Por Luciana Franca
Fotos Jorge Bispo
Styling Juliano Pessoa e Zuel Ferreira
É quase possível sentir o cheiro do bolo quente pela tela da videochamada. Bolo de milho, uma das especialidades de Caio Blat, que se descobriu um ótimo confeiteiro na pandemia e manda bem também no cheesecake. Adoçado com açúcar mascavo porque Luisa Arraes é “natureba”, o bolo celebrava a nova fase do casal. Caio alugou o apartamento em frente ao dela no charmoso predinho do Jardim Botânico, no Rio, onde foi realizado este ensaio. “Além de tudo, a gente é vizinho. É uma coisa muito erótica. Acabei de ir lá pegar uma xícara de açúcar para o bolo”, ri Caio. “Meus amigos dizem que é um sonho de casamento porque se brigarmos, fechamos as duas portas”, completa a atriz.
As portas, separadas apenas por um corredor, vão ficar sempre abertas, com certeza. Os dois estão juntos há quatro anos e a sintonia só cresce desde o primeiro encontro, quando encenavam o vigoroso espetáculo “Grande Sertão: Veredas”, dirigido por Bia Lessa – com quase três horas de duração e cena de sexo entre seus personagens. Sucesso de público e com planos para ser encenada em Inhotim, ao ar livre, a peça foi interrompida pela pandemia e não tem data para voltar. Caio conta que o teatro é o chão deles de cada dia, “a cozinha”. Ele e Luisa aguardam a volta aos palcos e o início de mais um projeto juntos, o filme também inspirado no romance de Guimarães Rosa, dirigido por Guel Arraes, pai de Luisa. Será a primeira vez que a atriz trabalhará com o pai, sem contar as pequenas participações que fez na infância, por brincadeira, quando acompanhava as gravações de Guel e da mãe, a atriz Virginia Cavendish. Neste quesito, Caio é mais íntimo da família. “Já fiz papel de namorado, irmão de Virginia… Fizemos peça, filme e novela juntos. E fiz filme do Guel, ‘O Bem-Amado’”, enumera ele.
“Nunca tive esse sonho de ser celebridade. Quero ser artista, contar uma história, escrever, dirigir, produzir. Sempre vi meus pais trabalhando duro”
Luisa, filha de Guel Arraes e Virginia Cavendish
Apesar do compasso de espera, a dupla não para de criar. O apartamento de Luisa serviu de cenário para um episódio da série “Amor e Sorte”, do Globoplay, em que o casal atuou junto, e para monólogo autoral dela, “Nunca Estive Aqui Antes”, exibido on-line. Formada em letras, Luisa tem passado a maior parte do dia na frente do computador. “A vida de atriz é muito difícil. Eu não aguento esperar alguém chamar para um personagem incrível, então, preciso sempre produzir, fazer projeto no teatro. Se você não produz, não trabalha”, diz. “Nunca tive esse sonho de ser uma celebridade, ser estrela. Quero ser artista, contar uma história, escrever, dirigir, produzir. Sempre vi meus pais trabalhando muito duro, minha mãe produzindo tudo dela.”
O ator segue o ritmo da companheira. Recentemente, eles passaram um fim de semana editando uma peça do autor modernista português Mário de Sá-Carneiro, do começo do século passado, que fala sobre desejo e ciúme, dois temas que gostam de conversar, e já mandaram para uma produtora. O casal também conseguiu manter o projeto de aulas de teatro do grupo Nós do Morro, no Vidigal. Agora, Caio debruça-se sobre a série inspirada no livro “A Droga da Obediência”, de Pedro Bandeira, para a Globo, em que vai escrever e dirigir e terá supervisão do autor. A ideia veio do filho Bento, de 11 anos, de seu casamento com a atriz Maria Ribeiro. “Estávamos lendo os livros do Pedro Bandeira, que eu lia exatamente com a idade dele, quando Bento virou para mim e falou: ‘Pai, como é que não fizeram uma série dos caras?’. Liguei para o Pedro na hora, tivemos uma conversa maravilhosa, ele acreditou muito na minha ideia, na minha vontade, e topou.”
“Nossa relação amadureceu, nossa parceria se fortaleceu muito, porque é um elo inesquecível passar mais de um ano com uma pessoa, dividindo, comendo, sem viajar, sem sair para trabalhar, sem ver os amigos”
Caio Blat
Além do caçula, Caio fala sobre o filho Antonio, de 18 anos, que adotou com sua primeira mulher, a cantora Ana Ariel, e com quem retomou contato em 2018. “Fiquei muitos anos fora da vida dele. Depois que ele voltou para a minha vida, criamos uma relação muito especial, de amizade, de uma troca muito forte, embora a gente se veja pouco porque ele mora em Campinas (SP)”, conta o ator de 40 anos. “Antonio é o ídolo do Bento porque é gamer, conhece todos os jogos, eles jogam juntos on-line.” Pelo rumo da conversa, inevitável não perguntar a Luisa, de 27 anos, se ela deseja ser mãe. “No Brasil de agora, eu não tenho vontade. Tem que esperar um pouco, ter algum horizonte”, diz ela.
No momento, a atriz se ocupa com outro tipo de maternidade. Em janeiro, levou para casa a gatinha Buriti, batizada em homenagem à obra de Guimarães Rosa – a palmeira buriti é citada inúmeras vezes em Grande Sertão: Veredas. “Depois de um mês chorando todo dia, com pânico de ter essa responsabilidade, hoje acho que é a melhor coisa que fiz na minha vida”, reconhece. “Coisas que a pandemia e o Brasil me obrigaram a fazer.” Outra boia de salvação para Luisa nestes tempos difíceis foi voltar a tocar piano, instrumento que aprendeu quando criança. Caio conta que já está preparando um setlist para um futuro show da companheira, com repertório que vai de Nina Simone a Arnaldo Baptista. Mais um projeto a quatro mãos na lista do casal. E o ator, quem diria, achava que seus afazeres na pandemia seriam preparar bolo, cuidar do jardim da casa que mantém no bairro do Itanhangá, onde passa os fins de semana, e assistir à série “Cobra Kai” com o filho Bento.
* Matéria originalmente publicada na Revista J.P, do Grupo Glamurama