Xico Sá admite que é o tipo de pessoa que sempre fala mal das novidades do mundo virtual e depois de 15 dias já está viciado nelas. Além da televisão, sites e redes sociais, agora ele aposta no podcast para contar as suas histórias de vida e, principalmente, retratar o lado observador, mas claro que sem deixar de lado aquela ‘coceirinha’ investigativa que o acompanha desde os tempos de repórter.
Jornalista que acompanhou o nascimento e o domínio da internet na comunicação, ele fala sobre as mudanças em seu ofício em entrevista ao Glamurama: “A minha profissão, o jornalismo, mudou muito, e vi muita gente da minha geração que era medrosa e tempos depois entrou para o jogo”, conta.
“No Balcão” é o nome do programa disponível na plataforma Orelo, e que fez Xico voltar às raízes do rádio, em que tudo começou lá no Cariri quando participava do programa ‘Temas de Amor’ como conselheiro amoroso. Isso sem nunca ter namorado, não ter ideia do que era o amor ou relacionamento: “Isso ia acontecer mais ou menos dia. Sentia necessidade de me comunicar, levar meu texto para um podcast, já que tenho uma relação antiga com a crônica falada. Sempre fui leitor de poema de amor, literatura, era obcecado por Vinícius de Moraes. Toda vez que pensava no podcast vinha a crônica de amor na rádio, a minha tentativa é de resgatar isso”, explica sobre o novo desafio.
Papo de Balcão
Quarentenado radical, Xico revela que a criatividade andou em baixa quando o isolamento começou: “Tive muita dificuldade, como cronista a ideia vem sempre de uma frase do garçom, uma treta de casal no bar… Perdi muito esse material o que trouxe certa dificuldade para escrever. Mas, comecei a mergulhar no universo de casa, janela, voyeurismo, contemplar as outras famílias, o que virou uma observação mais localizada”, conta.
Para ele, o balcão é quase um meio de comunicação à parte e a pauta é livre. E no caso do podcast, Xico explica que não pode faltar essa ideia do consultório sentimental e que o amor é tema obrigatório. A política será abordada, mas não como uma grande análise. Vai entrar muito como o desabafo com o amigo no bar para repassar os últimos absurdos, combinar de beber para esquecer: “Será nesse sentido, o de desopilar, chorar as mágoas, resolver tudo em um drink”, diz Xico ao comentar sobre o podcast em que ele promete um pouco de tudo: “Já sei que vou fazer uma crônica sobre a importância dos animais de estimação na quarentena”, completa.
Boêmio nato e assumido, Xico sente falta dos encontros semanais com os amigos escritores no Mercearia São Pedro, tradicional bar da Vila Madalena, em São Paulo: “Ali é uma confraria e faz pelo menos 20 anos que isso acontece. Esse encontro faz falta, mas sou um quarentenado radical e ainda não é tempo de voltar”.
Faro dos bons
“Pelo passado sabe-se o que está para vir.” O ditado popular não se encaixa no futuro que Xico imaginou para o Brasil, ainda nos tempos de repórter investigativo: “Imaginava que o país estivesse infinitamente melhor, pois sou da turma do Bar Esperança”, relembra ao explicar: “Comecei minha carreira como repórter no final da ditadura. Claro que a gente vive de tudo, ciclos bons e ruins, mas chegar a esse ponto, ao tal estado da situação de hoje, mesmo nas noites de mais pessimismo, nesse nível não imaginava. Um governo ruim dentro de uma normalidade democrática é suportável, mas ter homofobia e racismo como plataformas de governo, não”, lamenta sobre a situação atual do país.
Para quem não sabe ou esqueceu – algo bem típico dos brasileiros -, Xico investigou todo o caso de Fernando Collor de Melo com PC Farias, nos anos 1990. Ele, inclusive, acompanhou os integrantes da Polícia Federal até a Tailândia quando prenderam o tesoureiro da campanha do ex-presidente, em 1993. E o trabalho vai virar um livro: “Comecei a escrever um livro sobre minhas aventuras de repórter no período Collor, em que investiguei o paradeiro do PC Farias. A obra vai começar no sertão de Alagoas e acabar em Bangkok quando fui para voltar com ele preso pela polícia. A cada escândalo me dá uma ‘coceirinha’ e essas memórias têm me acalmado”, explica.
Pai de família
Acompanhar ‘centímetro por centímetro’ de Irene, sua filha com a produtora cultural Larissa Zylbersztajn, de três anos, tem sido o grande aprendizado de Xico neste período: “Nunca imaginei que seria tão colado. O benefício, nesse sentido, é que jamais vou esquecer esse momento.”
Sobre o coronavírus, a menina dá show de entendimento da situação: “Ela percebeu mais rápido do que a gente imaginava. O irmão Téo, de 12 anos, ajuda a diminuir o sofrimento e o videogame também, mas o que ela não curte é o Zoom com as amiguinhas ou a escola por internet, prefere o abraço”, fala. A vida pós-pandemia da família já está planejada e a ideia é cair de novo na estrada. E é aí que pinta a única dúvida: praia ou montanha? O resto a gente resolve com uma boa história.
Os episódios de ‘No Balcão’ são semanais, sempre no começo da semana, e estão disponíveis na Orelo, aplicativo de podcasts que pode ser baixado na Apple Store e Google Play. (por Fernanda Grilo)