1. Sempre foi visível a má vontade de alguns analistas do sistema financeiro com relação à política social e econômica do Governo Lula. Eles se consideravam portadores (verdadeiros oráculos) de uma espécie de religião: uma suposta ciência econômica da qual eles deteriam o monopólio do conhecimento revelado no “livro sagrado”. Em alguns casos mais extravagantes, não conseguiam manter-se na crítica das ideias: exalavam repugnância pela pessoa física de Lula e por todos os “desastres” que seu governo estaria promovendo. A crítica mais feroz era com relação ao princípio de Lula que o objetivo moral do Governo (que pretere todos os outros), é reduzir pobreza extrema e gerar a esperança que o direito mais fundamental de todo cidadão é a “igualdade de oportunidades”
2. “Essas pequenas coisas” estavam fora de suas preocupações científicas e, portanto, tornavam incompreensível que um governante “primitivo” e uma política “absurda” pudessem obter o apoio de 9 em cada 10 brasileiros! E, ainda mais, eleger uma Presidente que insistirá nos mesmo princípios: uma política social e econômica que não apenas leve ao crescimento com equilíbrio interno (controle da inflação) e externo (com déficit em conta corrente seguramente financiável) que continuará a perseguir a eliminação da pobreza absoluta e continuará a dar a cada cidadão a esperança da “igualdade de oportunidade”.
3. Não deixa de ser paradoxal que tais críticos não reconheçam nesses dois princípios a garantia da indispensável moralidade que sustenta a economia de mercado que eles defendem com tanto ardor e, às vezes, com argumentos equivocados. Não há dúvida sobre as “virtudes” da organização econômica em torno dos “mercados”: elas são muitas. Até hoje não foram encontradas em outras formas de organização que o homem “descobriu” desde o período neolítico: liberdade individual e eficiência produtiva. Mas ela é uma dramática corrida competitiva. O mínimo que se exige para que a corrida seja justa é que todos partam do mesmo ponto e tenham os mesmos “instrumentos”. A “justiça social” se faz no ponto de partida. A “chegada” depende da “sorte” e da “genética” de cada um e está fora do nosso controle. Os menos protegidos por qualquer uma das duas merecem respeito e um suporte descente mínimo, financiado pela sociedade representada no Estado.
4. É essa dinâmica civilizatória que combina a liberdade individual e a eficiência produtiva com a igualdade no ponto de partida, que dá moralidade à economia de mercado na construção de uma sociedade mais “justa”.
Por Antonio Delfim Netto