Por Fábio Dutra fotos Fernanda Frazão, da revista Poder
Volume vivo de tudo o que o estado precisa” – a presidente Dilma Rousseff, pouco afeita a polêmicas, deu o tom das eleições para o governo de São Paulo deste ano ao se referir a Alexandre Padilha dessa maneira. Uma clara alusão ao anúncio do governo do candidato à reeleição pelo PSDB, Geraldo Alckmin, do início da utilização do volume morto do Complexo da Cantareira, reserva de água só utilizada pela estatal Sabesp em casos extremos, ou seja, quando a represa seca. A declaração foi dada na segunda-feira, 16 de junho, um dia depois da oficialização da candidatura, pelo PT, de Padilha – ex-ministro da Saúde de Dilma e de Lula, também ocupou a pasta das Relações Institucionais e a coordenação política do governo. Por questões de saúde, a presidente havia faltado à cerimônia de oficialização da chapa petista em São Paulo, o que foi usado pela oposição, que é situação no estado, para colocar a crise dentro do recém-instalado comitê de campanha.
“Como médico infectologista, sou o primeiro a entender o porquê de a presidente não ter comparecido”, explica o candidato. Mas, então, o que ela teve? “Ela estava doente”, desconversa. É mesmo difícil crer que haja qualquer rusga entre os dois, política ou pessoal. Assim como a primeira mandatária da história do Brasil, o médico pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) tem perfil técnico. Ascendeu ao primeiro escalão do governo com pouco carisma, mas muita fama de workaholic. Nas redes sociais adotou um codinome que ficou conhecido na rádio-peão do ministério: @padilhando. Padilhar é o verbo para trabalhar além da conta.
Alexandre Padilha pode até não ter problemas com Dilma Rousseff, mas sua campanha não será nada tranquila. Gilberto Kassab, que chegou a sonhar em concorrer, há tempos encerrou o namorico do seu PSD com o PT e voltou a se aproximar do PSDB. As negociações não andaram e ele fechou, nos últimos dias antes do fim do prazo, com o PMDB do candidato Paulo Skaf. Kassab angariou, assim, uma candidatura ao Senado. No dia que antecedeu essa entrevista, o tal fim do prazo, o PP de Paulo Maluf abandonou a coligação de Padilha, à qual prometera apoio, registrado em foto na Assembleia Legislativa tal qual a imagem de Maluf com Haddad e Lula que tanto repercutiu durante a eleição à prefeitura de São Paulo em 2012, para também se unir a Skaf. O PT está em uma chapa quase puro-sangue, com PCdoB e PR, os aliados de sempre, e pouquíssimo tempo no horário eleitoral gratuito. O petista, pouco conhecido e com apenas 3% das intenções de voto nas últimas pesquisas, terá a tarefa hercúlea de romper o antipetismo do interior do estado para se eleger. Vai ter de padilhar.
Futebol e Amazônia
Padilha só conheceu o pai perseguido político aos 8 anos, quando ele voltou ao país após a Lei de Anistia e correu para ver o filho. Durante esse tempo, falava com a família (ele tem irmãos nascidos no exílio) por meio de cartas e de fitas cassete, que gravava de tempos em tempos. Foi assim que o corintiano Padilhinha deu o gosto aos outros homens da família, acometidos pelo mesmo fanatismo, de conhecerem o gol de Basílio que deu o título paulista ao Corinthians em 1977, depois de 27 anos sem ganhar nada. Narrou e enviou. Padilha também viveu na periferia de São Paulo, no Campo Limpo, quando a mãe médica decidiu assumir um posto de saúde da região. Já formado, abdicou de fazer residência médica no Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, para a qual já havia sido aprovado, para aderir a um programa de pesquisa de doenças infecciosas da mesma universidade na Amazônia, na região de Santarém, onde se concentrou em atender à tribo zo’é, mesmo sem falar a língua índigena – que jamais aprendeu. Dificuldade, portanto, não é novidade na vida do ex-ministro. Mas talvez essa candidatura seja o maior desafio que já enfrentou.
Fisicamente, o político demonstra que não terá problemas. Em forma, aparentando até um pouco menos do que seus 42 anos, ele explica que se exercita pelo menos três vezes por semana em uma academia no topo do Shopping Light, com vista para a prefeitura e para o Vale do Anhangabaú. Desde que deixou o Ministério da Saúde, ele mora com a mulher em São Paulo, na rua Avanhandava, a colorida via do restaurante Famiglia Mancini no fim da rua Augusta, início da Martins Fontes. Eles costumam andar de bicicleta no Minhocão e na Paulista aos fins de semana. Ele também gosta de velejar “no litoral e na represa de Guarapiranga”. Quase um hipster paulistano. A jornalista Thássia Alves, candidata à primeira-dama, será a coordenadora de redes sociais da campanha.
E as armas de Davi para enfrentar Golias devem ser essas mesmas que Thássia conhece tão bem: a comunicação direta. O @padilhando, já iniciado, “por curiosidade, mas também influenciado pelo meu irmão, um ator bastante ativo nas redes, e pela minha mulher”, pretende suprir suas deficiências de TV, de campanha tradicional. Está tudo bem organizado para essa que é a melhor eleição já disputada pelo PT no plano estadual, já que a existência de três blocos fortes, pela primeira vez em muitos anos, aumenta a chance de segundo turno. O candidato também está bem preparado: apesar do jeito ansioso, ele aprendeu a controlar bem as palavras que saem da boca, em um ritmo pausado que quase o entedia. Olhos nos olhos do interlocutor, nem uma olhadela para a assessora e o cuidado claro, quase ensaiado, de combinar bem as palavras. Nunca se esquece de unir “paulistas” a “locomotiva do Brasil” ou de mencionar “manifestações” sem ressalvar que devem ser “pacíficas”, sem “vândalos”, e lembrar que ele mesmo participou das manifestações pacíficas mais importantes da história nacional, quando a “juventude conseguiu derrubar um presidente sem medo de mostrar a cara”. A seguir, os principais pontos da conversa que Alexandre Padilha teve com PODER.
Centros de inovação
Tanto a Universidade de São Paulo, como a Unicamp e a Universidade Estadual Paulista (Unesp) são grandes instituições e é importante que sejam usadas para desenvolver o Estado de São Paulo. Precisam criar novas tecnologias, vacinas e ter uma participação importante na formação dos professores da educação básica. São Paulo só vai ser a locomotiva do século 21 se tiver essas universidades do começo ao fim como protagonistas desse projeto. Para isso, além do garantido pelo ICMS, é necessário garantir o financiamento de médio prazo, de dez anos, envolvendo o setor privado. Essa parceria pode, sim, ser muito positiva para a universidade, desde que direcionada para os desafios de desenvolvimento que temos hoje. Os paulistas mais uma vez têm de ter a capacidade de se antecipar e de liderar uma agenda de inovação, de qualidade da educação, de entrada do nosso país na indústria do conhecimento.
De braços abertos
O programa da prefeitura de São Paulo é um sucesso: reduziu roubos de carro na região da Cracolândia, foi premiado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Organização das Nações Unidas (ONU), que vieram conhecer a experiência. A população percebeu que, pela primeira vez, existe uma política continuada. É preciso combinar cuidado e acolhimento com segurança e autoridade. O De Braços Abertos inclui essas duas ações. Mas se a pessoa está correndo risco de vida, e isso está contemplado no programa Crack, É Possível Vencer, que construímos no governo federal e define as diretrizes seguidas pela política da prefeitura, o profissional de saúde deve interná-la para salvar sua vida. Eu tenho certeza que, ao ver os resultados, a população já aprova o programa como um todo. Porque melhora a vida das pessoas e os indicadores de violência.
O potencial de SP
Não se pode falar em recursos de menos em São Paulo. O estado tem um potencial enorme, seja no setor público, no privado, no papel que o estado tem na economia do país ou nesse povo extremamente trabalhador que já enfrentou e superou todo tipo de dificuldade. Se tem um lugar no país que pode dar um grande salto no século 21, esse lugar é o Estado de São Paulo e precisamos aproveitar ao máximo esse potencial. O centro desse salto está em educação, em dar a esses jovens a chance de contribuir ainda mais com a riqueza do estado e usufruir disso. Estamos no último período em que nós temos os jovens como a maior parcela da população economicamente ativa. Isso faz parte de uma política de segurança pública, que tem de combinar isso a uma polícia cada vez mais moderna, que se antecipe aos crimes – hoje, por exemplo, há 1 milhão de câmeras no Estado de São Paulo no setor privado, 40 mil em bancos, 15 mil em shoppings. Essas imagens não são usadas pela Secretaria de Segurança Pública para se antecipar aos crimes.
Mais médicos
Se eu fosse ouvir as críticas de uma minoria sobre o Mais Médicos – e as críticas dos meus próprios colegas médicos – não teria implantado o programa. É preciso ter coragem para enfrentar resistências. Mas, em oito meses, levamos médicos a 50 milhões de brasileiros que não os tinham em seus bairros. Entre eles, 10 milhões de paulistas. Mas claro que se trata de um primeiro passo, o alicerce que garante o atendimento básico e a humanização no atendimento. É necessário avançar mais e levar exames e cirurgias às periferias, por exemplo. O trabalho está apenas começando, mas a vida de grande parte da população já melhorou bastante com o Mais Médicos.
A questão da sáude
Desde que foi criado o Sistema Único de Saúde (SUS), sempre defendi que fossem feitas parcerias. Com a Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), as Santas Casas e as OSs, que são filantrópicas. São muito positivas, desde que haja controle público sobre o financiamento e a regulação. O que eu abomino são projetos, como o do governo do estado, de separar 25% dos leitos do SUS para planos de saúde. Fizemos no Ministério da Saúde o que só ali podia ser feito, como mudar regras de vacinação, instalar o Farmácia Popular dentro das farmácias privadas para oferecer medicamentos até de graça e obrigar os planos de saúde a ressarcir o SUS em caso de atendimento público a pacientes que tenham seguro contratado. A organização para diminuir filas de exames, de cirurgias, de tratamentos complexos, só o governo do estado pode fazer porque ele tem a responsabilidade de organizar o sistema dentro das regiões do estado. Quando ministro, encaminhei para o Congresso um projeto de lei que cria a Responsabilidade na Saúde, nos moldes da fiscal. Os governantes têm de assumir metas e cumpri-las sob pena de serem punidos caso não o façam, podendo até se tornarem inelegíveis.
A violência da PM
Para resolver os problemas de São Paulo tem de ter coragem de enfrentar resistências. Não se pode permitir abusos individuais ou de ordens mal definidas. É inadmissível qualquer tipo de violência como a que ocorre hoje na periferia com a juventude, sobretudo com a juventude negra. Foi um abuso o que ocorreu em Pinheirinho (episódio de 2012, quando a polícia invadiu o bairro de São José dos Campos para cumprir um mandato de reintegração de posse). Há também leniência, como quando a PM assistiu de braços cruzados pessoas destruindo patrimônio público e privado no bairro de Pinheiros, antes da Copa. Falta comando e coibir o abuso. Sem generalizar para os bons policiais, que são maioria.
Metrô (Politano)
O metrô foi inaugurado em 1974, juntamente com o de Seul, na Coreia do Sul, e o da Cidade do México. Hoje, o México tem mais de 200 km de linhas, Seul, mais de 500 km, e São Paulo, pouco mais de 70 km. O atual governador prometeu 30 km de metrô em quatro anos e não entregou dez. Vamos criar uma área do governo para acompanhar e acelerar as obras, agilizar processos burocráticos com transparência. Os trens da CPTM têm de ter padrão metrô. As estações da periferia não podem ter qualidade pior do que as do centro, como em Francisco Morato: 70 mil pessoas precisam atravessar a linha diariamente porque não têm estação. Chega de um governo que enxerga os moradores da periferia como cidadãos de segunda classe. É bom lembrar que metrô vem de metropolitano. Em quatro anos, vamos fazer com que o metrô ultrapasse os limites da cidade, o que o PSDB não fez em 20 anos. E, integrar o bilhete único das regiões metropolitanas. Isso reduzirá o custo para o usuário e forçará uma integração do transporte. Temos de ter uma velocidade de expansão na velocidade dos paulistas.
Mudança de verdade
A eleição se dividirá em três blocos: o grupo que governa o estado nos últimos 20 anos, o que reúne quem governou São Paulo de 1974 a 1994, e a nossa candidatura, que irá governar pela primeira vez. Não à toa o nome da nossa coligação é Mudança de Verdade. Não abri mão de ter uma chapa com pessoas ficha limpa, como é o caso de meu vice, Nivaldo Santana, dirigente sindical ligado à Sabesp que conhece profundamente a história da crise de recursos hídricos de São Paulo, e o candidato ao Senado, Eduardo Suplicy. Aliás, entrei para o PT por conta da campanha “experimente Suplicy, é diferente de tudo que está aí”, em 1985. Não vai ser fácil, mas esse cenário político criou as condições para termos segundo turno, uma grande diferença em relação às eleições anteriores. Vamos para as ruas, para as redes sociais, apresentar nossas ideias no programa de TV. Estou muito otimista.
Sem rusgas internas
Sou profundo conhecedor do PT-SP, já que fui desde muito novo da direção estadual do partido, fui o primeiro secretário de juventude do PT-SP, de 1992 a 1995, e atuei no Ministério da Coordenação Política, quando acompanhava os prefeitos. Posso dizer que nunca o partido esteve tão unido. Estamos convencidos de que chegou a nossa vez, pois nunca tivemos condições tão claras de ganhar as eleições.
Nova fase
Torço para que o PSDB queira trazer o tema da corrupção para o debate eleitoral. Poderemos mostrar que há 15 anos existe um escândalo no metrô de São Paulo e nos trens que é um dos responsáveis pela lentidão das obras. Há secretários e ex-secretários nominados por essa investigação que estão no governo até hoje. Vamos mostrar que o PSDB joga para debaixo do tapete os malfeitos dos seus, enquanto o PT apura e pune. O PT inaugurou uma era em que políticos são, até, presos.