Revista J.P reúne time de lésbicas mais cool do circuito Rio-São Paulo

 

“Foi importante, mas é como se estivesse dez anos atrasado”, diz Betty Prado sobre beijo gay na novela

por Isabel de Barros
fotos Cássia Tabatini
styling Luna Nigro

Em tempos de Ellen Page, atriz americana de 27 anos que se assumiu lésbica recentemente, reunir uma turma de mulheres que namoram mulheres e passam longe do clichê poderia ser mais fácil. Mas não. Algumas das recusas que ouvi envolviam frases como “minha avó me mata”, “tenho medo da exposição” e até “vai ser um sucesso, mas não posso”. No momento em que comemoramos o primeiro beijo gay da televisão brasileira, protagonizado por Mateus Solano e Thiago Fragoso no último capítulo da novela global “Amor à Vida”, em janeiro, ainda não temos muito a festejar. “Foi importante, mas é como se estivesse dez anos atrasado. Nos dias de hoje, é preciso que essa naturalidade se traduza em leis que protejam e deem direitos iguais aos homossexuais e não em palmas para um beijo sem graça”, diz Betty Prado, consultora artística da Globo, empresária, top model dos anos 1980 e gay assumida desde sua época de passarelas. Aos 51 anos, ela viu os tempos mudarem: “Não fui sempre bem resolvida, quando comecei como modelo não tinha nenhuma lésbica assumida. Não se falava a respeito. Mas tive sorte, sempre consegui separar bem a profissão e o pessoal”. Hoje, morando no Rio ao lado da namorada Thamara Cumplido, ela acha que está mais do que na hora de uma boa reflexão. “Ao mesmo tempo em que a sexualidade está sendo mais falada, na televisão inclusive, ainda temos deputados como Feliciano e Bolsonaro”, fala. “Aceitei esse ensaio para mostrar que não cabem mais posições reacionárias e preconceituosas.”

Vale-Tudo
Nem posições, nem estereótipos. Recentemente, o Festival de Cannes deu a Palma de Ouro ao longa francês “Azul É a Cor Mais Quente”, que conta a história de uma adolescente que se apaixona perdidamente por uma lésbica. “Sem dúvida o primeiro filme com o qual me identifiquei. Achei de uma sensibilidade, verdadeiro, nada caricato”, conta Betty. “Essa coisa de roupa masculina, cabelo curto, até faz parte de uma fase, mas está longe de ser regra”, diz a produtora Gabriela Palumbo, 24 anos, morena de cabelo comprido, traços finos, apaixonada por maxibrincos. Vinte e sete anos mais nova que Betty, Gabi não enfrentou muitos impedimentos. Além de sua geração ter crescido com o tema sendo posto em voga – na TV, a novela “Vale Tudo” (1988) mostrou um primeiro e tímido relacionamento lésbico entre as personagens das atrizes Cristina Prochaska e Lala Deheinzelin –, em casa o assunto nunca foi tabu. Ela é filha da jornalista Patricia Palumbo e sempre ouviu que tudo bem qualquer fosse sua escolha sexual. Depois de ter namorado homens e mulheres, Gabi se casou, em setembro do ano passado, com Claudia Rom (em 2013, o Conselho Nacional de Justiça aprovou uma resolução que obriga todos os cartórios do país a celebrar casamentos entre pessoas do mesmo sexo). Elas, que “se pegaram” a primeira vez há três anos, hoje vivem em lua de mel. “Estamos naquela fase de querer cinco filhos e 80 cachorros, sabe? Gostaria de fecundar meu óvulo e colocar na barriga da minha mulher, para ter um filho nosso.”

Mas nem tudo são flores
Apelidada de Pocahontas pela nossa equipe, a chef de cozinha e dona do bar/restaurante Flamingo, em São Paulo, Raquel Pulice, 27 anos, nunca transou com um homem. “Sempre soube que era homossexual. Uma vez, quando pequena, estava vendo novela com minha mãe e perguntei o que era gay. Depois da explicação, pensei: eu sou gay.” O primeiro beijo veio aos 14 anos e a namorada aos 17. “Foi quando meus pais descobriram.” Depois de um afastamento, a família entendeu e aceitou Raquel. “Nesse meio tempo, me apeguei demais aos amigos, eles viraram minha família, são as pessoas que me entendem e não me julgam.” Para a atriz Vanessa Guedes, 34 anos, aceitar posar para estas fotos é um passo à liberdade. “Meu pai não sabe, quando a revista sair vamos ter uma conversa”, diz ela, que ri quando pergunto se ele não tem ideia da opção sexual dela. “Falta consciência, todos nós somos iguais”, desabafa. Apesar das opiniões divergentes de seus amigos e parceiros de trabalho sobre encarar ou não estas fotos, Vanessa resolveu aparecer justamente para pôr o tema em pauta – tanto em casa, quanto para a classe de artistas. “Quando estou no palco, sou boa, não preciso usar vestido e me maquiar fora de cena para provar nada para ninguém.”

Maria Eugênia Cortez já interpretou uma homossexual que sofria bullying na escola no filme “As Melhores Coisas do Mundo”, de Laís Bodanksy. Mas, foi antes de viver esse papel que as mulheres surgiram em sua vida: “Tinha 15 anos quando uma amiga me agarrou e me deixou maluca.” Hoje, com 21 anos, ela não se reduz a apenas uma opção. “Tenho atração por homem também. Mulher é muito sexual, né?” Atriz – graças ao tio Raul Cortez (1932-2006) –, DJ e estudante de artes plásticas, ela gosta do charme feminino, da conquista. “Mulher é muito mais complexa que homem”, diz ela, que acredita ter um “gaydar” – radar para descobrir quem é ou não. “Sapata não tira a cutícula da unha, não anda de rasteirinha ou sapatilha e tem um jeito de olhar diferente.”

Dança das cadeiras
A artista do corpo Beatriz Coelho, irmã da chef de cozinha Bel Coelho, namorou homens a vida toda, até se apaixonar por uma mulher aos 27 anos. “Foi um susto na minha família. Ouvi coisas do tipo ‘você é tão bonita’, ‘tão feminina’, ‘uma pena’, ‘que desperdício’. E o mais engraçado é que nunca me senti tão feminina”, conta. “A discriminação existe. Uma vez uma mulher veio me dizer que eu estava enganada. Em outras situações não me senti à vontade para fazer um carinho na minha namorada.” Bia fala que sente a exclusão, principalmente de homens. “Eles te olham e falam de um jeito como se o sexo feminino fosse inferior.” Solteira há poucos meses, depois de cinco anos de uma união que se tornou estável, ela não se diz homossexual. “Não gosto só de mulher. Me assumi apaixonada por uma, mas isso não quer dizer que não possa me casar com um homem.” Como Betty Prado, cita “qualquer maneira de amor vale a pena”. Qual é a sua?

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