Sou uma mulher de teatro, nunca fui atrás da televisão, e acho que tudo tem sua hora e vez. Se eu tivesse começado antes, talvez eu não tivesse fazendo essa personagem, e acho que a Maria Bruaca eu teria que fazer”, pondera.
Mãe de dois filhos, Flora, de 11 anos, e Diego, de 18, Isabel também defende a filha na ficção, Guta, papel de Julia Dalavia, que foi chamada de feminista de ocasião pelos fãs da novela nas redes por se indignar com a situação da mãe, mas não revelar as traições do pai, nem ajudar nas tarefas de casa. No papo a seguir, a atriz conta ainda o que tem aprendido com Bruaca e por que a virada da personagem, tão esperada pelo público, não vai ser tão rápida.
GLMRM: Com uma carreira intensa no teatro, dirigindo e atuando, você também brilhou na participação da novela “Amor de Mãe”, mesmo num papel menor. Foi ele que te levou ao elenco de “Pantanal”?
Isabel Teixeira: Sim, foi uma conjuntura, uma coisa levando a outra. Começou com “Desalma”, série do Carlos Manga Junior, e logo em seguida o José Luiz Villamarim, diretor de “Amor de Mãe”, me chamou para a participação. Foi muito legal porque eu sou uma iniciante nesse tipo de ofício, tenho 38 anos de carreira no teatro e o audiovisual pra mim é uma coisa muito nova. Estou começando nessa técnica, começou em 2019 e não parou mais. Estou adorando!
GLMRM: A sua personagem está sendo um dos maiores destaques da novela, principalmente pela mudança de postura. Antes submissa, meio alívio cômico da trama, agora ela transmite força e ousadia em uma situação que infelizmente atravessa muitas mulheres. Qual foi o seu processo de construção? Você chegou a ver a da Angela Leal ou quis adaptar a sua Bruaca pros dias atuais?
Isabel Teixeira: O meu norte sempre foi o texto. Ao contrário de “Amor de Mãe”, que é uma obra aberta, daquelas que vai sendo escrita e sendo gravada, em “Pantanal” já sabemos o que vai acontecer com a personagem. Eu considero que a Maria Bruaca já é um clássico no papel, que também foi escrita pelo Benedito Ruy Barbosa e pela Ângela Leal, e eu e o Bruno Luperi, escritor da nova versão, reconstruímos ela de alguma forma. Costumo dizer que é uma escrita coletiva, não só o papel, mas no figurino, composição visual, todo mundo escreve junto. Para eu compor isso, tem essa abertura para o outro, escuta e compreensão ao que veio antes. Sobre a personagem, há uma identificação não só das mulheres, mas de homens. Eu percebo uma vontade da mudança, e isso requer movimento. Tem um aprendizado que eu acho que é de todo mundo (meu pessoal, inclusive) que essa “virada de chave” não é de uma hora para outra.
GLMRM: Os telespectadores esperam que a grande reviravolta da personagem seja embalando um romance com Alcides, se vingando do Tenório. Falando em autoconhecimento e empoderamento feminino, o que você espera que a Maria Bruaca inspire nas mulheres?
Isabel Teixeira: Que a gente não precisa de ninguém que venha de fora para mudar a gente. Não é o Alcides que vai salvar ela como o príncipe tirou a Branca de Neve do sono profundo. A princesa é outra agora. Não é ele que vai tirar ela dessa situação, pois também está passando por transformações. Ela não vai mudar de uma hora pra outra, é um aprendizado para mudar, e isso requer um autoconhecimento. Aprender pela queda requer tempo e perdão. Ela vai passar por isso. Vai errar muito, vai se debater um pouco até se acalmar e achar um centro.
“Não é o Alcides que vai salvar ela como o príncipe tirou a Branca de Neve do sono profundo. A princesa é outra agora.”
GLMRM: O que você acha das críticas de alguns espectadores a Guta, sua filha na trama, que tem um discurso feminista, mas não contou à mãe da segunda família do pai?
Isabel Teixeira: A personagem da Guta é linda, pois ela vem pra tirar a mãe daquilo, mesmo sendo difícil para ela. A Guta é um ritual de passagem e amadurecimento para a mulher que ela vai ser. Quando você vê de fora um relacionamento abusivo, principalmente de um homem com uma mulher, você pensa “como ela é idiota por não sair disso”, e às vezes é muito difícil sair, é um processo lento. Eu me reconheço nessa relação que é um aprendizado de mão dupla. A Guta também está em transformação, todos os personagens estão.
GLMRM: As gravações da novela têm um valor simbólico pra você com as participações do seu pai, Renato Teixeira, e irmão, Chico, na primeira fase. Como foi essa experiência em família? Vocês chegaram a trocar dicas?
Isabel Teixeira: Nós três viemos de caminhos muito diferentes. Eu fui criada pela minha mãe, claro que pelo meu pai também, mas não existia a popularização da guarda compartilhada na década de 70. Eu e o Chico crescemos separados, e não convivi muito com meu pai, mesmo sendo muito ligados. A minha mãe era atriz de teatro São Paulo, eu vivia com ela nas coxias e comecei a fazer teatro por causa dela, enquanto a realidade do meu pai era a música. Eu não fui para a música, e o Chico trilhou o caminho dele, era natural. Pra gente foi um encontro, ficamos muito surpresos, porque foi uma coincidência. Eu falava pouco com o Chico, meu pai está sempre viajando fazendo shows e com a novela trocamos muitas informações e falamos direto. Estou te dizendo algo muito sincero: a novela nos uniu. Não éramos uma família tradicional, eu nunca convivi com eles. O trabalho fez a gente perceber que, como família, ainda temos muito que viver juntos. E isso é muito bonito!
GLMRM: Por que a televisão demorou a te descobrir?
Isabel Teixeira: Não acho que a televisão demorou pra me descobrir. Eu sou uma mulher de teatro, nunca fui atrás da televisão e acho que tudo tem sua hora e vez. Se tivesse começado antes, talvez eu não tivesse fazendo essa personagem e acho que a Maria Bruaca eu teria que fazer. É muito cultural a gente acreditar que tudo precisa acontecer cedo, se não já era. Para mim está acontecendo na hora que tem que acontecer. Esse aprendizado está sendo lindo, está na coerência da minha carreira e trajetória, estou aprendendo muita coisa. Eu trago uma experiência que vem do teatro, o outro traz uma experiência que vem da moda, tudo pode se encontrar no mesmo lugar.
“Sou uma mulher de teatro, nunca fui atrás da televisão e acho que tudo tem sua hora. Se tivesse começado antes, talvez eu não tivesse fazendo essa personagem.”
GLMRM: Depois do sucesso da sua personagem, você pensa em reservar um momento da carreira para se dedicar mais às telenovelas?
Isabel Teixeira: Nessa altura do campeonato, eu sei o que me move e o que me faz sentir viva. Às vezes pode ser uma personagem de teatro, outra vez uma personagem de televisão. Eu gosto de trabalhar. No teatro já fiz de tudo, desde atuar até produção, e aqui estou aprendendo uma coisa nova e adorando. Eu acho que tenho muito o que aprender ainda. Não tenho um plano de carreira, tenho o que me move, aí vou lá e faço.