O projeto de lei 529/2020 do governo do Estado de São Paulo está preocupando a comunidade científica, pois prevê a retirada de dinheiro de universidades estaduais e da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo). O problema é que se o PL passar na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), muitas descobertas científicas poderão ser prejudicadas, inclusive as que envolvem tratamentos e curas para o novo coronavírus. De acordo com o Prof. Dr. Carlos Gilberto Carlotti Junior, pró-reitor de pós-graduação da USP, a falta de recursos vai atrapalhar não só os avanços científicos a longo prazo, mas todo um conjunto de gastos que precisam ser feitos no cotidiano, como a folha de pagamento de funcionários e até bolsas de estudantes que podem deixar de frequentar a universidade por falta de dinheiro.
O artigo 14, que determina que o superávit de autarquias e fundações seja transferido ao final de cada exercício ao tesouro do Estado para que sejam pagas aposentadorias e pensões é o que mais preocupa os acadêmicos. “O Projeto de Lei visa acertar a situação financeira pós-covid, imaginando que os gastos foram maiores. Se você ficar restrito, dá a impressão que a universidade não fez nenhuma contribuição para esse arranjo financeiro. O modo de financiamento funciona por porcentagem do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) e esse valor é bastante variável. Esse ano, por exemplo, tivemos uma queda de 14% da arrecadação, o que já representa R$ 400 milhões. Então, essa impressão não é verdadeira e, dependendo do que acontecer com o ICMS até o fim do ano, esse número será maior. Mesmo que volte ao normal, já no próximo mês, nós teremos essa perda”, explica.
Sendo assim, o pró-reitor explica que o trágico cenário com a implementação do PL seria a inadimplência. “Se a gente tirar esse colchão, vai ser muito difícil manter a nossa autonomia financeira”, lamenta, explicando que, quando se trata de ciência, é preciso que seja feito um investimento consistente. “Para construir um prédio novo, por exemplo, é preciso dois, três anos. Uma pesquisa não acontece do dia para a noite, é necessário um grupo de pesquisadores que trabalha nela durante anos para quando chegar uma situação de emergência, estejamos preparados. Em relação ao coronavírus, por exemplo, o respirador desenvolvido pela Poli não foi feito do nada. O professor Raul Lima pesquisa fisiologia pulmonar, ventilação e perfusão há duas décadas. Quando precisou fazer a interversão, foi feita”, diz lembrando que um gasto com a ciência é um investimento para que não seja preciso desembolsar muito mais dinheiro no futuro e em uma situação de urgência.
Para tentar barrar a aprovação do PL, os acadêmicos estão buscando informar a população sobre a situação e conversando com deputados e lideranças para argumentar a respeito do caso. “Estamos tentando mostrar os eventuais riscos. Esperamos que nós tenhamos um bom senso global de quem sempre foi muito responsável e que, através dos anos, respeitou a autonomia das universidades. Vamos aguardar a votação, que deve acontecer em algumas semanas, com a expectativa de que o bom senso prevaleça”, finaliza. (Giorgia Cavicchioli)