Gringo Cardia comemora 20 anos de sua ONG e acredita que dias melhores virão: “Esse extremismo todo vai passar”

Gringo Cardia

Aos 62 anos, Gringo Cardia é um dos cenógrafos mais conceituados no Brasil e já trabalhou em grandes projetos, como o espetáculo OVO do Cirque du Soleil, além de assinar cenários de grandes shows. Mas o trabalho dele vai muito além disso. Ao lado de Marisa Orth, Gringo coordena a Spectaculu, escola sem fins lucrativos que atua desde 1999 no Cais do Porto do Rio de Janeiro. A instituição oferece capacitação profissional nas áreas de Arte e Tecnologia e Artes Cênicas para jovens carentes de 17 a 21 anos, moradores de periferias. O objetivo é inserir essas pessoas no mercado de trabalho. E todo o esforço está valendo a pena. “Nós estamos com um balanço muito positivo. É uma satisfação enorme. Pelo menos 80% dos nossos alunos estão empregados nas áreas que aprenderam, integramos mais de 2 mil jovens”, disse ele.

A ideia surgiu durante uma viagem à Índia junto com a amiga Marisa. “Ela ficou chocada com a pobreza nas ruas do país, e eu disse que no Brasil era igual, mas mascarado, escondido. A partir desse dia decidimos trabalhar para pelo menos tentar amenizar essa discrepância social. Para isso usamos o que sabemos fazer, arte, para ensinar e gerar profissionais capacitados”, lembra Gringo, e emenda: “Hoje temos vários profissionais, que foram alunos da escola, trabalhando em shows, televisão. Um dos exemplos é o ator Jonathan Azevedo, que brilhou em “A Força do Querer”. Mas temos muitos que ficam por trás das câmeras, fazendo tudo funcionar”.

A Spectaculu oferece os cursos de Adereços de Cena, Beleza, Contrarregragem & Camarim, Costura e Figurino, Fotografia, Iluminação Cênica, Montagem de Cenários e Tratamento de Imagem. E Gringo é do time que aposta todos as fichas na crença de que a educação vai transformar o Brasil.

Para comemorar os 20 anos da ONG e angariar fundos que garantam a continuidade do projeto, um evento está sendo organizado por Malu Barretto, Pedro Igor de Alcântara e ArtRio: Um jantar beneficente, leilão de arte – com obras doadas por artistas como Ai Weiwei, Arthur Lescher, Barrão, Cabelo, Carlito Carvalhosa, Daniel Senise, Janaina Tschape, JR, Luis Zerbini, Marcos Chaves, Phillip Colbert, Raul Mourão e Vik Muniz –  e ainda um grande show da banda de Pretinho da Serrinha com a participação de Alcione, Marcelo D2, Vanessa da Mata, Mart’nália, Marisa Monte, Velha Guarda da Portela e Carlinhos Brown, entre outros, vai juntar uma turma para lá de especial no próximo dia 19, no MAM-Rio. Antes porém, em conversa com o Glamurama, Gringo fala sobre diferença social e o amor pela arte. À entrevista.

Glamurama: A Escola Spectaculu está completando 20 anos. Qual é o balanço que você faz desse projeto?
GC: Estamos com um balanço muito positivo. É uma satisfação enorme. Pelo menos 80% dos nossos alunos estão empregados nas áreas que aprenderam na Spectaculu, integramos mais de 2 mil jovens. Essas pessoas estão estudando, em um ambiente seguro. Eu, a Marisa e todos que fazem parte desse projeto se esforçam e se empenham muito para ajudar a melhorar esse abismo social. Queremos e vamos contribuir para isso.

G: Voltando ao passado, como surgiu a ideia da criação da Spetaculu? E como é ser parceiro de Marisa Orth?
GC: Somos muito amigos. A Marisa morou na minha casa por um tempo quando ela começou a trabalhar no Rio. Mas tudo começou quando fizemos uma viagem à Índia. Ela ficou chocada com a pobreza nas ruas do país e eu disse que no Brasil era igual, mas mascarado, escondido. A partir desse dia decidimos trabalhar para pelo menos tentar amenizar essa discrepância social. Então usamos o que sabemos fazer, que é a arte, para ensinar e gerar profissionais capacitados. A ideia, desde o início, foi ter uma instituição de ensino. O Rio de Janeiro tem muita arte: vários shows, espetáculos, produções de cinema, novela, mas não tinha um ensino técnico voltado para isso. A Spectaculo surgiu para ensinar e integrar esses jovens no mercado de trabalho. Nós sabemos que eles precisam trabalhar, e é isso que buscam, então ajudamos em cada etapa.

G: Quais são os maiores desafios de manter um projeto como esse ativo por tanto tempo?
GC: Primeiro, realmente temos que mostrar resultados. Então precisamos ajudar desde o momento de ensinar a profissão até a hora de conseguir um emprego. O outro desafio é ter dinheiro todos os anos para manter tudo funcionando. A Spectaculu oferece tudo: dá a bolsa de estudo, alimentação, aparelhagem de ótima qualidade… Então arrumar dinheiro para tudo isso não é fácil. Por sorte, temos muitos amigos e parceiros, mas não é sempre que as empresas estão motivadas e dispostas a investir nisso.

G: A Escola já formou e inseriu muita gente no mercado de trabalho. Como é ver isso, como o caso de Jonathan Azevedo?
GC: Para nós é um prêmio. O Jonathan é um garoto de sorte, mas ele tem uma história de muito trabalho e superação. A trajetória dele, inclusive, motiva muito outros alunos, faz os olhos deles brilharem. É realmente inspirador. Agora nós estamos nessa era do sucesso, as pessoas querem isso fácil, por causa da internet. Mas não acontece da noite para o dia. É preciso estudo, e nem sempre essas pessoas tem acesso à escola, cursos, isso não é oferecido a eles. A nossa missão é dar essa oportunidade. Hoje temos vários profissionais, que foram alunos da escola, trabalhando em shows, na televisão. Um dos grandes exemplos é o Jonathan Azevedo, que brilhou em ‘A Força do Querer’. Mas temos muitos que ficam atrás das câmeras, fazendo tudo funcionar.

G: Como você analisa o cenário político atual em relação à educação, às ONGs…
GC: Acredito que o país só se transforma com educação. Por mais que alguns coloquem como algo secundário, sabemos que não é. Nós transformamos jovens em situação de risco em profissionais que o Brasil precisa. Essa onda que não valoriza a educação vai passar, é temporário. Além dos alunos, trabalhamos também com as famílias. Os pais querem o melhor para os filhos e eles sabem que a educação vai levar para um bom caminho. Esse extremismo todo vai passar. Educação deve ser prioridade.

G: Quais são os próximos passos do projeto? Alguma novidade em vista?
GC: Na verdade, vamos fazer um leilão no dia 19 de setembro para arrecadar fundos. Ainda não temos verba o suficiente para o ano que vem. Então vários artistas doaram obras para leiloarmos. Vamos aproveitar que grandes colecionadores estão na cidade para fazer isso. Também vai ter show da banda de Pretinho da Serrinha com a participação de Alcione, Marcelo D2, Vanessa da Mata, Mart’nália, Marisa Monte, Velha Guarda da Portela. É uma grande reunião de artistas e esperamos conseguir o dinheiro necessário para 2020.

G: Você é um dos cenógrafos mais conceituados do Brasil. Como é trabalhar em grandes projetos como o DVD da Ivete e o espetáculo OVO do Cirque du Soleil? Algum novo projeto em vista para contar pra gente?
GC: É uma honra. Eu estou sempre envolvido em grandes projetos. Atualmente estou fazendo quatro museus, entre eles o Museu do Samba e o Museu do Futebol e da Paixão, além de uma instalação em Veneza e também um Parque Ecológico, que vai demorar anos para ficar pronto. Nunca paro, e prefiro assim.

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