Por Adriana Nazarian na revista Joyce Pascowitch de julho
Ilustração Marina Leme
Todas as noites, milhares de telespectadores se reúnem em frente à televisão para assistir a “Avenida Brasil”, a novela de João Emanuel Carneiro que tem segurado no sofá até mesmo quem não é muito fã de folhetim. O que o público gosta tanto? Ver o circo pegar fogo com Adriana Esteves, que interpreta Carminha, a ex-prostituta, ladra, interesseira, mentirosa e implacável, antagonista de Débora Falabella, que vive Nina, sua enteada resignada e com sede de vingança. Aqui, não há lugar para o perdão. De volta ao mundo real, vale a mesma regra: perdoar não é tarefa nada fácil. E isso acontece porque o ato parte da premissa de que uma pessoa agiu para prejudicar outra. “É o conflito entre o passado alegre e o presente marcado por um momento de tristeza”, define Clóvis de Barros, professor livre docente de ética da USP. No dia a dia, engrossamos o coro: como é difícil lidar com a ruptura de uma expectativa ou uma quebra de confiança. Seja qual for a lesão sofrida, uma regra é clara: “Não existe passar a borracha”, diz Clóvis. Perdoa-se a pessoa, mas nunca o ocorrido. Feito isso, há quem consiga deixar o ego de lado, reajustar valores e seguir em frente.
O fato é que não há como ordenar o perdão ao coração. A crise pode facilmente ser convertida em sede de vingança, uma ideia equivocada de que o sofrimento alheio pode, enfim, trazer de volta a alegria roubada. É a mesma saga que Nina enfrenta diariamente em Avenida Brasil, mas vale lembrar: a sentença de quem nos prejudicou não está em nossas mãos. “O arrependimento já é um autojulgamento”, conta Frei Betto. O grande desafio está em estabelecer o que faz sentido para você. Não ter medo de deixar o orgulho de lado, mas analisar, entre tantas mancadas, o que vale a pena levar adiante. E, não custa lembrar: há, sim, coisas imperdoáveis. “O sentimento [do perdão] só faz sentido quando estamos dispostos a consertar a relação. Quando não há esperança de que a alegria supere a dor, ele deixa de existir”, finaliza Clóvis de Barros. Em todos os outros casos, fica a dica: viver sem peso na alma e no coração é, no mínimo, libertador.