por Audino Vilão*
As relações do mundo real se modificaram com o passar das décadas e vêm sendo protagonizadas (mais do que nunca nessa pandemia) pela internet. Continuemos então nossa serie sobre modernidade líquida de Zygmunt Bauman, agora analisando as relações entre o “eu” e “todos”. No texto da semana passada trouxe o conceito de modernidade líquida, explicando o que seria essa “liquidez” que Bauman retrata, os conceitos de sólido e o apontado “derretimento” para as novas bases líquidas. Recapitulando um pouco, a questão do líquido e do sólido podem ser explicadas de uma maneira simples:
Sólido: Certezas, convicções da sociedade e valores.
Líquido: Incertezas, transmutação dos valores da sociedade e suas bases.
Mas em que isso afeta diretamente nossos relacionamentos? O que isso tem a ver como a nossa forma de comunicação e relações sociais com nossos amigos, vizinhos, parentes, inimigos, aliados e conhecidos? Ora, veja bem, para compreendemos as transformações das relações e entendermos como chegamos nesse estado muito louco da sociedade, temos que olhar para o passado e ver como eram as relações sólidas em uma sociedade sólida. Nossos avós ou antepassados tiveram amizades que carregaram durante anos, por muitas vezes até o final de suas vidas. Não havia prazo determinado ou pelo menos uma “desconfiança de quando chegaria ao fim”. As relações sociais eram projetadas para não terem data de validade.
Era mais prazeroso? Ou talvez mais fácil? Muito pelo contrário! As relações em geral duravam pois os interesses eram mais sólidos, o inconveniente de desfazer um laço era algo que magoava, os laços eram estabelecidos de forma profunda, você olhava para seu amigo e o via como necessário e insubstituível, não havia a opção “cancelamento” ou “deixar de seguir”. A consideração pela pessoa não era baseada em um click.
Entendendo esse contraste, analise suas relações com base no que Bauman nos descreve: As relações líquidas são extremamente artificiais. Pelo recurso da tecnologia e internet você pode fazer 500 amigos no Facebook e conseguir 2 mil seguidores no Instagram em um dia, contudo essas relações não são sólidas, muitas vezes sequer conhecemos as pessoas que nos seguem ou nos acompanham. Acabamos por desenvolver laços superficiais com novas pessoas. Uma amizade virtual, por exemplo, é uma experiência curiosa. Enxergar como profunda e confiável uma pessoa que você só conhece pelo avatar no perfil e pelas fotos publicadas pode ser um tanto peculiar aos mais velhos, mas para nós, ao menos, se tornou algo “comum”.
Tentar desenvolver uma relação social usando apenas a internet é tarefa que gera a mais absoluta incerteza, pois é vulnerável a diversas variáveis, mas o que Bauman nos destaca é a simplicidade com que ela pode se resumir: “adicionar como amigo” e “desfazer amizade”, ou “seguir” e “deixar de seguir”. Esse conforto para o encerramento de uma suposta relação é o que a torna líquida, não feita para durar. Por outro lado, dá a liberdade de pensar “não estou mais a fim, adeus sem nenhuma explicação”.
Antigamente (como minha avó dizia) para se desfazer um laço social havia todo um receio, um contexto e ainda as marcas deixadas pelo ocorrido eram mais profundas do que um simples “click”. Logo podemos concluir que hoje as relações estão migrando em massa para o virtual líquido, cada vez mais superficiais e menos significativas. A falta de contato humano e interação social real em contraste com a rapidez da informação e a opção “deixar de seguir” nos leva a um conforto inumano ao ponto de banalizarmos nossas amizades e relações sociais. Assista ao vídeo abaixo e nos conte, como tem andado suas relações? (*Audino Vilão, filósofo, cursa História na universidade e é youtuber – no insta @audinovilao e no Youtube)